Estela...— Cara, olha ali o Ferreira. — Aponto com a cabeça disfarçadamente pra ele que estava há poucos passos daqui, mais à frente, falando algo no ouvido de uma menina. O Lion e o Nico não vieram, então eu não esperava ver ele por aqui.
Bruna: Quando ele souber como essas feias daqui são, vai correr delas igual o diabo foge da cruz.
Eu dou um sorriso, deslizando minha língua pelo lábio inferior, enquanto tomo um gole do Gin que ela me ofereceu. Estamos aqui embaixo, eu e a Bruna, há poucos minutos descemos do camarote, depois dela me arrastar para cá, me lembrando que eu prometi a ela que iríamos curtir o baile juntas. A verdade é que eu curto os bailes daqui, mas nada se compara às casas de festas que eu costumava frequentar no México, onde as músicas tocavam alto e faziam minhas amigas e eu dançarmos com um gingado de cintura indecifrável, atraindo o olhar de todos os homens presentes no local. Eu me entregava totalmente, me sentindo no paraíso.
Eu direciono meu olhar para o nosso cantinho e avisto Lorenna descendo o lance de escadas do camarote com uma expressão não muito boa. Ela parecia estar nervosa, seus cabelos longos e cacheados, com algumas mechas levemente loiras, balançavam enquanto ela caminhava em nossa direção, pisando no chão com uma determinação do caralho.
Lorenna: Olha, tem momentos em que eu juro que tento não surtar com o Matheus, mas ele simplesmente implora pra levar uns tapas. — Ela diz, se aproximando o suficiente da gente, passando uma mão na outra.
— Que foi?
Lorenna: Minha tia tá precisando de mim lá na barra, a gente tava numa boa batendo um papo, eu expliquei tudo direitinho pra ele, mas o cara não tá nem aí. — A Bruna fica ali do meu lado, ouvindo atentamente o que ela dizia, igual a mim. — Ele quer me infernizar por causa de um primo meu que mora lá, achando que tem o controle da minha vida.
Bruna: A mulher é a que saiu da cirurgia recentemente, né?
Lorenna: Sim, e porra, eu falei pra ele que seria melhor deixarmos essa conversa pra depois, mas logo no baile, ele resolveu abrir a boca e causar confusão. Juro por tudo que é sagrado, tive que me controlar para não explodir e jogar tudo pro alto, e desaparecer da vida dele. Mas o filho da puta é um gostoso e eu amo ele, né.
Ela parece estar altinha já, ela estava aqui no baile a mais tempo que a gente, e já estava bebendo. Ela veio ficar aqui uns dias com o Costa, e pelo que parece eles vão se mudar de vez pra cá.
— Tenta colocar a cabeça em ordem, vocês conseguem conversar melhor amanhã, vocês bêbados não adianta muita coisa, só palavra jogada fora.
Bruna: Ih, eu bem metia logo um tapa na cara pra ficar esperto. — Mexe os ombros, demostrando não ligar, dançando a música que ecoava pelo lugar.
— Não da ideia que ela volta lá e faz. — Brinco, me aproximando da Lorena e pegando o copo de bebida da mão dela, jogando o meu já vazio no chão. — Vê se consegue uma garrafinha de água ali, Bruna.
Lorenna: Ei, devolve isso agora. — Ela vem até mim, aproximando sua mão da minha e por pouco ela consegue pegar, mas eu afasto antes.
— Você vai continuar bebendo, só toma um pouquinho de água pra equilibrar, tá bom? tá altinha já, amiga. — Explico, olhando nos seus olhos.
Ela só concorda e eu fico ali com ela esperando a Bruna trazer a água. Ajeito minha bolsa no ombro, inspirando profundamente, observando atentamente o lugar cheio de pessoas dançando enquanto se divertem em grupos. Em questão de segundos varrendo meu olhar por ali, eu vejo o Nenê andando com uns amigos, sorrindo pra caralho do que um deles fala pra ele. Passo meus olhos pela roupa que ele usava, uma camiseta branca e uma calça jeans de lavagem escura, ele usa apenas uma corrente no peito e seu corpo não é musculoso, mas ainda sim é atraente.
Eu ajeito a postura, ficando meio assim, pela última confusão que rolou com o Braga, imagino que ele não saiba que hoje o próprio esteja por aqui, já que ele não vem muito e nem frequenta os bailes da Vila Cruzeiro. Parecendo notar estar sendo analisado por algum olhar distante, ele procura no ambiente e para os olhos aqui, onde de imediato um sorriso cresce em seus lábios. Vejo ele falar alguma coisa no ouvido de um dos que estava com ele, e se afasta, vindo na minha direção.
Lorenna: Esse menino quer morrer. — Fala do meu lado, com o olhar preso na mesma figura masculina que eu.
— E eu não me responsabilizo por isso.
Nenê: Fala tu, morena. — Sorri assim que chega perto de mim, mostrando seus dentes branquinhos e alinhados. — Pô, pensei que depois daquele bagulho que rolou no meu tio, nunca mais que ia te ver.
Ele abre os braços e eu me envolvo neles, abraçando seu corpo, me afastando após uns segundos.
— Nem tive tempo pra me desculpar pelo surto do outro, mas desculpa. De verdade. — Falo meio envergonhada.
Nenê: Que isso, nós tava na boa, dançando ali sem nenhuma maldade, pô. Se liga, tô suave em relação a isso aí, fica em paz também. — Ele olha pro meu lado, onde a Lorenna estava. — E o que que falta de educação a minha, firmeza, gata? — Cumprimenta a preta, num poço de simpatia.
Não tenho nada contra ele, é novinho e em média tem uns dezenove anos. Me recepcionou bem na resenha do tio dele, e em momento nenhum mexeu comigo ou deu indícios de que estava ali com segundas intenções, o jeito dele é muito descontraído.
— Mas vem cá, não é querendo te trazer medo ou qualquer coisa, mas o Braga tá aqui. E pelo seu bem, eu acho que o quanto mais você ficar longe dos olhos dele ou de qualquer um da contenção dele, é muito bem pra você, não quero de jeito nenhum que passe daquilo que rolou na casa do seu tio.
Nenê: Fica em paz, morena. Vim pra curtir como qualquer outro, e na sinceridade, vou te deixar na boa pra não causar confusão pro teu lado, fecho? — Se aproxima novamente de mim, trocando beijo no rosto comigo. — Fé pra vocês, qualquer hora a gente se tromba.
Ele vira as costas, pronto para voltar pelo mesmo caminho, em direção aos seus amigos. Mas o que me chama a atenção imediatamente à minha frente é o homem alto e com o semblante fechado, com uma expressão séria no rosto, sem demonstrar nenhum tipo de satisfação com o que via lá de cima, no primeiro degrau da escada. O olhar do Braga era intenso, iluminado pela luz lá em cima, permitindo que enxergássemos de longe seus olhos castanhos e penetrantes, fixos no garoto que também o encarava, aqui embaixo.