Precisamos de vinho

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Os meses estão passando rápido e já estamos no fim de junho. Trabalhar com Bruno está sendo... difícil, principalmente por ele sempre tentar se aproximar e eu me esquivar. Não quero conversar com ele, nem sequer vê-lo, mas infelizmente a última opção é impossível já que trabalhamos juntos, portanto, tento não trocar uma palavra sequer. Tento ser simpática na medida certa, afinal, esse é meu trabalho, mas não dou abertura para mais nada além do profissional. Ele não me deve nada, afinal, não temos nada e nunca me prometeu nada. Mas é inevitável sentir... algo quando ele está por perto. E por mais que eu odeie admitir, é inevitável sentir sua falta. Não por não o ver, afinal, o vejo quase todos os dias, mas por não... tê-lo. Não ouvir mais sua risada quando faço um comentário ácido, ou rir de suas piadas, ou trocar olhares, ou observar seu rosto, ou... beijá-lo. Toda vez que me lembro da sensação, sinto um arrepio intenso correr pelo meu corpo. Ao mesmo tempo, me sinto péssima por sentir tudo isso e não compreender porque ainda me sinto assim. Estou fazendo de tudo para acabar com esse sentimento, já que não é recíproco. Bruno ainda me olha da mesma forma, ainda me observa, mas isso não significa mais nada para mim. Pelo menos é o que eu tento convencer para mim mesma.

De qualquer forma, percebo que o verão chegou com tudo, o sol quase me derretendo todos os dias. Decido ir trabalhar com um vestido solto, leve. Chego no estúdio às 14 horas, exatamente no horário. Todos já estão na sala, inclusive Brody Brown.
- E aí, galera. – Entro na sala e me sento no sofá.
É inevitável perceber Bruno me acompanhando com os olhos, mas, como sempre, o ignoro.
- Vamos lá. – Diz ele, sério.
Passamos cerca de 1 hora e meia trabalhando em Calling All My Lovelies e parecia nunca ficar bom. Bruno alterava os vocais todas as vezes e nunca chegava no que ele queria. Quando isso acontece, ele insiste até que fique bom. É admirável, mas ao mesmo tempo muito cansativo. Todos nos acomodamos no estúdio, perto um dos outros. Fecho os olhos, suspiro e começo a pensar.
- Eu não sei, eu quero algo a mais nessa música, algo... real, talvez. – Diz Bruno sentado na cadeira e olhando para o chão, como se estivesse pensando.
Ouço várias pessoas falando, mas tento me concentrar no que ele disse. Pensar em algo. Algo real... Cerro os olhos quando uma ideia surge em minha cabeça.
- Então por que não liga para ela?
Imediatamente, todos os olhos estão em mim. Arregalo os olhos, percebendo agora que falei alto demais.
- Como? – Pergunta Bruno, me olhando enquanto também cerra os olhos.
- Nada, esquece. Pensei alto. – Rio sem graça, tentando disfarçar.
- Bom, então que bom que pensou alto. – Diz Brody me olhando, parecendo... intrigado. – Qual sua ideia?
Sinto meu coração acelerar. Percebo que talvez não devia ter dito nada, aliás, quem sou eu pra ficar dando pitaco?! Sou uma backing vocal, e esse é meu cargo. Olho ao meu redor e todos estão com a atenção em mim. Pigarreio e sinto minhas mãos tremerem. Acho que não terei outra escolha a não ser falar. Então me ajeito melhor no sofá e começo a explicar minha ideia.
- Bom, Bruno quer algo mais real, então por que não inserir uma ligação na música? – Cerro os olhos, observando as expressões de todos. – Já que em Calling All My Lovelies Bruno está cantando sobre não conseguir contato com a tal moça e que ela não pode deixa-lo esperando, mandando-o direto para a caixa postal, podemos inserir uma ligação e, depois de, talvez, uns três toques, cair na caixa postal com um recado da mulher. Algo... provocante. – Todos estão quietos, ainda me observando. Sorrio. – Bom, faz todo o sentindo para mim.
- Para mim também. – Diz Brody, rapidamente, ainda com seus olhos em mim. Ele me entrega um sorriso largo. – Porra, faz todo sentido! O que acha, Bruno?
Engulo em seco e encaro Bruno depois de muito tempo sem fazer isso. E, é claro, sinto o corpo arrepiar. E sinto ansiedade por ouvir o que ele tem a dizer. Depois de alguns segundos me encarando com a mão no queixo, ele responde.
- Faz total sentido. – Ele sorri, e sem querer sorrio também. – Nos conte mais sobre isso.
- Bom... – Começo a dizer, sentindo a empolgação me consumir. – Depois de Pick up the phone, acho que seria um bom momento para inserir essa ligação. A música continuaria somente com o instrumental, e aí a ligação acontece. Bruno liga para ela, e como eu disse, depois de alguns toques, a ligação cai na caixa postal e ouvimos o recado dela. Acredito que o final da ligação seria a deixa perfeita para voltar ao refrão, "...calling all my lovelies, calling all my lovelies..." – Canto essa parte e todos parecem entender, acenando positivamente com a cabeça. Alguns até sorriem.
- Eu... adorei. – Diz Phil com um sorriso enorme no rosto e parecendo empolgado. – Minha nossa, eu amei... Seria algo real, engraçado e provocativo ao mesmo tempo.
- Exatamente. – Sorrio, sentindo o coração acelerado.
- E como seria esse recado? – Brody cerra os olhos, me encarando.
- Tem caneta e papel?
Logo começo a pensar e escrever. As ideias começam a fluir em minha mente de uma forma extraordinária enquanto sinto Bruno me observando, assim como todos ao meu redor. Em alguns segundos, está pronto. Entrego para Brody, que lê e sorri, e depois passa para Bruno. Ele também sorri e lê em voz alta.
- "Oi, você ligou para (inserir o nome da garota aqui). Sinto muito não poder atender agora, mas se você deixar o nome e o telefone, eu vou retornar." – Bruno olha para todos com um sorriso.
- É isso! – Diz Phil, sorrindo.
- Vamos tentar. – Bruno sorri e me encara. Depois, olha para o relógio em seu pulso. – Mas amanhã. Já está tarde. Estão liberados.
De repente, me sinto... orgulhosa. Uma sensação de satisfação e alegria preenchem meu peito. E essas sensações duram até o dia seguinte, quando voltamos ao estúdio. Recebi uma mensagem para estarmos lá às 16 horas, o que me deixou encabulada. No caminho para o estúdio, só o que consigo pensar é que raios vamos fazer às 16 horas? Sempre começamos cedo para o dia render, e não faço ideia do rendimento de hoje, considerando que já iremos começar tarde. De qualquer forma, quando chego ao estúdio, percebo certa empolgação em Bruno, Brody e Phil. Alguns minutos de conversa e eles se reúnem, um ao lado do outro.
- Meninas, chamamos vocês hoje nesse horário porque não queremos que trabalhem. – Diz Bruno, sorrindo.
Eu e Amber fazemos uma careta, obviamente não entendendo nada.
- Hoje queremos que vocês só ouçam Calling All My Lovelies, finalmente pronta.
De repente, sinto meu coração acelerar. A empolgação e a ansiedade tomam conta de mim. Será que ouvi certo? A música está pronta?! Mas já?! Olho para Amber e ela parece estar da mesma forma.
- Com vocês... Calling All My Lovelies.
Quando Bruno dá play na música, sinto minhas mãos tremerem. Me sinto ansiosa para ouvi-la e principalmente para ouvir sobre o que conversamos no dia anterior. 2 minutos de música e, de repente, a ligação acontece. Tapo a boca, ansiosa para ouvir. E então ouço uma voz sensual, quente e... familiar começar a dizer o recado que escrevi ontem. "Oi, você ligou para Halle Berry. Sinto muito não poder atender agora, mas se você deixar o nome e o telefone, eu vou retornar.". O som de um beijo vem ao final do recado e logo a voz de Bruno dizendo Damn e continuando a música com um arranjo vocal um pouco diferente. Sem querer, grito, logo após tapando a boca. Sinto todo meu corpo arrepiar, e meu coração parece que vai sair pela boca. Seguro em Amber, que parece estar tão perplexa quanto eu, seus olhos arregalados enquanto escuta. Quando a música acaba, não consigo dizer nada. Amber é quem fala por mim.
- Minha nossa... – A voz dela parece emocionada.
- Sim... – Consigo sussurrar. Olho para Bruno, que está sorrindo. – Minha nossa, Halle Berry gravou o áudio para vocês? A HALLE BERRY?!
Os meninos não dizem nada, apenas acenam positivamente com a cabeça.
- Tão rápido assim?! – Deixo escapar.
Bruno sorri.
- Quando você nos deu a ideia ontem, não consegui parar de pensar nela. Então eu, Brody e Phil continuamos no estúdio e tive a ideia de convidar uma mulher especial para gravar. Halle Berry foi uma opção rápida e unânime. Então enviei um pedido especial para ela. Bom, eu praticamente implorei para que ela me ajudasse numa coisa. – Todos riem, mas estou perplexa demais para rir. – Expliquei que gostaria de sua voz numa música, e hoje de manhã, ela nos enviou esse áudio perfeito.
Arregalo os olhos, ainda sem conseguir dizer nada. Phil é quem fala agora.
- Eu e os meninos nos trancamos no estúdio e inserimos o áudio e novos arranjos na música. Quando percebemos que finalmente ficou pronto, não suportamos a ansiedade e chamamos vocês para virem até aqui.
Ainda não digo nada. Apenas sinto meu coração batendo forte. Até que horas eles ficaram aqui?! Só agora percebo que estão com as mesmas roupas de ontem. Minha nossa, eles provavelmente passaram a noite a madrugada aqui, trabalhando na música. Isso só me deixa ainda mais perplexa.
- E, bem... Dar os devidos parabéns a quem deu a ideia. – Bruno sorri e bate palmas, assim como todo mundo. Dessa vez, sinto que meu coração irá explodir. – Saphira, sua ideia foi incrível. Combinou perfeitamente com a música e era exatamente o que eu queria. Obrigada por compartilhá-la conosco. Muito obrigada, mesmo.
- Eu... – Engulo em seco, tentando sequer dizer alguma coisa. Minhas mãos tremem um pouco. – Por nada.
Sorrio, sentindo meu corpo em êxtase. A música ficou... perfeita. E Halle Berry dizendo as palavras que escrevi, é algo... surreal. Ficou ainda melhor do que imaginei. Me sinto... extasiada. E, de certa forma, orgulhosa. Muito orgulhosa. Sinto meus olhos marejando.
- Bom, aproveitando o gancho... – Diz Bruno, sorrindo, parecendo empolgado. – O álbum estreia dia 18 de novembro.
Outra vez, sinto como se meu coração saísse pela boca. Todos batemos palmas, obviamente a alegria e êxtase presentes em todos nós. Saber que o trabalho está quase pronto me deixa inquieta e muito, muito ansiosa.
Depois de algumas conversas, estamos indo embora.
- Boa noite, pessoal. – Diz Phil, saindo da sala.
Acelero o passo para também sair quando percebo que eu e Bruno ficaríamos sozinhos dentro do estúdio. Porém, antes que eu consiga fugir, sinto ele se aproximar rapidamente.
- Ei, Saphira, espera. Quer uma carona?
O encaro, talvez com os olhos arregalados, perplexa pela pergunta.
- O que?
- Bom, acho que Amber já foi... – Ele cerra os olhos e observa ao redor. Depois, olha em seu relógio. – Não é seguro ir sozinha à essa hora.
- Está tudo bem, Bruno. Sei me cuidar. – Sorrio, tentando ser simpática, mas a acidez está presente nas palavras. – Boa noite.
- Saphira...
Antes que ele volte a falar, volto a andar rapidamente. E, claro, ele me acompanha, ao meu lado. Bufo, me sentindo impaciente, e, mais que isso, receosa em ficar a sós com ele. Preciso sair daqui, urgente.
- Saphira, você está fugindo de mim. Podemos conversar?
- Não estou fugindo de você. – Reviro os olhos enquanto continuo caminhando, sem olhar para ele.
- Está, sim.
- Sabe, Bruno, nem sempre você é o centro do mundo. Nem tudo é sobre você.
Mordo minha língua ao perceber o que acabei de dizer. Minha nossa, estou falando com meu chefe desse jeito. Onde estou com a cabeça?! De qualquer forma, penso que com essa resposta ele irá desistir, mas não. Ele continua me seguindo. Bufo, me sentindo impaciente.
- Podemos conversar?
- Não. – Dessa vez, pareço irritada. Aperto ainda mais o passo
- Saphira!
Bruno segura levemente em meu braço, o que me faz virar para ele. Fecho os olhos e respiro fundo enquanto ele fala.
- Eu só quero conversar.
- Podemos conversar sobre trabalho quando eu estiver trabalhando. – Olho para o relógio em meu pulso. – Pelo que entendi, já estou dispensada, certo?
- Não é sobre trabalho que quero conversar, e você sabe disso.
Não digo nada. Apenas o encaro enquanto contraio meu maxilar. Ele olha em meus olhos, e é aí que sei que estou entrando em um campo minado. Percebi há um certo tempo que olhar nos olhos deles é uma de minhas fraquezas, e odeio isso. Quando ele volta a falar, sua voz é suave, o que faz estremecer meu coração.
- Eu quero conversar porque tenho te percebido... distante. – Ele me encara e engulo em seco. – Você foge de mim, não fica perto e nunca, em hipótese alguma, fica sozinha comigo. – Ele acaricia minha mão de leve, o que me faz arrepiar. – Eu só quero saber o porquê...
Engulo em seco novamente, ainda o encarando. Então afasto minha mão da sua bruscamente, pigarreando.
- Nada disso está acontecendo. Você está imaginando coisas.
- Não. Não estou. – Sua voz está um pouco mais grave e seu maxilar está marcado. Parece um tanto... impaciente. – Mereço uma explicação, certo?
- Rá! "Merece"... – Rio sarcasticamente, me sentindo, também, impaciente. – Você não vai gostar da conversa se começarmos a discutir sobre quem merece o que.
Ele franze as sobrancelhas, provavelmente não entendendo minha resposta. Respiro fundo, desejando imensamente sair daqui. E é isso que eu faço. Ou pelo menos tento fazer. Quando me viro, Bruno segura em meu pulso novamente.
- Saphira...
- O porque, Bruno. Eu vou te dizer. – Dessa vez, me viro para ele abruptamente enquanto sinto o coração acelerado. Novamente as emoções parecem transbordar e eu não consigo me conter. Quando olho para ele, sinto vontade de chorar. – Porque é muito chato sentir coisas que não são recíprocas. É muito chato se sentir frustrada. É muito chato ter que te ver todos os dias e... – Engulo em seco, sentindo, agora, meus olhos marejando. Respiro fundo, me concentrando para não chorar. – É muito chato se sentir uma idiota por sentir coisas que você não quer sentir, mas que são inevitáveis. Então, por favor... – Quando o encaro, preciso me esforçar para não chorar. – Por favor, me deixe ser profissional. Me deixe... esquecer.
Termino de falar e percebo que uma lágrima corta meu rosto. Minha nossa, se já não me senti humilhada o suficiente, esse é o momento. Me sinto uma idiota por chorar, ainda mais por chorar na frente dele. Que ódio.
Ele me encara por alguns segundos, estagnado, sem dizer uma palavra. Me pergunto se ele está pensando no que eu disse ou se não entendeu absolutamente nada. De qualquer forma, decido sair daqui de uma vez por todas. Quando ele tenta falar algo, o interrompo antes mesmo de começar.
- Boa noite.
Viro as costas e praticamente corro, torcendo para que ele não me chame novamente. Desço tão rápido pelas escadas que em pouco segundos já estou na saída, chamando um táxi. 20 minutos depois e estou em casa e, mesmo que eu não queira, começo a chorar. É... inevitável. Principalmente por perceber que, mesmo passados 2 meses, ainda não superei Bruno. Pelo contrário, eu... sinto falta dele. Meu corpo sente falta dele. Minha boca sente falta dele. Tivemos apenas algumas horas juntos, e somente isso foi o suficiente para mexer tudo dentro de mim. Por que Bruno tem esse efeito sobre mim?! Detesto admitir, mas é verdade, e eu escondo essa verdade todos os dias no fundo do coração, a segurando, trancando e não deixando-a sair. Porém, de vez em quando, ela se torna mais forte que eu e transborda em mim, e a única forma de liberá-la é chorando. Inútil, já que ela sempre volta.

Too Good To Say GoodbyeOnde histórias criam vida. Descubra agora