Complicado demais

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- Ei, Sa, vamos. Está na hora. – Ouço Jaque me acordando com um sorriso no rosto, sentada na cama. – O sol já vai nascer.
Começo a me levantar enquanto Jaque abre a cortina e a janela do quarto. Tapo os olhos, acostumando-os à luz. Ela se senta ao meu lado e, juntas, assistimos ao nascer do sol, em silêncio. Depois, olho para ela com um sorriso.
- Bom dia. – Digo com a voz meio rouca.
- Bom dia. – Ela também sorri, parecendo analisar meu rosto. – Vou fazer o café para nós.
Aceno positivamente com a cabeça. Enquanto ela vai para a cozinha, respiro fundo, sentindo agora certa dor de cabeça e meu rosto inchado. Consequências do choro de ontem. Rapidamente pego meu notebook e começo a checar meus e-mails, me preparando para o dia. Imediatamente percebo que Liza me enviou a nova agenda do mês, e noto que hoje tenho compromissos no estúdio às 10 da manhã.
Sinto o corpo arrepiar ao saber que terei que ver Bruno hoje. Bom, é óbvio que isso iria acontecer, afinal, trabalhamos juntos, mas um cantinho da minha mente torcia para que a agenda de hoje fosse somente home office. A ideia de vê-lo me deixa um tanto desesperada. Antes que eu surte, respiro fundo, tentando me acalmar. Me forço a levantar da cama e caminho até a cozinha. Vejo Jaque preparar nosso café: ovos mexidos, uma de suas especialidades. A cozinha da casa dela é estilo americana, com balcão, banquinhos e tudo, o que faz parecer ainda mais confortável. Me sento em um dos bancos e apoio os cotovelos no balcão.
- Já tá pronto. – Jaque sai da cozinha, pego um prato, coloco os ovos e pego também uma xícara de café.
Volto para o balcão e começo a comer. Depois de alguns minutos, ela volta e estaciona na entrada da cozinha, com um dos braços estendidos.
- O que é isso?
Levanto os olhos do prato e engulo em seco um pedaço de ovo. Vejo a pulseira reluzir pendurada em seu dedo. Volto a olhar o prato, indiferente.
- A pulseira que Bruno me deu.
- E porque ao invés de estar em seu pulso ela estava no chão do banheiro?
- Por que eu a joguei lá.
Não digo mais nada, com esperança de que Jaque deixe para lá. Mas é claro que não é isso que acontece. Ao invés disso, ela passa para o outro lado do balcão, encosta nele e me encara.
- Saphira, como assim? Por que fez isso?
- Estava com raiva.
- E por quê?! O que acontec...
- Vi ele com outra mulher ontem. – A interrompo.
Ao notar o silêncio, sei que Jaque está sem palavras. Volto a comer. E ela volta a falar.
- O quê?! Espera, como assim? – Não vejo sua expressão, mas posso apostar que está confusa. Respiro fundo e começo a falar.
- Ontem, quando fui pegar minhas coisas, passei por uma porta. Ela estava aberta e vi um movimento estranho, então parei e o vi. Estavam os dois se divertindo na parede... – Olho para nada em específico, a cena ressurgindo em minha mente. Uma risada amarga sai de minha boca. – Acho que não precisa de mais detalhes, certo?
Finalmente olho para Jaque e a percebo sem palavras mais uma vez. Seu rosto parece um misto de confusão e surpresa. Devagar ela coloca a pulseira no balcão. Quando olha para mim, parece pensar no que dizer.
- Amiga, eu... – Ela engole em seco. – Eu nem sei o que dizer...
- Não precisa dizer nada, amiga. – Sorrio. – Ele é um idiota que me manipulou e eu fui outra idiota por criar expectativas. Infelizmente me deixei levar, mas isso não vai mais acontecer.
Jaque não diz nada. Por algum motivo, me sinto impelida a falar. Sinto as emoções transbordando.
- Vai ser diferente a partir de agora.
- Eu não acredito... – Jaque quase sussurra. – Ele te viu?
- Não. Estava muito ocupado. – Outra vez, sinto amargura em minhas palavras.
Jaque novamente não diz nada. Algo completamente fora do normal. Sinto meus olhos marejarem contra minha vontade.
- De qualquer forma, foi só um beijo. Não há nada entre nós. Não deveria significar nada.
- Mas... significou. – Sinto as palavras de Jaque como uma faca em meu peito. Seguro para não chorar. – Sei que significou para você.
- Não importa. Agora isso não importa mais. – Inevitavelmente, uma lágrima corta meu rosto. A deixo escorrer, sentindo angústia ao falar. – Não deveria criar expectativas. Essa tristeza é minha culpa. A partir de agora, isso não vai voltar a acontecer. Ele mostrou quem é e o que quer. Fui eu a idiota por pensar demais. – Olho para o nada, pensativa, e depois volto para a comida.
Sinto Jaque me observando por mais alguns segundos. Ela se apoia no balcão, dessa vez me olhando nos olhos. Sua expressão quase me faz chorar. Uma mistura de tristeza e conforto. Ela tenta sorrir, talvez me consolar.
- Não acho que seja sua culpa... – A voz de Jaque é quase um sussurro, repleta de carinho. – Acho um tanto impossível não se sentir pelo menos mexida com um cara que te leva para uma noite perfeita e te dá um presente perfeito em seu aniversário. Eu... sinto muito por isso. Muito mesmo.
Não digo nada, apenas sinto as emoções dentro de mim.
- Eu vou guardar isso para você. – Ela estica seu dedo, mais uma vez me mostrando a pulseira.
- Tanto faz. – Digo, totalmente indiferente, mas sentindo um nó na garganta.

Too Good To Say GoodbyeOnde histórias criam vida. Descubra agora