Para sempre

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- Bruno? – Digo, saindo pela casa procurando-o durante a noite. Acordei e não o encontrei na cama, e, como ele não está com o celular, me sinto preocupada. Odeio quando ele some nessa casa enorme. – Bruno?!
Fecho os olhos para tentar ouvir alguma coisa. Talvez, por instinto, decido ir até o estúdio. Na verdade, não, não é por instinto. Sempre que Bruno some, em quase cem por cento das vezes, ele está imerso no estúdio, talvez observando seus prêmios, como os pequenos gramofones do Grammy, ou talvez só brincando com seu violão.
De fininho, vou até lá. Pela luz acesa pela fresta, sei que está ali dentro. Abro a porta devagar, não querendo atrapalhá-lo em, sei lá, algum processo criativo. Imediatamente reconheço o que parece minha voz ressoando pelo local. Franzo as sobrancelhas enquanto fecho a porta, tentando entender o que está acontecendo. Quando ouço e sinto a tristeza em meu canto, sei do que se refere. Meu corpo arrepia na mesma hora.

"I'm scared of lonely, and I'm scared of be the only shadow I see along a wall, and I'm scared of only heart beat I hear a beating is my own, and I'm scared of been alone. I can't see the breath when I am lost in this dream, I need you to hold me. I'm scared of lonely. I'm scared of lonely"

Ouço a música inundando o ambiente enquanto vejo Bruno sentado no sofá, escrevendo em seu bloquinho. Quando chego mais perto, ele levanta os olhos, sorri e bate no assento ao seu lado, me convidando para sentar. Pelo seu pijama, chinelos e o cabelo todo bagunçado, sei que saiu da cama e veio direto para cá. Sigo até ele, me sentando.
A música que cantei quando Bruno ainda estava em coma continua ressoando pelo estúdio. Não me lembrava disso, e não fazia ideia de que tinha sido gravado. Bruno aperta um botão de algum controle, e a música para. Assim, ele continua escrevendo. Franzo as sobrancelhas, esticando meu pescoço.
- O que está fazendo? – Pergunto, vendo alguns acordes escritos no papel.
- Produzindo. – Ele responde, parecendo totalmente concentrado com seu cabelo todo bagunçado.
- Produzindo... isso? – Pergunto, apontando para o papel e enxergando uma parte da letra que cantei escrita pela reconhecida letra garranchada de Bruno.
- O que mais seria?! – Ele pergunta, sorrindo. Olho para ele totalmente surpresa.
- Bruno, você está produzindo uma música minha?!
- Já não fizemos isso antes? Por favor, não me diga que se esqueceu de I Miss You, porque eu não esqueci. – Ele responde, sorrindo.
Fico observando-o, parecendo tão concentrado enquanto não acredito no que acabou de dizer. Não faço ideia de quanto tempo está aqui, como descobriu essa gravação ou quando a descobriu.
- Quando descobriu essa gravação? – Pergunto, cerrando os olhos.
- 30 minutos atrás. – Ele me responde sem tirar os olhos do papel. – Por que não me mostrou antes?
- Porque também não fazia ideia da existência disso minutos atrás.
- Entendi... – Ele diz, ainda concentrado. – Bom... Vim tocar alguma coisa e, fuçando nos arquivos, encontrei isso. Acho que foi Phil quem gravou.
- Não me surpreende. – Digo, sorrindo e agarrando seu braço. – É uma música espontânea que cantei quando você ainda estava em coma e os meninos se reuniram aqui para tocarmos um pouco... – Sinto a dor ao lembrar desse dia e dessa época. Mesmo fazendo tempo, ainda sinto resquícios da amargura. – O que achou?
- Da música? – Bruno pergunta, ainda concentrado.
- Do que mais seria?! – Digo, provocando-o. Bruno ri, olhando para mim rapidamente, depois voltando ao papel.
- É... fantástica. – Ele responde, o que é uma massagem em meu ego. Ser elogiada por Bruno por minhas características físicas é ótimo, mas ser elogiada pela minha musicalidade é ainda mais incrível. Sei que, nesse momento, não é só Bruno, meu esposo, mas é Bruno Mars, um dos melhores compositores e produtores da atualidade. – Você, diferente de mim, se desenvolve muito melhor no sofrimento.
- Nossa, isso é horrível de se dizer. – Digo, franzindo as sobrancelhas. Bruno ri alto, mas ainda concentrado.
- Eu quis dizer que cada artista tem sua melhor forma de se expressar. A sua musicalidade aflora ainda mais quando você está triste, e isso é absolutamente normal, particular... Como Adele, por exemplo.
- Dessa comparação eu gostei. – Digo, sorrindo. Bruno ri.
- Consegue se lembrar de como se sentia quando cantou isso?
Imediatamente um arrepio intenso percorre meu corpo. Hoje, lembrar do que passei com Bruno não me aflige mais, mas é impossível não sentir certa dor. Foi a época mais difícil de minha vida.
- Consigo, sim.
- Seu sentimento e dor nessa música... Uau. – Ele diz, apertando um botão e a música voltando. – É incrivelmente... puro.
Agora, ouvindo a música, fica perceptível que é algo improvisado, afinal, nesse dia eu e os meninos nos reunimos para cantar e essa música surgiu de repente. Foi um momento tão intenso que me lembro de pensar que era como se essa música estivesse dentro de mim e, abrindo a boca, ela simplesmente saísse. Os instrumentos acompanham também de forma improvisada, mas muito profissional. Na verdade, tendo a oportunidade de ouvir agora, percebo que está muito bom. Como Bruno disse, é nítida a dor em minha voz. Há rouquidão, potência, técnica, mas nada muito apurado, afinal, nesse momento, não estava focada nisso. Há muito mais sentimento que qualquer outra coisa.
- Você tem mais músicas para me mostrar? – Bruno pergunta.
Sorrio, me lembrando de algumas que produzi com Phil.
- Tenho algumas...
- Quero conhecer todas. – Ele sorri. – Quer me ajudar com essa? – Bruno pergunta, olhando para mim e estendendo seu bloquinho.
Me lembro de nós dois produzindo I Miss You, relembrando o quanto foi uma experiência única, tão... incrível. Sorrio, me sentindo empolgada.
- Achei que nunca fosse pedir! – Digo, rindo e chegando mais perto. – Aliás, não te dei permissão para produzir uma música minha sem minha autorização! – Fecho a cara enquanto Bruno olha para mim presunçosamente, arqueando uma sobrancelha.
- Me permite?
- CLARO QUE SIM, PELO AMOR DE DEUS! – Digo exageradamente, revirando os olhos enquanto Bruno ri alto, assim como eu.
Bruno, de repente, para o que está fazendo enquanto encara o sofá, depois a mim. Franzo as sobrancelhas.
- O que foi? – Pergunto.
- Nada... Só estava pensando que nunca transamos aqui.
- Bem... – Sorrio, arqueando uma sobrancelha. – Aqui é seu templo, não é? Quem sou eu para transar em frente à tantos gramofones dourados?!
- Você é meu templo, baby. – Diz Bruno, rindo. Mordo o lábio. – E, pensando dessa forma, só deixa minha fantasia ainda melhor.
- Sendo assim, podemos inaugurar esse sofá... – Digo, sorrindo. Bruno imediatamente vem até mim, mas logo o empurro. – Porém, mais tarde. Trabalho primeiro! – Reviro os olhos, fazendo graça, e Bruno ri. – Até aprece que não é profissional, senhor Mars.
- Me chama de senhor Mars de novo e serei obrigado a te comer, agora. – Ele diz, levantando uma sobrancelha. Levanto minhas mãos, como desculpas.
- Não tá mais aqui quem falou... – Digo, uma expressão inocente. – Senhor Mars. – Mordo o lábio quando Bruno respira fundo.
- Te odeio, sabia?
- Eu também te amo. – Respondo, beijando seu braço. – Agora... trabalho!
Não sei quanto tempo eu e Bruno trabalhamos, mas, no fim, tínhamos prontos os vocais, a harmonia e os arranjos, ou seja, praticamente a música inteira, exceto o ritmo. Ainda não acertamos e decidimos continuar no dia seguinte. Mas, mesmo assim, é incrível como está ficando tão bom. E, é claro, depois disso tudo transamos no sofá. E depois no tapete. E depois na cama, em nosso quarto. Agora, fechando os olhos para dormir e sentindo Bruno me segurando, penso no quanto somos perfeitos juntos. Parece brega e ridículo, mas é exatamente isso.

Too Good To Say GoodbyeOnde histórias criam vida. Descubra agora