Billboard Music Awards

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Estamos numa igreja local num bairro de classe baixa. Do lado de fora, há muros pichados por todo lado e uma vizinhança sempre alerta. Já aqui não há muitas pessoas, cerca de 15 sentadas enquanto o ofício acontece. Chegamos e nos sentamos mais ao fundo, nos últimos bancos, não chamando a atenção de ninguém. Trisha, agora, é um misto de desolação, confusão e tristeza, e não diz uma palavra. Durante todo o tempo tentamos ajuda-la, consolando-a, mas sabemos que num momento desses as palavras não valem muito. Então ficamos ao seu lado, dando apoio. Quando a cerimônia termina, todos se levantam. O clima, como em todos os velórios, é pesado, mas não há muitas pessoas chorando. Trisha então olha para mim e depois para todas as meninas. Dou meu melhor sorriso consolador, e, com um aceno de cabeça, incentivo-a a ir até lá. Todas nós levantamos, e só assim algumas pessoas percebem nossa presença. Trisha está chorando enquanto caminho segurando em seus ombros e ela apoia sua cabeça em meu peito.
Chegamos perto do falecido, e, assim, Trisha caminha até a frente. Não imaginei que poderia vê-la ainda mais acabada, mas, quando vê seu pai, parece que ela irá desmoronar. Corro, seguro-a, e ela chora demasiadamente. Liza chega com uma rosa branca na mão e entrega à Trisha. Ela pega, tentando sorrir como agradecimento, mas falhando totalmente. Tímida, ela estica a mão, e deposita a flor em cima de seu pai. Meu coração está doendo tanto que seguro para não chorar, tentando, com todas as forças, dar força e apoio à Trisha num momento tão triste quanto esse.
- O que você está fazendo aqui?! – É o que eu ouço, de repente.
Com uma careta, encaro uma senhora magra, um pouco mais baixa que Trisha, com cabelos presos num coque e com uma expressão, ao mesmo tempo, triste e zangada. Ao ver a expressão de Trisha, tenho certeza de que é sua mãe.
- Mãe... – Ela sussurra, ao mesmo tempo surpresa e comedida. Seus olhos brilham de, talvez, saudade.
- O que está fazendo aqui?! – Noto que há raiva nas palavras dela.
Faço outra careta, pensando por que raios ela está falando assim com Trisha num momento como esse.
- Dylan me contou o que aconteceu... – Trisha diz, sua voz embargada pelo choro. – Não poderia deixar de vir...
- Não sei porque ele fez isso. Ninguém te quer aqui. – Ela resmunga.
Trisha parece totalmente confusa, obviamente chocada com a reação de sua mãe ao vê-la aqui. Olho para as meninas e todas estão tão inconformadas quanto eu, mas Jaque parece estar um pouco mais irritada que todas nós. Essa mulher volta a falar, e começo a sentir desgosto ao ouvir sua voz.
- Não sei o que veio fazer aqui. Simplesmente sai de casa, não dá notícias, e agora quer chorar no enterro do seu pai? Tenha vergonha na cara!
- Mãe, não foi assim, e você sabe... – Trisha tenta ser imponente, mas sua voz soa frágil, chorosa, e seus olhos derramam várias lágrimas.
- Seu pai ainda teve coragem de dizer que tínhamos que ir atrás de você, que te devíamos desculpas... – A senhora ri de forma cruel, amarga. – Ótima ideia, ele foi fazer isso e agora está morto, por sua causa!
Trisha não dá resposta nenhuma, só a olha com uma incredulidade imensa. Meus olhos estão arregalados e não consigo acreditar no que estou ouvindo.
- Você nunca prestou pra nada... – Ela continua falando, olhando para Trisha com tanto desgosto que penso como uma mãe seria capaz de olhar assim para um filho. – Faça um favor e nunca mais apareça na minha frente. Seu pai não gostaria de te ter aqui.
Sinto dor no peito ao ouvir isso. Mesmo não sendo comigo, consigo sentir a amargura das palavras. Trisha parece completamente... destruída. Então tudo acontece rápido demais. Num segundo, estou segurando os ombros de Trisha, e no outro estou vendo Jaque caminhando firmemente até a senhora e a estapeando no rosto. O barulho do tapa parece ecoar pela igreja. Imediatamente meu coração dispara e meus olhos arregalam ainda mais.
- JAQUELINE! – Num impulso, seguro seu braço para ela não bater de novo.
Os olhos da mãe de Trisha também estão arregalados, e ela apoia a mão onde Jaque bateu. Ela parece... chocada e assustada. Olho para minha amiga e percebo o quanto parece irritada. Seu peito sobe e desce bruscamente. Percebo que também estou assim, e, no fundo, confesso que adorei a cena, mesmo não acreditando que isso acabou de acontecer.
- Só por ter coragem de dizer isso para uma filha eu já imagino o tipo de pessoa que você é. – A voz de Jaqueline soa tão intensa que me arrepia. – Ainda bem que Trisha não é igual a você. Ela tem uma sorte imensa por não serem parecidas, e com certeza está melhor vivendo longe daqui...
Jaqueline demonstra tanta raiva que não acredito ser possível. Olho para as meninas ao meu redor e todas parecem tão atônitas quanto eu.
- Quer ficar mais um pouco, Trisha? – Jaque pergunta.
Trisha não diz nada, apenas nega com a cabeça, parecendo chocada.
- Então vamos, meninas. – Diz Jaque, se virando e caminhando para fora.
Olhamos uma para as outras e, então, a seguimos. Olho uma última vez para a mãe de Trisha e vejo a amargura em seu olhar. Me arrepio, pensando no tipo de pessoa que ela deve ser.
Já no carro, todas permanecemos em silêncio por certo tempo. Liza está dirigindo e estou ao seu lado, no passageiro, enquanto Jaque, Trisha e Amber estão atrás. Todo o ambiente parece... estranho. Então Jaque suspira, e sei que será ela a felizarda a iniciar uma conversa.
- Trisha, olha... Me desculpa. – Ela diz, suavemente. – Eu não queria ter feito aquilo. Quer dizer, eu queria, sim. Mas não podia ter feito. Foi errado de minha parte. Me desculpe, por favor.
- Pf... – Trisha resmunga, rindo amargamente. – Minha mãe é uma narcisista do caralho... Ela mereceu aquilo.
Arregalo os olhos e Liza parece fazer o mesmo. Então Trisha suspira, e quando fala, parece desabafar.
- Como vocês puderam perceber, tenho uma relação péssima com a minha mãe. Consequentemente, tenho uma relação péssima em casa. Não por minha parte, é claro, mas... – Ela novamente ri amargamente, e posso sentir a dor enquanto fala. – A verdade é que minha mãe nunca me quis. Venho de uma gravidez não desejada e muito menos planejada. Diferente do meu irmão mais velho, Dylan, que foi o presente de Deus da minha mãe... – De novo ela ri, e penso sobre aquele fato das pessoas rirem de nervoso. Ou de tristeza. É exatamente o que parece. – Ele sempre foi o preferido, o mais bem cuidado, o orgulho da família. Não sei exatamente o porquê. Talvez por ter um pênis entre as pernas. – Ela dá de ombros, e suas palavras me atingem mais a cada segundo. – Meus pais sempre discutiam comigo porque eu não deixava a casa brilhando, mas estava tudo bem meu irmão ficar o dia todo pela rua e não ajudar nos afazeres domésticos. Chegar tarde em casa? Jamais! Eu tinha horário, normalmente às 9 da noite, enquanto meu irmão saía e chegava a hora que bem entendesse. Almoços de família eram marcados por piadas idiotas dele, que faziam todos rir, enquanto eu, quando puxava assunto, era cortada por minha mãe, ou até mesmo pelo meu pai. Eles pagaram a faculdade dele, enquanto eu tive que me virar sozinha, decepcionando-os mais uma vez por querer ser cantora e não, sei lá, médica. Sempre foi diferente entre nós dois, e um dia eu... cansei.
Trisha suspira, e a essa altura, meus olhos já estão marejados.
- Nos meus últimos dias em casa, quando eu tinha 18 anos, acabei discutindo com eles. Foi quando minha mãe disse que nunca me queria como filha, além de outras coisas horríveis que não quero dizer. Aquilo... Nossa, aquilo acabou comigo. – Ela quase ri, e noto sua voz embargada. – Eles poderiam ser o que eram, mas eu os amava, sabe?
Ninguém diz nada. Apenas ouvimos Trisha e sentimos o coração apertado. O meu, pelo menos, parece que vai encolher.
- Só que, depois daquele dia, tudo foi diferente. Depois de chorar tanto, deixei a raiva me consumir e, finalmente, saí de casa. Foi difícil, mas... libertador. – Ela suspira. – Até hoje, mesmo depois de anos, nenhum deles me ligaram para sequer saberem onde estou nem como estou. – Ela dá de ombros, como se não se importasse, mas as lágrimas vencem. – Acho que é por isso que fiquei tão impressionada quando Saphira me ajudou com minha quase demissão. Nunca ninguém fez algo nem parecido pra mim...
Engulo o choro e tento sorrir pelo retrovisor. Trisha então respira fundo, parecendo querer retomar o controle.
- Enfim, eu sinto muito que vocês foram obrigadas a passar por esse vexame. Eu imaginei que minha mãe não gostaria de minha presença, mas não pensei que pudesse fazer isso no dia do enterro do meu pai...
Agora, Trisha se rende ao choro, e posso ver pelo retrovisor Amber amparando-a. Todas nós sentimos a dor de Trisha, mas parece que Jaque um pouco mais. Ela também chora, em silêncio. Engulo em seco, segurando o choro, mas uma lágrima desce.
- Ele estava me procurando... Ele morreu me procurando... – Trisha soluça de chorar.
Penso em tudo o que ela me disse e consigo compreender porque Trisha agia como agia. É claro que existe um motivo para isso. Ser negligenciada por tanto tempo pode te fazer uma pessoa amargurada. Não que justifique, mas compreendo Trisha agora. Compreendo sua dor, o que, agora, me faz chorar.
De repente, recebo uma mensagem. Sinto o corpo gelar ao notar que é de Bruno. Penso em quanto tempo faz que não recebo uma mensagem sua.

Too Good To Say GoodbyeOnde histórias criam vida. Descubra agora