Um só motivo

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"No qual o nosso herói tem uma visita inesperada. E indesejada."


Não sei se foram os sopapos que Jimmy Carbonell desferiu contra mim ontem, o fato de eu finalmente ter me declarado à sua irmã com todas as letras, o boato de que o ex-noivo dela está rondando Nova York ou tudo isso junto, mas minha mente ficou fervilhando boa parte dessa noite. Custei a dormir e, quando enfim, consegui pregar os olhos, tive um sonho um tanto impactante.

Sonhei com a dama mordaz. Vestida de... noiva. E acordei, alarmado, obviamente.

Confesso que a ideia de um matrimônio já havia espreitado meus pensamentos algumas vezes, porém sempre no âmbito da superfície, como uma sugestão para um futuro não tão próximo assim, um passo sobre o qual eu não precisava refletir a fundo por ora.

No entanto, agora que eu e o raio de sol enfim nos entendemos plenamente, a ideia parece ter ganhado substância e uma atmosfera de urgência dentro de mim a ponto de me fazer sonhar, como se um verdadeiro cutucão do meu subconsciente indicasse que é chegada a hora do tal passo.

Resumo da ópera: preciso me casar com Maria. Preciso e quero. E quero o mais breve possível. Para ontem, se viagem no tempo se mostrar algo viável.

Esse desejo latente me fez acordar um tanto intrigado porque... Bom, há pouco tempo, eu me imaginava morrendo solteiro. E não achava isso deprimente ou ruim, apenas natural. Mesmo porque, no meu dicionário particular, solteiro nunca significou sozinho. Então, a ideia era seguir a minha vida como ela sempre foi, sem me privar de variadas companhias femininas, até o meu derradeiro final.

Agora que a venda caiu dos meus olhos, percebo que só estava me enganando. Eventualmente, eu acabaria sim sozinho porque companhia não é o mesmo que companheira. Companhia apenas nos distrai e por isso podemos achar em qualquer lugar. Já uma companheira para a vida toda, alguém capaz de nos completar na essência e nos alegrar apenas pelo fato de existir... Essas são raras. Só existe uma para cada homem e eu tive sorte de encontrar a minha.

— Patife? Olá? Está me ouvindo?

A voz de Maria me desperta e, pego de surpresa, quase deixo a xícara de café cair da minha mão. A boa notícia é que a bebida não me queimaria, já que pela total ausência de fumaça parece ter esfriado consideravelmente há algum tempo. Aliás, o café não é a única coisa intocável na mesa farta que Jarvis dispôs essa manhã. Absorto em pensamentos, eu ainda não provei nada.

Ergo o olhar na direção da porta e vejo Maria na soleira da sala, um certo ar de curiosidade e diversão no semblante. Levanto-me da cadeira e enfim respondo a sua pergunta:

— Agora estou.

Vê-la caminhando na minha direção me transporta de volta ao sonho por um instante, quando ela se movia com a mesma graciosidade, só que com outro tipo de vestido...

— Estava tão distraído. Eu te chamei algumas vezes e nada. — Ela para diante de mim e me escrutina um pouco. — Em que tanto pensava?

Oh, Einstein! Eu não posso pedi-la em casamento agora mesmo, posso? Sem um anel decente? Não, não posso.

— Em você.

É tudo que respondo e, embora não seja a história completa, é a verdade principal. Uma verdade que parece mexer com a minha mordaz companheira, já que seu olhar dardeja ao mergulhar no meu e, pelo movimento marcante dos seus ombros, sei que ela respira mais profundamente agora.

Nota mental: providenciar um anel de noivado o mais rápido possível.

— Como está sua boca? — ela questiona, a voz um pouco mais baixa, olhando para essa parte do meu rosto com uma mistura de preocupação e algo que só posso entender como desejo genuíno.

Gênio Infame, Dama MordazOnde histórias criam vida. Descubra agora