Um Presente

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"No qual nossa heroína é muito franca, e nosso herói fica perdido."


Em minha defesa, eu não pretendia agredir meu infame patrão. Não sou adepta da violência física, prefiro mil vezes os argumentos verbais do que perder a linha e me rebaixar ao nível de quem não merece atenção. Porém, não consegui evitar dessa vez, assim como não consegui evitar o tapa que desferi contra o rosto de William ao descobrir sua traição nojenta depois de anos de noivado.

O som daquele tapa e o que me motivou a dá-lo ainda me perturbam quando penso a respeito...

Hoje foi a segunda vez que bati em um homem. Tentei, na verdade. Quando soltei o dicionário na direção dele, o Sr. Stark evitou o impacto, segurando-o no ar com um ótimo reflexo e destreza impressionante.

E por que eu fiz isso? Porque esse homem... Não, esse patife me provocou desde o instante em que cruzou a porta da biblioteca e me tirou realmente do sério ao alegar que eu — EU! — nutro algum ciúme por ele. E ainda teve coragem de repetir enquanto sorria do jeito que julga tão charmoso!

Não aguentei, o meu sangue ferveu, ainda está fervendo! Esse patife parece que veio ao mundo só para me afrontar! Para me enlouquecer!

Ciúme dele? Eu? Em que mundo isso é no mínimo verossímil? Certamente, não nesse!

— Eu nunca ouvi algo tão absurdo na minha vida — digo com desdém e revolta, mantendo algum controle para não perder as estribeiras de novo.

— Bem, a verdade pode ser absurda às vezes. Ainda assim, não deixa de ser verdade.

Não consigo arrancar o sorrisinho convencido adornado pelo bigode patético. Parece que minhas palavras surtiram o efeito contrário, convencendo Howard Stark de que eu fiquei mesmo incomodada ao ver aquela mulher na varanda do seu quarto. Argh!

Respiro fundo, tentando manter a calma.

— Então, eu tenho ciúme do senhor?

Ele assente com um meneio de cabeça, o sorrisinho ainda estampado no rosto vitorioso e sonso.

— Precisamente, raio de sol.

Rio sem humor, não vendo a menor graça em algo tão irreal.

Olhando meu patrão aos pés da escada, ergo o queixo para vê-lo ainda mais abaixo de mim e questiono com uma nota de orgulho:

— E por que uma mulher como eu perderia o juízo a tal ponto?

Stark sorri mais largamente. Maldição... Isso não está se resolvendo como eu gostaria.

— Você sabe muito bem o que leva uma mulher a se sentir assim por um homem. Mas, se prefere que eu diga com todas as letras, aí vai: você está interessada em mim, Carbonell.

Dessa vez, não preciso fingir a risada, ela vem naturalmente e logo se transforma numa gargalhada mais alta. Algo que o Sr. Stark não gosta nenhum pouco, já que o sorriso é dissipado de imediato e uma expressão um tanto ofendida surge no lugar.

Sentindo meu espírito renovado e plenamente no controle da situação, desço a escada com tranquilidade e levo a nova remessa de livros para a mesa adiante.

— Qual é a graça? — alguém resmunga atrás de mim, o tom desapontado.

Pego uma flanela e começo a delicada limpeza de cada volume.

— Nada, só lembrando de algo que eu constatei ontem e confirmo agora: o senhor é mesmo um palhaço nato. Carros irão voar no dia em que eu sentir algum interesse pelo senhor.

Gênio Infame, Dama MordazOnde histórias criam vida. Descubra agora