Lábios de Mel

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"No qual nosso herói e nossa heroína discutem a diferença entre correr e andar depressa. Entre outras coisas de suma importância."

Deixo-me cair no sofá, coloco os pés sobre a mesa de centro, cruzando as pernas, e dobro os braços atrás da cabeça. Um sorriso me vence.

— Ah, aquela mulher...

Ao notar que Jarvis me seguiu até aqui, está empertigado feito uma estátua a poucos passos, sem olhar de forma direta para mim, mas com uma expressão de alguém que tem algo a dizer só que não sabe como, desmancho o sorriso e pergunto:

— O que foi?

— É que... Nada, Sr. Stark.

A tentativa de se esquivar só me deixa mais incomodado. Por isso, endireito-me no sofá e insisto na questão:

— Diga logo, homem!

Inquieto, meu mordomo enfim tem coragem de me encarar nos olhos e começa a responder com certa cautela:

— Eu não me intrometo nas suas conquistas porque sei que não são da minha conta. Minha tarefa é apenas lidar com os possíveis e desastrosos efeitos colaterais que podem surgir eventualmente e apenas quando solicitado que eu faça o papel de advogado do diabo. Sem ofensa, senhor.

Estreito o olhar.

— Certo, Jarvis, muito obrigado por me lembrar qual a sua função na minha vida pessoal, agora desembucha de uma vez.

Ele respira fundo, suando em bicas e afrouxa o colarinho da camisa embaixo do alinhado terno. Parece muito desconfortável e fica ainda mais ao me dizer:

— Eu pensei que a Srta. Carbonell fosse diferente.

Não tenho dúvida de que ela é. Se bem que nenhuma mulher é igual a outra. Maria Carbonell só chamou a minha atenção por três motivos: 1.) aqueles belos tornozelos, 2.) porque é linda em todo o resto e 3.) por me confrontar de um jeito que não consigo ficar bravo por muito tempo, mas sim encantado.

De repente, me dou conta que talvez Jarvis não tenha se referido a esse tipo de diferença. Um mistério como meu pensamento voou tão longe.

— Você precisa ser mais específico, Jarvis. Qual é o ponto?

Ele solta a respiração e despeja de uma levada só:

— Ontem o senhor deu a entender que queria provar a si mesmo ser plenamente capaz de não agir como um mulherengo incorrigível cem por cento do tempo. Chegou a me dizer, a caminho da Marsh's Bakery, que precisava que a senhorita em questão reconsiderasse a oferta de emprego justamente para isso, para provar que ela estava enganada ao seu respeito. E deu a entender também que não queria prejudicá-la, pois percebeu pelos sapatos gastos que a Srta. Carbonell está numa situação difícil.

Não gosto do tom de Jarvis nem das palavras que dirige a mim, porém tenho que admitir que não são nada absurdas.

A contragosto, incentivo-o a continuar:

— E?

E essa manhã a Srta. Carbonell pareceu muito perturbada depois de deixar o seu quarto. Onde entrou por engano, pobrezinha. E, há menos de cinco minutos, ela saiu correndo daqui como se tivesse visto um demônio ainda pior. E eu só estou me perguntando se aconteceu alguma coisa que o fez esquecer do que prometeu, Sr. Stark.

Fecho a cara e respiro fundo, tentando me ater aos argumentos do meu mordomo e amigo. Por mais que seja incômodo ouvir um sermão, sou obrigado a reconhecer que ele está certo.

Gênio Infame, Dama MordazOnde histórias criam vida. Descubra agora