3. Inúmeras constatações

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"Não espere por uma crise para descobrir o que é importante em sua vida."

Platão

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A primeira coisa que fiz assim que constatei que era Leo que tinha chegado foi procurar pela chave da porta de entrada e abri-la de qualquer jeito, saindo em seguida por ela e correndo em direção ao meu amigo de longa data.

Minha salvação enfim chegou.

— Leo, graças a Deus — falei com os braços em torno de seu pescoço e o abracei forte, como se não o visse há anos. — Pensei que não viesse.

— Dramático. Aposto que só está fazendo drama como sempre.

— Eu não sou dramático. — Senti-me ofendido com seu comentário e recuei do abraço. — Eu estou realmente ferrado aqui.

— E o que foi que aconteceu? — perguntou com as sobrancelhas curvadas em total desconfiança. Leo não parecia acreditar nem por um minuto em minha tragédia. Olhava-me como se eu fosse um mau intérprete de uma obra de Shakespeare. — Harvey quer adotar outra criança?

— Tio Leo! — Lily apareceu correndo em direção a meu amigo e pulou em seu colo, abraçando-o forte. O sorriso grande preenchia seu rosto e ela parecia animada como sempre, porém tímida.

— Como está a minha pintora preferida? — Leo perguntou carinhosamente e o rosto da pequena garotinha foi tomado pela cor avermelhada.

— Estou bem, titio. — ela sussurrou.

— E os desenhos estão cada vez mais bonitos, não é? — Pude ouvir a voz rouca, grave e grossa de Harvey atrás de mim e toda a realidade a qual me cercava me acertou como um soco na boca do estômago. Era extremamente desagradável aquela sensação.

Porém, virei para encontrar meu suposto marido.

E lá estava ele.

Com o corpo apoiado na batente da porta e com os braços cruzados, sustentando um sorriso de covinhas, com os olhos brilhando e os cabelos despenteados. Constatei rapidamente que qualquer pessoa que batesse o olho nele pela primeira vez poderia facilmente acabar caindo a seus pés.

Também não era para menos.

Harvey parecia propositalmente esbanjar seu sorriso sedutor com uma pose despreocupada.

Qualquer um poderia cair a seus pés mesmo. Menos eu, é claro.

Eu estava ocupado o suficiente com a cilada, na qual o destino me meteu, para me preocupar com o rapaz de cabelos encaracolados.

— Ei, Harvey, tudo bem? — Encarei Leo com confusão, visto que ele parecia despreocupado ao falar com meu suposto marido, porém minha feição foi rapidamente substituída pela compreensão da cena e pelo desânimo e chateação ao perceber que meu melhor amigo também parecia ter mergulhado naquela porcaria de realidade paralela.

— Tudo bem, e você? — O olhar de Harvey encontrou o meu e rapidamente desviei, pois eu não precisava ter meu "marido" flertando comigo em frente ao meu amigo que eu queria que me tirasse dali o mais rápido possível.

— Tudo bem também — Leo disse enquanto caminhava a passos tranquilos em direção a minha casa, carregando Lily no colo e brincando com ela. — Luc me ligou pela manhã, não sei se ele te disse, e fiquei preocupado pelo modo como ele falou pelo telefone, mas acho que era somente um drama como sempre. Você sabe como ele é...

Não, não sabe, quis responder.

Encarei as costas de Leo indignado e sem saber como reagir direito.

Destino EstranhoOnde histórias criam vida. Descubra agora