Epílogo

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"O amor é a causa do movimento do Universo."

Platão

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Os melhores dias eram aqueles em que eu ficava no sofá rodeado por Lily e Jamie e vez ou outra contando uma história infantil, como Peter Pan. As crianças gostavam de ficar cada uma sentadas de um lado do meu corpo e deixavam ser rodeadas por meus braços para se aconchegarem melhor em meu colo.

Lily era a que mais comentava sobre cada trechinho do livro, parecendo estar vivendo de fato na narrativa. Parecia embarcar no navio pirata e voar pelas nuvens com o pó das fadas.

— Eu acredito! Eu acredito! — Era notória a sua empolgação todas as vezes.

E isso deixava, é claro, o bebê babão todo animado. Quando percebia que sua irmã estava com um sorriso enorme no rosto e falando sem parar, Jamie começava os seus monólogos também. E, como ele estava crescendo a cada dia que passava, seu vocabulário se encontrava cada vez mais rico. Do seu jeito torto, Jamie já estava formando algumas palavras, sendo as suas favoritas "comima" e "bincaa".

Nesses dias incríveis, Harvey estava presente, como sempre e para deixar tudo ainda mais prazeroso. Ele normalmente se sentava no chão da sala ao lado de Sirene, ria de forma cúmplice comigo quando Lily e Jamie começavam a ter um de seus imensos diálogos, mas seu programa favorito era fazer tudo aquilo assistindo Jurassic Park — ou qualquer filme de ação, apesar desse ser seu predileto. Harvey comentava todas as cenas pelo menos com uma simples palavra, ficava indignado quando um dos personagens fazia algo estúpido e normalmente dizia para Sirene todas as suas indignações.

— Esse cara é muito burro — ele falou mais uma vez enquanto acariciava a cabeça de Sirene. — Não é, Si?

Aquela folgada tinha se apegado, e muito, a Harvey. Onde ele ia, ela com certeza seguia atrás. Quando meu marido estava arrumando o telhado da garagem — que estava prestes a cair desde o dia em que eu sem querer bati com a caminhonete em uma das colunas que o sustentavam —, lá estava Sirene sentada pacientemente ao lado da escada, apenas esperando que seu companheiro aparecesse para que ela pudesse voltar a dedicar sua vida a ele.

Minha Sancho Pança é uma cobra, devo dizer.

— Pare de espionar nós dois pela janela, Luc — assim que entrava pela lavanderia da casa, Harvey falava em voz alta para que eu escutasse todas as vezes que me pegava bisbilhotando. — Você sabe que não precisa ficar com ciúmes — dizia ainda em uma voz provocativa.

Não era ciúmes. Não era e nunca foi ciúmes. E também nunca será.

Eu estava apenas anotando o nome de Sirene em minha lista. Colocando seu nome na lista de seres que me apunhalaram pelas costas alguma vez.

Ficava pensando também onde estava toda a fidelidade que ela devotava a mim?

Enquanto Lily e Jamie folheavam o livrinho de histórias que antes estava em minha mão, lancei um olhar à traidora e, segundos depoi,s ela retribuiu o olhar e abriu a boca em uma espécie de sorriso. Sua língua foi para fora e suas orelhas ficaram em pé em animação.

No entanto, não retribui com a mesma excitação. Deixei que o meu rosto fosse tomado por uma expressão de indiferença, às vezes é necessário se fazer de difícil, e dei de língua a ela. Quase sorri vitorioso, porém Sirene pareceu não se importar. Continuou com a mesma expressão e virou para Harvey, recebendo ainda mais carinho do mesmo.

Talvez ela estivesse zombando de mim, com certeza estaria, mas é claro que aquilo teria volta. Eu não deixaria os dois me trocarem sem acabar me vingando em algum momento.

Destino EstranhoOnde histórias criam vida. Descubra agora