"Amor, que estado de ser e de sentimento raro e inexplicável."
E.A. Bucchianeri, Vocation of a Gadfly
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Apesar de ser cada vez mais difícil, naquela noite não precisei fugir do corpo pecaminoso e cheio de armadilhas que era o de Harvey. Meu suposto marido acabou tendo de ficar mais do que o devido no quarto das crianças na tentativa de fazer Jamie dormir, já que o bebê ainda tinha energia para dar e vender.
Por isso, acabei caindo no sono muito antes de ele voltar e, quando meu suposto marido enfim deitou na cama, dormiu também em um sono profundo.
Quando acordei, nunca agradeci tanto por ser fim de semana. Nunca mesmo. Abri os olhos preguiçosamente e sorri da mesma forma quando constatei com meu cérebro lento que não precisaria ir trabalhar.
A sensação era maravilhosa. Quase como um alívio, fazendo-me até suspirar em aprovação.
Harvey estava em casa também e era ele quem se prontificou para cuidar das crianças. Ele fazia qualquer coisa por elas o dia inteiro. Alimentava-as, vesti-as, trocava a fralda de Jamie, auxiliava Lily no banheiro e brincava com as crianças.
Mas é claro que nem tudo são flores para mim.
Harvey insistiu que eu deveria preparar o almoço naquele dia, porque, pelas contas dele, era o meu dia de fazer "minhas maravilhosas receitas".
Ele logo verá o quanto são maravilhosas. Provavelmente irá implorar pela comida comprada daquele dia.
Ah Deus! Minhas bochechas queimam de vergonha apenas em lembrar que Harvey percebeu que não tinha sido eu a cozinhar aquilo.
Uma coisa que eu não entendia, para falar a verdade. Afinal, por que ficavam vermelhas, se eu não devia nada a Harvey?
Mesmo assim, estava me esforçando para fazer um almoço que fosse, pelo menos, comestível. Eu também iria me alimentar disso, afinal de contas. Procurei na internet receitas fáceis de fazer e comecei o preparo com certa dificuldade. Podia ouvir Harvey, Lily e Jamie na sala de estar enquanto tentava cortar tomates sem tirar um pedaço de meu dedo.
— Papai, você me levanta pra cima? — Lily pediu.
— Vocês querem brincar de aviãozinho, é? — Harvey questionou e Jamie soltou uma exclamação animada.
Parecia que eles estavam se divertindo enquanto eu dava duro na cozinha tentando preparar uma boa macarronada, sem, contudo, causar nenhum dano físico à minha mão. Terminei de cortar os tomates e os levei à panela após fritar as cebolas com um sorriso aprovador no rosto. O cheiro estava bom e eu ainda não havia queimado nada, então poderia dizer que estava em vantagem.
Ouvi passos desengonçados vindo em direção à cozinha e olhei para trás, observando Lily parada meio hesitante, na ponta dos pés, com as mãos pequenas e unidas, um olhar curioso para a panela e os cabelos presos em um rabo de cavalo.
— O que foi? — perguntei com um pouco de receio, achando que ela não estava gostando muito do cheiro. Estava com medo de que tudo saísse um completo desastre e eu tivesse de aguentar os olhares torturados de todos ali que seriam obrigados a comer da minha comida.
— Quero tomate — pediu e estendeu sua pequena mão para que eu depositasse um pedaço de tomate que tinha cortado para o molho. Por sorte, eu ainda não havia depositado tudo na panela e dei dois pedaços para a garotinha que os enfiou na boca no instante seguinte e sorriu de boca cheia para mim, mastigando com gosto. Depois disso, saiu correndo da cozinha em direção a sala de estar, apenas vestindo em seus pés meias coloridas.
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Destino Estranho
RomansaLuc Thornton sempre foi muito ambicioso. Ele não consegue esconder a inveja que sente de todas aquelas pessoas que têm carros luxuosos, mansões em bairros nobres, que fazem viagens extravagantes e que possuem dinheiro de sobra no bolso. Luc inveja i...