30. Universo ao lado

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"Aposto que às vezes você pode encontrar todos os mistérios do universo nas mãos de alguém."

Benjamin Alire Sáenz, Aristóteles e Dante descobrem os segredos do universo

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Naquele domingo, assim que Leo estava prestes a ir embora, notei o fato de Harvey tratá-lo um pouco melhor. Deu risada de algo que ele disse no momento em que estávamos nos despedindo na porta — Leo apertava meu nariz tão forte que quis socá-lo — e até mesmo apertou sua mão de forma amigável.

Eu quis saber o que se passava em sua mente, mas não tive tempo para sequer processar sobre tudo o que estava acontecendo quando os olhos de meu marido de outra realidade/ atual colega de quarto se encontraram com os meus outra vez.

Se aquilo se tornasse algo habitual, eu realmente iria precisar do acompanhamento de um cardiologista.

E, como se para piorar, naquele momento em que ele praticamente me secava, ainda tive um ataque de tosse catastrófico. Realmente humilhante. Minhas bochechas queimaram e engoli em seco, ainda tossindo e me acalmando, dizendo que tudo estava bem.

Depois que Leo foi embora, Harvey, é claro, se trancou em seu quarto, mas dessa vez pelo menos não bateu forte a porta. Ele parou, respirou fundo, olhou-me novamente, desviou assim que o olhar foi retribuído, e assobiou, fingindo estar distraído.

Eu estava gostando dessa versão de meu marido.

Harvey com uma quedinha por alguém, e esse alguém sendo eu, era extremamente engraçado.

Contudo, não nos falamos mais naquele dia. Ele parecia estar se flagelando no quarto por estar querendo me beijar e a única coisa que me restou fazer foi revirar os olhos. O fato de Harvey estar me evitando para não se apaixonar era ridículo.

Por que fazia aquilo, afinal?

O dinheiro que estava guardando era para virar padre, por acaso?

Bati na madeira e fiz sinal da cruz três vezes para afastar aquela hipótese. Harvey não poderia virar padre, porque, se o fizesse, seria impossível que nos casássemos.

Além disso, ele não tinha muito jeito para isso. Não conseguiria controlar o fogo que existia dentro de si.

Não era muito irônico Harvey ser bombeiro?

Uma curiosidade a respeito do motivo de Harvey economizar tanto e sobre o porquê dele não querer se interessar por mim cresceu rapidamente e acabei quase cortando um dedo no processo de aparar as rosas do jardim do orfanato. Estava distraído o suficiente para quase me automutilar.

Respirei fundo e olhei para a porta dos fundos do orfanato, porém meus pensamentos correram outra vez para Harvey. Se ele precisava de dinheiro, eu tinha o suficiente para ajudá-lo. Eu poderia ajudá-lo, se ele quisesse, porém algo me dizia que Harvey era tão orgulhoso que não aceitaria de muito bom-grado a minha oferta.

Contudo, uma parte daquela quantia que eu tinha adquirido após vender todas as coisas ficaria guardada para caso Harvey precisasse. Não seria muito, mas com certeza era mais do que todos os aluguéis que eu pagaria a ele.

Já o restante estava destinado a um outro plano. E essa mesma quantia se encontrava em um envelope muito bem guardado em meu bolso. Muito bem guardado mesmo, mas conferi mais uma vez só por precaução e repassei todo o plano em minha cabeça novamente só para ter certeza de que ele não apresentava nenhum furo.

Olhei para todos os lados e larguei minhas ferramentas dentro de uma caixa antes de me levantar e respirar fundo. Tinha de dar certo. Eu não estava planejando nada de mal, afinal. O universo provavelmente me ajudaria dessa vez.

Destino EstranhoOnde histórias criam vida. Descubra agora