Capítulo 9

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— O que faz aqui?

As duas disseram em uníssono, se encarando de cima abaixo e ficando óbvio o que faziam ali, já que estavam de uniforme e eram colegas de quarto.

— Quantos anos você tem? — Gabriela perguntou com um sorriso, ainda escandalizada. Sophia agora parecia bem mais jovem do que no dia anterior.

— Dezessete. — Revelou sem graça. — Pelo visto somos colegas de quarto.

— Você tem dezessete anos? — Gabriela arregalou os olhos e em seguida riu. — Acaso meu irmão sabe disso? Porque o discurso que ele fez ontem durante nosso almoço sobre dezessete anos não ser idade pra namorar é um pouco hipócrita.

— Não sabe.

— E você sabe que ele tem vinte e oito? Onze anos a mais que você?

— Bom, eu achei que tinha uns trinta, então estou no lucro. — Deu risada e Gabriela saiu do choque e foi abraça-la. — Será que pode não contar a verdade a ele?

— Eu acho que será difícil de esconder. — Revelou com um tom peculiar que despertou curiosidade em Sophia. — Mentiras não dão certo, Soph. Devia falar a verdade.

— Ah, nos conhecemos há um dia, eu não preciso contar todos os detalhes da minha vida pra ele, não é?

— Sua idade é algo importante.

— Eu tenho cara de mulher e não de menina. Por isso que ele nem me perguntou a idade. — Argumentou e viu Gabriela correr até o banheiro e logo voltar. — Por favor não conta.

— Não vou contar, mas ele vai saber, não tem como você esconder essa verdade dele. — Gabriela colocou o relógio no pulso e então puxou Sophia pra fora do quarto. — Vamos! Está quase na hora da aula, não podemos atrasar.

— Nem vi a grade, qual é a primeira aula?

— Literatura.

— Eu odeio literatura. — Respondeu com careta e se lembrou dos livros de Micael sobre sua escrivaninha. — Talvez eu comece a fingir que gosto, seu irmão gosta, não é? Vi uns livros no quarto dele ontem.

— Meu irmão adora essa chatice. — Rolou os olhos enquanto andavam apressadas pelo corredor. — Terá que se esforçar muito pra fingir que gosta, ele sabe quando tão mentindo a respeito de sua tão amada literatura.

— Droga, a porta tá fechada, o professor já chegou! — Sophia constatou olhando pra amiga. — Vamos levar bronca no primeiro dia!

— É pra começar o ano letivo com o pé direito. — Gabi riu e bateu na porta.

Alguns segundos depois, quando ela se abriu, os dois ficaram atônitos se encarando.
Aquilo parecia uma piada de mal gosto.

Micael mediu Sophia de cima a baixo e franziu a testa, incapaz de dizer uma só palavra, assim como ela, que parecia ter perdido a língua.

— Desculpe, professor. —  Gabriela sorriu ao irmão. — Acabamos nos perdendo pelos corredores.  

— Err... Bom... — Não conseguia dizer nada.

— Podemos entrar? — Micael nada disse, apenas assentiu e saiu da frente, observando Sophia ser carregada pra dentro por sua irmã.

— Galera, como eu estava dizendo. — Pigarreou algumas vezes. — Eu sou professor Borges e leciono literatura pra vocês. Eu sei que não é a matéria mais amada, mas vocês verão que ler é divertido e pode ser fascinante quando se descobre sobre o que te cativa.

Continuou sua aula, falando sobre o que os ensinaria durante o curso, seu modo de ensino e quais ferramentas usaria.

Foi mais de uma hora de aula até o sinal tocar e ele dispensar a turma.

Sophia tinha ficado em silêncio sentada ao lado de Gabi durante toda a aula, ela não fazia ideia do que falaria. As duas enrolaram para que fossem as últimas a sair. Sophia até inventou uma desculpa de que mostraria a escola pra sua nova colega para que as amigas a deixassem em paz.

E quando estavam sozinhas, se aproximou.

— Mas que palhaçada é essa? — Micael esbravejou ao ver a colegial se aproximar. — Quantos anos você tem, garota? Dezesseis?

— Ei, eu tenho dezessete e você não tem o menor direito de falar comigo nesse tom.

— Você mentiu pra mim! — Disse ainda como um absurdo, mas dessa vez claramente mais baixo. — E mentiu na cara de pau.

— Por acaso você perguntou a minha idade em algum momento? — Estava tão brava quanto ele.

— Desculpe por ter deduzido que pra encher a cara sozinha num bar de madrugada a pessoa tinha ao menos dezoito anos. Eu devo ser um idiota por ter deduzido isso.

— Eu faço dezoito anos daqui a poucos meses, não é um drama tão grande assim. — Encolheu os ombros. — Se você tivesse me dito que o seu novo trabalho era ser meu professor de literatura teria nos poupado de uma cena.

— Claro que eu teria dito, se tivesse passado pela minha cabeça que você ainda estava no colegial. — Trincou o maxilar. — Você me ouviu brigar com a Gabriela por ter dezessete e querer namorar, não falou sua idade porque não quis.

— Você estava alterado, falando asneiras sobre idade! Eu não revelaria a minha pra você naquele momento. Talvez eu nunca contasse.

— Essa discussão não vai nos levar a lugar nenhum. — Arriou os ombros, cansado daquilo.

— Não vai, devíamos conversar longe daqui. — Deu um passo pra se aproximar e ergueu as mãos para colocar em seu rosto, mas ele a impediu, balançando a cabeça negativamente. — Não pode simplesmente não querer me ver mais por causa desse impasse.

— Você é minha aluna, eu verei você todos os dias e será um tormento, eu te garanto. Mas não posso prosseguir com isso, é loucura.

— Está exagerando, fora daqui ninguém tem nada a ver com a nossa vida.

— Só que estaremos aqui todos os dias, o diretor desse lugar é retrógrado e jamais vai aceitar um de seus professores ficando com uma das alunas. Fora tudo isso, você tem dezessete anos, Sophia. É uma criança.

— Eu não sou uma criança.

Protestou alto, tinha os olhos cheios de lágrimas, a ponto de deixar escapar a qualquer momento, o que era ridículo, como podia se sentir daquela forma por uma pessoa que havia conhecido no dia anterior?

— Não torna isso mais difícil.

— Você está tornando difícil ao me dar um pé só por causa de alguns detalhes.

— Eu lutei por esse emprego, Sophia. Eu sonho em trabalhar aqui desde que eu decidi o que queria fazer da vida. Paralelo a isso, a bolsa que a Gabi tem é porque eu sou funcionário daqui, muita coisa está em risco.

— Não pode negar que gosta de mim.

— Gosto mais do que devia gostar, afinal, nos conhecemos ontem. Eu já superei coisa pior. Com licença.

E ele saiu, deixando Sophia em choque junto com a amiga, que nada havia dito durante toda a discussão.

Era um pesadelo.

Só podia ser.

Último Ano do ColegialOnde histórias criam vida. Descubra agora