thirty seven

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Hoje não era um dia comum na clínica, desde que os abortos foram proibidos em diversos lugares, mulheres de todas as partes do país viajavam longas distâncias para buscar o direito de decidir sobre seus próprios corpos.  E hoje  estávamos na linha de frente desse trabalho, oferecendo procedimentos seguros. A clínica estava cheia de pacientes, jovens assustadas, mães de família, mulheres em situações de vulnerabilidade  e eu fazia o meu melhor para aliviar um pouco desse fardo.

— Carina, temos mais duas pacientes esperando na sala de espera — Jo falou enquanto passava pela porta do meu consultório.

— Certo, vou atender elas em seguida — respondi, tentando manter a calma e a concentração no ultrassom que eu  fazia naquele momento.


Ouvi um barulho do lado de fora e eu ignorei com certeza era o alto movimento da clínica. mas os sons ficaram mais altos e agressivos, terminei o exame e fui até a porta para ver o que estava acontecendo. A Bailey estava no corredor com uma expressão séria no rosto.

— Temos manifestantes do lado de fora, Carina. Eles estão ficando violentos — ela disse com a voz tensa.

— Quantos são? — perguntei, sentindo um nó se formar no meu estômago, eu não tinha um bom pressentimento

— Bastantes. A segurança está tentando conter eles, mas está ficando fora de controle — Bailey respondeu.

Voltei pra sala de espera para verificar como estavam as mulheres lá dentro, muitas estavam assustadas e algumas chorando.

— Precisamos manter elas calmas  — falei para mim mesma, enquanto tentava pensar em um plano.

De repente, o som de vidro quebrando ecoou pela clínica, os manifestantes conseguiram invadir e  o pânico tomou conta, elas gritavam, tentando se proteger. Tentei manter a calma, mas a situação estava fora de controle.

— Todos para os consultórios! Agora! — gritei, tentando organizar uma saida para os lugares mais seguros.

Jo e Bailey ajudavam a guiar as pacientes para os consultórios, trancando as portas atrás delas. No entanto, a clínica não estava preparada para uma invasão desse tamanho os manifestantes furiosos derrubavam móveis, quebravam equipamentos e gritavam xingamentos, uma bomba de fumaça foi lançada, enchendo o ar com um gás sufocante.

Tentei manter a calma e proteger as pacientes, mas a fumaça tornava difícil ver e respirar, meus olhos lacrimejavam, tentei tampar o nariz e a boca com um pano e puxei a mão de uma paciente que estava em estado de choque e levei ela para um dos consultórios.

— Fique aqui, tranque a porta e não saia por nada — pedi tentando manter minha voz firme.

Saí do consultório e voltei ao corredor. os poucos seguranças estavam lutando para conter os manifestantes que haviam entrado, a polícia ainda não haviam chegado e a situação estava cada vez mais desesperadora, tentei ajudar mas a multidão estava fora de controle.

De repente, senti uma mão forte me puxar para trás tentei me soltar, mas ele era forte, olhei para trás e vi um dos manifestantes, com uma expressão de ódio no rosto.

— Sua assassina de crianças! — ele gritou, antes de me empurrar contra a parede.

A dor subiu pelo meu corpo mas não tive tempo de reagir, ele estava pronto para me atacar novamente quando a Bailey apareceu, empurrando ele com toda a força que podia existir numa mulher tão pequena.

— Saia de perto dela! — ela gritou, ficando entre mim e o manifestante.

Bailey era uma força a ser reconhecida, mas ela não poderia conter a violência sozinha, o pânico tomou conta de mim eu sentia o coração bater descontroladamente e a respiração se tornava cada vez mais difícil, eu sabia que estava tendo uma crise de pânico.

— Carina, precisamos sair daqui! — Bailey gritou mas minhas pernas não se moviam.

Ela tentou me puxar, mas eu estava paralisada pelo medo a fumaça, os gritos, a violência ao redor, tudo era demais para processar, o som de sirenes finalmente chegou aos meus ouvidos, mas não consegui encontrar conforto nisso. 


— Carina! vem comigo — Amélia entrou correndo e gritou sua voz desesperada.

— Eu não posso, Amélia! Eu não consigo, preciso fazer o meu trabalho, preciso ajudar essas mulheres — Minha voz saiu em um grito agudo.

 — Carina, por favor, você não pode ajudar ninguém se não sair daqui! — Teddy apareceu ao lado dela, tentando me puxar.

Mas minhas pernas não obedeciam, o pânico me paralisava, minha visão estava turva e meu corpo tremia incontrolavelmente, elas tentavam me convencer a sair, mas minha mente estava em um redemoinho de medo e confusão, o tempo parecia ter parado.

Então, vi a Maya ala atravessou a multidão correndo, os olhos fixos em mim eu sentia um misto de alívio e desespero ao ver ela ali

— Carina! — ela gritou, sua voz alta e ofegante.

Ela correu até mim, e eu me joguei em seus braços, sem forças para lutar contra a crise de pânico, sentia seu abraço firme e ela me segurou com força, me protegendo do tumulto ao redor.

— Eu estou aqui. Estou com você — ela sussurrou.

— Não consigo... não consigo... — eu repetia tentando respirar.

— Sim, você consegue meu amor, eu estou aqui e vamos sair daqui juntas — ela disse segurando as minhas mãos.

Ela me pegou no colo, ignorando meus protestos, enquanto ela me carregava eu sentia uma mistura de vergonha e alívio. Atravessamos o corredor, desviando dos destroços e dos manifestantes ainda furiosos e finalmente chegamos na saída onde a polícia e os bombeiros estavam tentando restaurar a ordem, Maya corria tão rápido e não me soltou até estarmos a uma distância segura da clínica.Quando finalmente me colocou no chão, senti minhas pernas fraquejarem, ela me segurou, me mantendo de pé.

— Você está segura agora. Respire fundo, Carina — ela disse, suas mãos segurando meu rosto, seus olhos fixos nos meus.

Tentei seguir suas instruções, inspirando e expirando lentamente e aos poucos a crise de pânico começou a diminuir eu ainda estava tremendo mas a presença de Maya me ajudava a recuperar algum controle.

— Eu estava tão assustada — admiti sentindo as lágrimas escorrendo pelo meu rosto.

— Eu sei. Mas você foi incrivelmente corajosa lá dentro, você protegeu seus pacientes, fez o que pode — ela respondeu, sua voz cheia de carinho enquanto acariciava o meu rosto.

— Eles quase... — comecei, mas minha voz falhou.

— Eu sei, mas você está segura agora e todos estão trabalhando para garantir que isso não aconteça novamente eu não vou deixar ninguém te machucar — ela disse, me puxando para um abraço apertado.

Amizade Colorida - Marina Onde histórias criam vida. Descubra agora