Capítulo 43

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― Eu sei que parece uma loucura. ― Falou Donatella em tom apreensivo. ― Mas você vai entender melhor quando eu explicar. Me deixe entrar, Aníbal. Tudo o que eu quero é salvar meu filho, e só você pode me ajudar.

Aníbal virou-se de costas para a porta, com sua respiração ofegante. Ele não podia acreditar no que acabara de escutar daquela mulher até então estranha para ele. Mas sabia que a única forma de sanar todas as suas dúvidas era escutá-la, por mais insano que aquilo pudesse parecer.

Naquele momento, Aníbal respirou fundo e disse sem olhar para trás:

― Entra!

Donatella suspirou aliviada e rapidamente adentrou, fechando a porta por trás. Nesse momento, Simone saía do elevador e viu a cena. Ela franziu a testa ao notar a interação entre Aníbal e Donatella, mas decidiu ignorar, dando de ombros.

Dentro do apartamento, Aníbal encarou Donatella, já de braços cruzados.

― Explica essa história direito. ― Disse rapidamente, olhando-a fixamente. ― Quem é você? E como assim o Heitor está vivo? ― pausou para respirar fundo e prosseguiu. ― Meu Deus, são tantas perguntas que minha cabeça está girando agora. Eu vi o Heitor morto naquele caixão. ― Esbravejou, gesticulando os braços repetidamente. ― Eu vi o desespero do César. Então quer dizer que tudo aquilo não passou de uma encenação? Uma ilusão? O que está acontecendo aqui? Fala!

Donatella abanou a cabeça em sinal de aceitação e depois disse:

― Essa história é longa, e como eu disse antes, a única coisa que importa para mim é salvar a vida do meu filho. Eu fiz muitas coisas erradas no passado, e chegou a hora de consertar todos os meus erros.

― Você falou e falou e não disse nada. ― Disse Aníbal, com impaciência.

― Calma.

― Como ter calma? Coloque-se no meu lugar.

― Eu e a Divina somos irmãs. ― Donatella despejou isso, fazendo Aníbal arregalar os olhos.

― Como assim? Nem mesmo o César e a Simone sabiam da sua existência.

― Nós éramos de uma família de classe média. Eu estava apaixonada pelo Alberto, assim como ele por mim. Íamos nos casar e tudo estava pronto para isso. Até que certo dia, à noite, minha falecida mãe ouviu a Divina falando com alguém ao telefone sobre um plano para me separar do Alberto. Ela queria me seduzir e casar com ele no meu lugar, porque o Alberto era rico e ela acreditava que através dele poderia se tornar uma atriz famosa e rica, mesmo sem talento para isso. Minha mãe a confrontou e ela, desesperada, a empurrou escada abaixo. Foi uma fatalidade e minha mãe perdeu a vida.

― O quê? ― indagou Aníbal, seus olhos arregalados refletindo incredulidade.

Donatella prosseguiu com uma voz entrecortada pelo peso das lembranças:

― Eu estava atrás da porta e vi tudo acontecer diante dos meus olhos. Sem querer, fiz um barulho e a Divina percebeu que eu estava em casa. Tentei fugir para pedir ajuda, mas fui golpeada na cabeça e desmaiei imediatamente. Quando acordei, estava algemada em uma cama de hospital ― disse, com os olhos marejados. ― Divina colocou a culpa em mim pela morte da minha mãe. Ninguém acreditou na minha inocência. Fui presa e condenada a 50 anos, e na prisão descobri que estava grávida do César. Quando ele nasceu, tive de entregá-lo, pois não queria que soubesse que sua mãe foi condenada por matar sua avó. Abri mão dos meus direitos maternos em favor de Alberto. Por isso, meu nome não está nos registros de nascimento do César. Mais tarde, Alberto caiu na armadilha de Divina e se casou com ela. Ela adotou meu filho, e foi nesse momento que me arrependi amargamente, pois inadvertidamente entreguei César à mulher que arruinou minha vida.

Aníbal estava visivelmente atordoado com tudo o que acabara de escutar. Ele caminhou até o sofá, onde se sentou com a cabeça baixa, sem forças para ficar de pé.

Donatella chorava em silêncio, aproximando-se lentamente até se sentar no sofá em frente a Aníbal.

― Aquela mulher destruiu minha vida ― disse com a voz embargada. ― Por culpa dela, não pude viver ao lado do homem que amava nem ver meu filho crescer e se tornar o homem que é hoje. Não posso permitir que ela destrua a vida de César como destruiu a minha.

Aníbal ergueu a cabeça e perguntou:

― Como você saiu da cadeia?

― Liberdade condicional por bom comportamento. Conheci uma senhora rica na prisão, vítima de uma armação da própria filha para ficar com sua fortuna. Ela me revelou onde e como a cessar seu dinheiro escondido antes de morrer. Foi minha família lá dentro. Ao sair, jurei usar cada centavo para fazer justiça e recuperar o que me foi tirado.

Aníbal coçou a nuca, perplexo e perguntou:

― E Heitor? Como conseguiu forjar a morte dele sem ninguém perceber?

― Tenho acompanhado a vida de todos de perto por muito tempo, inclusive a sua. Quando descobri que Artur era o executor do atentado e que ele e Divina estavam contra César, juntei os pontos e deduzi que tentariam matar Heitor se ele sobrevivesse ao atentado.

Aníbal levantou-se abruptamente, com os olhos arregalados por conta da revelação sobre Artur.

― Artur e Divina estão juntos nessa armação?

― Sim. Artur não é quem pensam que é. Meus netos e Alberto estão em perigo dentro daquela casa.

Aníbal levou as mãos à cabeça, voltando a se sentar. Encarou Donatella com determinação.

― Me conta tudo. ― Disse olhando a fixamente.

― Por isso eu decidi subornar o médico para simular a morte de Heitor, fazendo parecer que ele estava morto no caixão. Eu sei que não foi o método correto, mas era a única forma de salvar a vida dele e garantir que meus netos não perdessem o pai. No dia do enterro, os caixões foram trocados e tudo foi feito minuciosamente para que nada desse errado.

― Eu não consigo entender. ― Aníbal balançou a cabeça em negação. ― Por que a Divina mandou matar Heitor? Ela era louca por ele. Cheguei até a pensar que ela o amava de verdade.

Donatella engoliu em seco e disse com dificuldade:

― Foi a Divina quem matou a Sofia.

Aníbal levou a mão à boca em choque. ― Então quer dizer que...

― Sim, é exatamente o que você está pensando, Aníbal. Para evitar ser denunciada à polícia, Divina mandou Artur matar Heitor. Ela não ama ninguém além de si mesma.

O suor começou a surgir na testa de Aníbal, lágrimas no canto dos seus olhos. Tudo o que ouviu era difícil de digerir. Ele sabia que o tempo estava se esgotando e precisavam agir para salvar todos da maldade de Divina.

― O que eu preciso fazer? ― indagou Aníbal. ― Porque, se depender de mim, aqueles dois vão pagar por tudo o que fizeram.

Donatella sorriu com um alívio visível, estendendo a mão em direção a Aníbal. Ele a olhou por um momento antes de apertá-la firmemente. Naquele instante, um silêncio carregado de determinação tomou conta do lugar, misturado com um desejo profundo por justiça.


DOCE ILUSÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora