"Num edifício sem janelas desenhei os olhos dela, entre vestígios de bala e a luz da televisão. Os meus olhos têm a fome do horizonte, sua face é um espelho sem promessas. Por dezembros atravesso oceanos e desertos, vendo a morte assim tão perto, minha vida em suas mãos." - Raimundo Fagner e Zeca Baleiro
DIAS DEPOIS...
ROBERTO NASCIMENTO
No quarto compartilhado com duas camas, eu estava parado de braços cruzados. Encostado na parede, observei o sono dos dois melhores amigos e o tórax dos dois que subiam e desciam em sincronia, como se mostrasse a harmonia de suas almas. Ambos estavam bem, fora de perigo, mas foram dias difíceis. Eu fiz um depoimento de mais de três horas no plenário do Rio e joguei merda no ventilador. Fraga vem me apoiando publicamente com garra e, agora, minha família e eu somos parte de um sistema de proteção que nos deixa mais tranquilos. Eu contei tudo o que sabia, reconheci meus erros e respondi todas as perguntas que consegui. Eu dei porrada em muita gente. Cabeças começaram a rolar por minha causa. Eu botei muito político corrupto na cadeia, ainda que não tenha precisado invadir seus condomínios de luxo pra isso. Deputados, senadores, vereadores, todos os que estavam no dossiê das milícias que o Fraga reuniu e que eu disse estarem envolvidos. Mas também por causa do meu discurso, teve filho da puta que foi pra vala muito antes do esperado. Vários policiais militares envolvidos com a milícia e soldados do Rocha estão desaparecidos. Vários corpos foram encontrados carbonizados, vários carros abandonados em pontos diferentes da cidade cheio de cadáveres dentro. Dentre eles, um galpão de distribuição de gás em Rio das Rochas foi incendiado no que chamaram de uma explosão acidental. Nesse galpão encontraram os corpos queimados de Marreco, Santos, Rocha e mais dois PMs. Eu obtive acesso a parte dos laudos da investigação e a autópsia disse que eles já estavam mortos quando foram queimados. Eu já sabia disso. Elisabetta passou esses caras. Ela vingou a mim, ao meu filho e a si mesma. Ela é a heroína da nossa história. O foda é que, mesmo assim, mesmo com a maior queima de arquivo da história do Rio de Janeiro acontecendo, o sistema ainda estava de pé.
— Porra. — ouço Luan resmungar e o vejo acordado, me encarando — Tu fica aí velando meu sono, mesmo? Que bagulho doido, parceiro.
Abro um sorriso cansado.
— Eu tô velando o sono dela. — o corrijo
Elisabetta está na maca ao lado, cochilando. Fez exames hoje de manhã e, enquanto aguardamos os resultados, ela acabou pegando no sono. São muitas medicações.
— Sei. — ele faz careta arrumando as costas nos travesseiros — Você é obcecado por mim, que eu sei.
Nós dois rimos.
— Vai nessa. — murmuro
Me aproximo das macas, ficando entre os dois e me debruço sobre ela, beijando sua testa. A observo serena.
— Você fica com cara de paspalho quando olha pra ela. — Luan comenta
— Eu sei. — dou de ombros — Não dá pra disfarçar. Acredite, eu já tentei.
— Tentou nada. — ri — Desde o Buxixo que tu fica assim.
Sorri.
— E o Rafa? — pergunta
— Saiu da intubação, está bem e consciente. — conto — O deixei com a Rosane e com a enfermeira que estavam dando banho nele.
— Esse moleque deve estar no paraíso com a enfermeira banhando ele.
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Amores de Elite
Fiksi PenggemarO coronel do Batalhão de Operações Especiais Roberto Nascimento estava acostumado a viver com o sangue nas mãos. Conhecido por ser impiedoso e nada tolerante, ele se vê desafiado quando recebe a missão mais arriscada de sua vida, capaz de lhe entreg...