𝟕𝟖 ⌁ 𓈒 ֹ ANGELINA CORVETTI ˳ׄ ⬞

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O som monótono do monitor cardíaco foi a primeira coisa que Angelina ouviu ao despertar. O mundo ao seu redor parecia envolto em um silêncio espesso, interrompido apenas pelo barulho das máquinas que marcavam o ritmo de sua sobrevivência. O ar carregava o cheiro limpo de desinfetante, enquanto a luz branca invadia o quarto com uma clareza quase agressiva, como se exigisse que ela encarasse a realidade.

Lentamente, ela abriu os olhos, sentindo o peso da exaustão em cada movimento. Tudo ao seu redor parecia inóspito, frio, como se o quarto ecoasse as memórias que ainda queimavam em sua mente. Os primeiros segundos entre o sono e a vigília eram nebulosos. Seu corpo ainda carregava as marcas da prisão: cortes que não cicatrizaram completamente, hematomas que se enraizavam em tons de púrpura e amarelo. Ela tentou se mover, mas o peso da fraqueza e da dor lhe devolveu ao travesseiro.

Então, a lembrança veio como uma torrente. Bartor, sua voz áspera, as sombras do porão, o açoite constante da dor física e emocional. O pânico ameaçou tomar conta, mas algo em seu entorno parecia diferente agora. Havia uma janela próxima, e pela primeira vez em semanas, ela viu o céu. Azul pálido, salpicado de nuvens leves, como se o universo quisesse lembrá-la de que ainda estava ali. Uma lágrima solitária deslizou pelo canto de seu olho, traçando o contorno de seu rosto magro. Não era apenas a dor física que a fazia chorar, mas o alívio, a incredulidade de estar viva.

Angelina suspirou com a aceitação. Sua sobrevivência não era o fim; era apenas o início de uma nova batalha. Uma batalha para se reconstruir, para encontrar quem ela era antes de Bartor, antes de Lorenzo, antes de tudo. Por enquanto, porém, ela permitiu que a fragilidade a envolvesse, porque sabia que, uma hora, isso também passaria.

A loura virou a cabeça com esforço, sentindo o peso do cansaço e da dor em cada movimento. Seus olhos, ainda turvos, encontraram Serena sentada em um pequeno sofá perto da janela. A postura dela era tensa, quase rígida, com as mãos entrelaçadas nos joelhos, apertando os dedos num gesto nervoso. Serena parecia alheia ao mundo ao redor, perdida em pensamentos que claramente a consumiam. Os olhos carregavam um brilho úmido, um misto de preocupação e culpa que Angelina não soube interpretar de imediato. A amiga parecia menor, como se a tensão dos últimos dias tivesse roubado parte de sua presença vibrante. Angelina tentou falar, mas sua voz era apenas um sopro seco, rasgado pela dor. Ainda assim, o som foi suficiente para chamar a atenção de Serena, que ergueu o olhar em um sobressalto. Quando seus olhos se encontraram, a máscara de força que Serena tentava manter desabou.

— Angelina... — murmurou, quase como se não acreditasse que ela estivesse realmente desperta.

Levantou-se apressada e se aproximou da cama, o toque hesitante de seus dedos encontrando a mão de Angelina.

— Me desculpa, foi minha culpa...

Angelina fechou os olhos por um momento, absorvendo as palavras, mas também os fragmentos de memórias que começaram a surgir, como lampejos de um pesadelo recente. Bartor. O cheiro de sangue. A última cena que viu antes de apagar totalmente. O momento em que Lorenzo degolou Westwood foi gravado na memória de Angelina como uma satisfação sombria. Pela primeira vez, ela viu o desespero nos olhos de seu predador, a arrogância substituída pelo pavor nos segundos finais antes que a morte o tomasse. Não havia como negar: aquilo era uma vitória. Abriu os olhos novamente, agora fixos em Serena, com a voz presa na garganta, sufocada pelo turbilhão de emoções.

— Não... — começou, a voz ainda fraca. — Não foi sua culpa.

Serena apertou mais forte sua mão, a expressão grave, mas com um alívio sutil que Angelina se permitia sentir.

— Eu te convenci a entrar nessa, você não teve culpa, Serena. É uma ótima amiga.

A morena suspirou, abaixando os olhos por um instante.

𝗙𝗜𝗥𝗘 𝗔𝗡𝗗 𝗕𝗟𝗢𝗢𝗗 - @𝗅𝟢𝗌𝗍𝗋𝖾𝗂𝖽Onde histórias criam vida. Descubra agora