𝟖𝟎 ⌁ 𓈒 ֹ ANGELINA CORVETTI ˳ׄ ⬞

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O olhar de Angelina se perdeu, desviando-se do rosto de Serena para um ponto invisível no quarto. Era como se a vastidão do vazio naquele espaço a chamasse, envolvesse sua mente já exausta. Apenas o som insistente das máquinas preenchia o ambiente, ecoando como um compasso mecânico que marcava o tempo de sua angústia. O silêncio entre elas não era um alívio, mas um abismo, uma pausa profunda que parecia absorver todo o ar, enquanto Angel tentava reunir os pedaços de uma verdade que chegara rápido demais.

As palavras de Serena flutuavam em sua mente, vagas, mas pesadas, como um murmúrio que se recusava a se dissipar. Angelina sabia que a amiga tinha razão. Ela não podia arriscar, não agora. Pela primeira vez em sua vida, a luta não era apenas por si mesma, mas por alguém que, silencioso, repousava dentro dela, dependendo de sua força. Buscou, do fundo de sua alma, uma saída que não a sufocasse, mas a única resposta que encontrou foi um suspiro longo, profundo, quase um lamento.

— Ficarei na Itália. Mas darei um jeito de ficar distante dele. — sua voz mal ultrapassava o limite de um sussurro. — Pelo menos até encontrar uma maneira de ir embora de vez, sem estar no risco de morrer pelos erros que nunca foram meus.

Endireitou-se na cama, ajustando o travesseiro para que pudesse sentar-se com alguma dignidade. Seus olhos, cansados e turvos, buscaram os de Serena, que a encarava com um misto de determinação e uma esperança frágil, como se tentasse emprestar à amiga algo que ela mesma quase não possuía. Angelina tinha sobrevivido à violência de seu pai, ao peso da máfia, ao amargo do perigo constante. Mas agora, o mundo parecia ainda mais brutal, mais hostil, como se conspirasse para quebrá-la de todas as formas possíveis.

"Você vai ser uma mãe maravilhosa, sabe disso, né?"

As palavras de Serena foram um bálsamo inesperado. Um sorriso fraco e tímido brotou nos lábios de Angelina — um gesto tão pequeno, mas que ela temia nunca mais ser capaz de fazer. Há dias não sentia a leveza daquele movimento. Era como se, por um breve instante, a luz tentasse romper as trevas que habitavam sua alma.

Os olhos marejados, Angelina assentiu em silêncio. Lentamente, estendeu os braços, convidando Serena para um abraço. Quando os corpos se encontraram, o calor da amiga pareceu derreter o frio que tomava conta dela, um frio que não vinha da temperatura do quarto, mas da sensação gélida de uma alma cansada, esgotada, morrendo aos poucos.

— Titia Serena. — murmurou, deixando uma lágrima silenciosa escorrer por sua face.

O riso emocionado de Serena preencheu o quarto, trazendo um instante fugaz de leveza. Ambas compartilharam o momento, um vislumbre de normalidade em meio ao caos.

— Aproveite a França, Serena. Aproveite tudo o que puder lá fora. — Angelina deslizou o polegar pelas costas da mão da amiga. — Mas volte, volte assim que puder... por favor.

Tentou sustentar o sorriso, mas ele se desfez rapidamente. A máscara que carregava era frágil demais para suportar o peso de sua dor. Abraçou Serena novamente, apertando-a com toda a gratidão que sentia. Sabia que não merecia toda a bondade que recebera, mas ainda assim se apegava a ela como uma âncora.

Quando Serena finalmente deixou o quarto, o som da porta se fechando foi um corte seco na bolha de conforto que haviam construído. Angelina soltou o ar preso nos pulmões com força, como se tentasse, de uma só vez, expurgar o peso que ainda a esmagava. Olhou para sua barriga, tão comum, tão inalterada, como se guardasse um segredo ainda invisível ao mundo. Jamais lhe passara pela mente a possibilidade de estar grávida. Os sintomas que a consumiram nas últimas semanas pareciam ser apenas reflexos de um corpo exausto, ou talvez da mente que carregava pesos insuportáveis. Mas agora, o significado era outro — um peso maior, mais profundo, que não se media em fraqueza, mas em responsabilidade, em medo e em uma estranha e inesperada esperança.

𝗙𝗜𝗥𝗘 𝗔𝗡𝗗 𝗕𝗟𝗢𝗢𝗗 - @𝗅𝟢𝗌𝗍𝗋𝖾𝗂𝖽Onde histórias criam vida. Descubra agora