A evolução

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Os dias se passaram, as semanas voaram, eu estava cada vez mais familiarizada com os habitantes da Cidadela e me tornando parte de um novo mundo, só me restava uma coisa, esquecer o passado completamente.
Cá estou eu, meia noite, deitada, olhando para as estrelas no meio de uma praça.
- Pelo visto não sou o único acordado na Cidadela.
Dei um sorriso me levantei e olhei para trás.
- Patrick Campbell.
- Kimberly Sparks.
- O que faz aqui?- Perguntamos ao mesmo tempo e rimos.
- Primeiro as damas.
- Eu... só queria olhar as estrelas e refletir um pouco.
- Parece interessante.
- E você?
- Eu estava indo para a arena mas aí vi uma figura suspeita deitada no chão tarde da noite.
Eu ri e dei um soco de leve no braço dele.
- Ia fazer o que na arena?
- Treinar, óbvio.
- Ah, é meio escuro à noite, principalmente na arena.
Ele ligou uma lanterna.
- Sou um cara prevenido.
- É, você pensa em tudo mesmo.
Escutamos um grito do lado de fora do muro da Cidadela e alguma coisa batendo no portão.
- O que foi isso?- Sussurrei.
- Maníacos.
Começamos a ouvir batidas no portão, ele me deu uma arma e uma faca.
- Vamos ter que subir no muro.
- Patrick isso é loucura.
- As pessoas fazem loucuras para sobreviver, não fazem?
- É.
Ele começou a correr para perto do portão e escalou o muro.
"Subir em árvores tudo bem agora escalar muros já é sacanagem." Pensei.
- Kim tá esperando o que?!
- Olha não sei escalar muros tá?
- Se não fosse tão folgada já teria escalado!
- Se você não fosse tão babaca já teria me ajudado!
Ele olhou para mim como se eu tivesse acabado de ganhar uma guerra, depois deu um sorrisinho meio sem jeito.
- Tá, você tem razão, desculpa.
Ele estendeu a mão e me ajudou a subir.
- Mais leve do que imaginei.
- Achou que eu pesava quanto? Trezentos quilos?
- Quase isso.- ele disse dando aquele sorriso irônico de sempre.
- Engraçadinho.- eu disse revirando os olhos.
Ouvimos outra batida no portão e olhamos para o lado de fora tinha um maníaco batendo no portão, Patrick atirou nele sem hesitar.
- Patrick, maníacos não raciocinam direito, como...?
- Eu tenho uma teoria, e não gosto dela.
Ele não demonstrava muita preocupação, mas eu sabia que no fundo ele estava com tanto medo quanto eu.
- E que teoria é essa?
- Droga... a gente precisa falar com o Líder.
Ele pulou para dentro.
- Pode pular Kim, eu pego você.
Pulei e ele me agarrou como se, se eu caísse eu fosse quebrar.
- Obrigada, pelo menos agora sei que posso confiar em você.
- Como assim?
- No Antigo Mundo eles costumavam se jogar para que outra pessoa os pegasse, se chamava "teste de confiança".
- Como sabe disso?
- Ah, eu leio bastante.
- Isso é bom, seu apelido deveria ser Nerd e não Blade.
- Cala a boca.
Fomos até a torre e batemos na porta, que foi aberta quase imediatamente, Líder estava sentado em uma poltrona, cochilando.
- Devemos mesmo acorda-lo Patrick?- sussurrei.
- Nesse caso sim, é importante.
Ele sacudiu Líder um pouco, ele acordou sobressaltado.
- Senhor, perdoe-me por acorda-lo à esta hora da noite, mas tenho assuntos muito importantes para tratar com o senhor.- Patrick disse nervoso.
- Em uma escala de um à dez, qual o nível de importância deste assunto, meu jovem?
- Eu diria que... talvez, nove.
Líder arregalou os olhos.
- Pode falar.
- Há poucos minutos atrás fomos atacados por um maníaco que batia no portão principal da Cidadela.
- Não parece tão importante.
- Essa parte não é, mas se analisar bem, maníacos não raciocinam direito, certo?
- Certo... mas o que está insinuando?
- A morbo pode ter se desenvolvido, os maníacos podem ter evoluído.
Olhei para os dois assustada.
"Maravilha! A morbo evoluiu e agora sim estamos ferrados! Agora tenho certeza de que a humanidade vai ser extinta!"- Pensei.
- Não precisam se preocupar, meus filhos, todos sabíamos que isso poderia acontecer um dia.
"Nervosa", a única palavra útil para descrever como me sinto agora, só quero que tudo isso acabe logo, quero ver cidades reconstruídas, o fim da doença, pessoas mais felizes, eu quero um futuro.
Mas a esperança de um futuro para a humanidade que ainda resta é mínima e com meu pessimismo, é claro que acho que não temos chance.
Patrick ainda conversou um pouco com Líder mas não prestei atenção, só conseguia pensar na frase:"A doença evoluiu."
Saímos da torre, eu estava de braços cruzados e não queria olhar para os lados.
- Kim?
Não respondi, então ele me abraçou.
- Não é a única que está assustada, eu também estou com medo.
- Sei que está, afinal quem não estaria?
- Kim você só vê o lado ruim das coisas.
- E tem algum lado bom?
- Tem.
- Por exemplo?
- Como...agora seremos mais cautelosos com relação à doença, seremos mais treinados, e ficaremos mais alertas para proteger quem amamos.
- Talvez tenha razão, mas esqueçeu de um detalhe.
- Qual?
- O medo, ele muda as pessoas mais do que qualquer coisa no mundo, Patrick eu estou com medo, eu não quero morrer com dezessete anos eu quero uma vida, um futuro, mas é tão difícil acreditar que terei um.
- Exatamente como eu disse Kim, você só vê o lado ruim das coisas.
- Eu menti?
- Não Kimberly, mas dá para ter um pouco de otimismo pelo menos uma vez na sua vida?!
- A última vez que fui otimista minha família inteira morreu.
Saí andando, estava perto de casa mesmo, ele agarrou meu braço o que me fez querer dar um tapa na cara dele.
- Sei que é difícil Kim, mas lembre-se, você não foi a única aqui que perdeu alguém que amava.
- Estou ciente disso, mas... o problema, não é perder alguém, o problema é querer essa pessoa de volta.
Ele colocou as mãos no meu rosto.
- Kim, tem que se acalmar, ok?
- Ok.
- Agora, consente que eu leve você para casa?
- Tem meu consentimento.
Ele me acompanhou até a porta do estabelecimento.
- Boa noite Kim.
Ele me deu um abraço, e como aquilo me acalmou.
- Boa noite Patrick...
Ele se afastou acenando e sorrindo, acenei também e entrei em casa.
Tomei banho, coloquei outra roupa, e fui para o meu quarto, deixei a janela aberta e deixei o vento gelado entrar, me deitei na cama, me cobri com o cobertor e adormeci.

Diário de uma sobrevivente_Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora