08. Iniciando diálogos.

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ARABELLA

O sol brilhava fortemente ao horizonte, quase três horas da tarde e eu estava ali, no rancho dos meus avós, que na verdade são bisavós. Porém eu os chamo assim, força do hábito. E também, eles são bisavós, avós, pais... Tudo. Suspirei alto girando o rosto para o lado, vendo minha família toda reunida em volta de uma mesinha, no belo jardim que o rancho possui. Certo, minha família não tem tantas pessoas assim, meu pai foi criado pela minha bisavó, assim como eu também fui criada pela bisa Judy. Na verdade todos na família passaram pelas mãos daquela senhorinha de quase oitenta anos.

Meus primos são poucos, já que eu não mantenho contato com a minha família por parte de mãe, só com um tio e dois primos. Aquela intimidade que se consegue com toda a covivência de uma vida, essa eu não tenho com eles. Senti alguém batendo levemente no meu ombro, antes de sentir um corpinho macio ser posto sobre minhas pernas.

Encarei a pequena Elena, afilhada do meu pai, que sorria lindamente para mim me fazendo rir de volta.

— Você sabe que ela gosta muito de você. — Ouvi a voz da minha prima, mãe da Elena, o que me fez apenas alargar ainda mais o sorriso.

— É um gostar recíproco! — Sentenciei, fazendo a pequena gargalhar.

— A família está sem saber muito que fazer em relação a "aquele" assunto. — Com certeza a Alice estava se referindo ao assunto que meu pai e minha vó deixaram claro para a família, o abuso que eu sofri.

Eu não gosto de pensar nele, muito menos falar. Então apenas dei de ombros querendo que o assunto mudasse em um piscar de olhos, Alice pareceu entender já que simplesmente ficamos caladas. Sendo interrompidas pelas gargalhadas de Elena, que com três anos agia mais como um bebezinho de tão mimada que havia sido.

Elena saiu do meu colo correndo em direção onde meu pai já esperava de braços abertos, apenas balancei a cabeça.

— Vou aproveitar e fazer umas ligações. — Alice falou se retirando em seguida do meu lado, encarei o local onde ela estava segundos atrás, ri levemente balançando a cabeça.

Novamente fiquei ali, de certa forma sozinha, porém os pensamentos nunca me abandonando, eles são o que mais me dão medo, por vezes meu pior inimigo. Quando meu pai falou com minha vó, nós estávamos na casa dele, confesso que ouvir minha vó recebendo a noticia foi milhões de vezes pior do que eu imaginei que seria. Depois de um longo período em silêncio, os dois acharam melhor deixar a família informada sobre tudo, tanto o fato e os processos sobre o Max, a Evangeline também.

Desencostei-me da cerca que dava para um campo com algumas cabeças de gado. Tipicamente texanos. Caminhei em direção para dentro da casa, indo direto para onde é meu quarto naquela casa enorme que mais parecia uma casa senhoril do tempo da escravidão, porém o rancho possui três casas dentro, a da minha bisa que fica mais para dentro, a da minha avó — mãe do meu pai — e a do único filho vivo da vó Judy, engraçado uma casa daquelas sendo especificamente de negros. Já que por parte do minha bisavó todos tem o tom de pele mais escuro, tenho um primo que é negro dos olhos verdes! Acho incrível, e por causa disso, minha família me zoa por ser branquial demais e ficar roxa com qualquer coisinha mínima.

Assim que entrei no meu quarto, abri a cortina para logo depois pegar meu celular sobre a escrivaninha, ligando-o em seguida.

Desde o dia que eu cheguei a Wicksville já se passaram duas semanas, sim o tempo realmente passou rápido e não irá demorar muito para eu estar voltando para Berkeley. As coisas por aqui já não estavam tão estranhas como quando eu cheguei, porém quando andava pelas ruas sempre tinha algum olhar furtivo, apenas esperava que ninguém viesse perguntar algo sobre "aquilo". Sim, tem pessoas que não tem o mínimo de respeito pelos outros.

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