36 - Kleverson

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Hoje vou estrear minha motinha! É usada, mas já ajuda demais! Só espero que não tenha blitz em lugar nenhum.

A caminho da igreja vejo... Arnaldo! Tenho certeza que era ele no ônibus que passou em direção contrária. Já que saí bem cedo, mudo a direção e sigo o ônibus.

Surpresa: Arnaldo desce em outra igreja da mesma que eu comecei a ir, mas esta é menor. Vejo ele entrando e fico a pensar: por que Arnaldo vem aqui, se lá no centro é mais perto da casa dele?

Volto para a sede e participo da reunião. Depois aviso meus novos amigos que a igreja no Mazini é mais perto para mim, e agora vou começar a participar lá. Só o que pedem é para mantermos contato, além de vir na sede às vezes. Que bom que eles gostam de mim! Tão gostoso ter amigos. Por isso não vou pegar raiva do Arnaldo, e vou reatar nossa amizade.

*

Hoje é minha primeira vez na igreja do Mazini. Desde a primeira vez que fui na do centro, me chamam para uma tal FJ. Fiquei sabendo que tem aqui na igreja do Mazini também, e é bem hoje!

Também resolvi dar um trato no visual. Depois que conheci meus amigos na igreja, e entendi que sou querido, notei que estava bem maltratado. Hoje de manhã até pensava comigo mesmo se não seria por isso que as pessoas não gostavam de mim, em especial as meninas. Na escola nunca tive oportunidade de ficar com menina nenhuma. Isso me tornou fechado com elas, até conhecer as meninas da igreja, que falam comigo como se já me conhecessem há anos.

Barba feita, cabelo acertado, roupas novas, tênis limpo. Meu dinheiro acabou, senão teria um perfuminho também.

*

Que gente animada! Senti como se estivesse entre amigos de anos! Pulei, dancei, rodopiei, corri... E durante todo o tempo, mesmo tendo somente uns quinze jovens, Arnaldo não me notou. Ou não me reconheceu com barba e cabelo feitos.

Agora que acabou a reunião, não posso ir embora antes disso:

— Arnaldo?

Ele responde educadamente um olá, mas fica reparando por alguns instantes.

— Kléver? O que você faz aqui, cara? Tá diferente! O que aconteceu, cara?

Arnaldo arrisca um abraço, mas tanto ele quanto eu não ficamos à vontade e nos cumprimentamos com um aperto de mão forte. Por mim, está suficientemente ótimo!

— Arnaldo, aconteceu tanta coisa ultimamente. Cara, você é dessa igreja faz tempo?

— Sou... sim... — ele abaixa a cabeça por um instante. — E você, faz quanto tempo que tá vindo?

Conto para Arnaldo sobre a cura que recebi numa oração dos pais dele. Mas também começo a me atropelar nas palavras ao falar de como estava sentindo falta do apoio que ele sempre me dava nas horas difíceis, que tanto me fez falta nos dias que pensei em desistir de tudo.

Os quatro jovens que ainda não foram embora parecem estar em silêncio, olhando para Arnaldo e eu. Só então percebo que meu rosto está molhado. Arnaldo tenta e me abraça, e logo vem outro rapaz também com o mesmo gesto.

Para não ficar com uma péssima primeira impressão aqui na igreja do Mazini, forço-me a parecer forte, contenho-me e me ponho de cabeça alta. Despeço-me do pessoal e vou para casa em minha motinha.

Debaixo do capacete, porém, deixo sair todas as lágrimas numa estranha mistura de raiva com alegria.

Quantas voltasOnde histórias criam vida. Descubra agora