44 - Heloísa

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Olho para trás e vejo centenas de pessoas olhando para mim. Estou na frente do altar com o pastor e mais umas dez pessoas. Sinto-me cansada e descabelada. Mas por dentro, muito diferente do que quando cheguei. Leve. Com vontade de viver!

— E agora, como você está?

Do meu lado, uma obreira sorri. Não sei como explicar, dentro de mim é como se uma luz se acendesse, e todo aquele desejo de ficar escondida do mundo fosse ofuscado por essa luz. Só escondo o rosto por causa de lágrimas que não parecem combinar com meu riso. A obreira me abraça e me leva até o bebedouro ao som de muitas palmas.

Vim e voltarei para casa sozinha. Mas antes de ir, uma moça bem morena me pede um minuto.

— Ei, menina, tudo bem? Acho que te conheço de algum lugar...

— Oi. Eu era da igreja do Sílvio Mazini, mas agora vou começar aqui.

— Ah, tá ligado! Meu nome é Ariana — ela estende a mão.

— Heloísa — eu aperto sua mão.

— Já conhece a FJ?

— Sim, eu era da FJ lá, até que... bem... aconteceram coisas e...

Lembrar o passado ainda dói, mas a pausa logo é interrompida.

— Heloísa, não importa o que aconteceu. Olha, não se afaste de novo, por causa de ninguém, tá? Pega firme com a gente, eu vou te ajudar, está bem?

Sinto confiança nos olhos da Ariana. Sorrio e aceito sua ajuda. Ela também parece contente com minha presença. Ela se importa.

— Viu, hoje está tarde, você tem que ir pra casa, você deve morar longe, né? Mas vem amanhã na FJ, e a gente conversa mais, pode ser? Ah, e na próxima quarta-feira, você pode vir?

— Não sei, acho que sim.

— Vem, pra ser testemunha da minha consagração. É algo importante pra mim, e seria uma honra ter você aqui.

Nunca fui convidada para uma cerimônia de... consagração. Não sei o que é isso, mas parece importante. Parece algo chato também, mas que seja. Quero começar uma vida nova, por isso preciso deixar para trás coisas que eu curtia mas não faziam bem. Sempre soube que era perigoso me envolver com a mania de se cortar, pois tive amigas que chegaram ao suicídio dentro de um grupo do qual fiz parte há alguns anos.

Agora vou me envolver com coisas novas. Amigos que me querem bem. Espero que na FJ daqui tenha amigos. Ou melhor, amigas. Quero dar um tempo para os meninos, pois não posso me quebrar por dentro outra vez.

E esse pensamento que ainda me assombra: onde está Arnaldo agora? Saia da minha cabeça!

Quantas voltasOnde histórias criam vida. Descubra agora