21 - Heloísa

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Se tem uma coisa que eu concordo totalmente é que devemos arriscar sem medo de perder, até porque a perda é de quem rejeita. E o não nós já temos. Mas quanto a esperar a atitude do homem, isso não faz sentido no mundo de hoje.

Por isso decidi por conta própria dar um passo rumo à minha felicidade. Cansei de ficar só dando pistinhas e esperando os meninos entenderem. Desta vez será diferente.

Fiquei feliz por Arnaldo ter voltado à Terapia. Seus amigos também. Que bom que ele achou forças para continuar lutando para vencer qual seja a situação difícil que ele passa e não conta para ninguém. Às vezes nos falamos por WhatsApp até de madrugada, mas só conversamos assuntos como: o que a tribo está preparando, ideias de teatro e músicas e mais.

Quase não falo mais com meus antigos amigos. Antes até mandavam algumas mensagens para mim, mas hoje mesmo um deles sumiu do meu Facebook, só pode ter desfeito a amizade. Minha lista de amigos até está mais clara sem todo aquele pessoal de preto no topo. Quem está no topo agora é o pessoal da FJ.

— Você vai a pé hoje, Helô?

Após a palestra, vou andando para casa. Estou na calçada quando Arnaldo me alcança numa carreira.

— Claro, eu moro perto, não lembra?

Nossa, fui mal-educada agora!

— Sim, claro. É que hoje eu vou andando também. — Arnaldo se desvia de uma árvore e logo está do meu lado; ambos caminhamos na mesma direção. — Estou morando numa casa aqui perto, não preciso de ônibus.

— Que legal. Faz tempo?

— É, bom, um pouco. Mas e aí, como você tá? Aprendendo bastante?

— Sim, cada dia um tópico melhor que o anterior!

— Então acha sexta melhor que quinta?

Que? Isso foi uma piada? Pelo jeito foi, Arnaldo ri de si mesmo.

— Não, claro que não, Arnaldo! — dou-lhe um soco de leve no ombro e finjo achar graça.

Não é a primeira vez que vamos andando juntos embora depois da Terapia. Mas esta é a primeira em que ficamos ambos à vontade. Tanto que paramos para comer um espetinho no caminho.

— Deu uma esfriada hoje, né?

— Verdade — respondo. — Ainda bem que sempre estou de blusa. O frio não me pega!

— É, mesmo no calor. Nem sei como consegue!

Ah, o sorriso dele. Enquanto admiro, ele continua:

— Por quê?

— Ah, não, por nada. Só não gosto de mostrar... os braços.

Fico sem jeito. Será que ele faz alguma ideia?

— Não precisa ter vergonha, Helô. Todos temos marcas do passado. Mas são só isso, marcas. Lembranças.

Sim, ele deve saber. Ah, sim, com certeza viu no meu Facebook. Esqueci de apagar minhas fotos velhas! Tenho que fazer isso logo. Marcas de cortes, mordidas e até uma tatuagem não são mais motivo de orgulho para mim. Ainda assim, Arnaldo pede para ver, e eu puxo a manga da blusa um pouquinho.

— Não importa o que você fez ou deixou de fazer. A vida é daqui pra frente. Você mudou muito desde que te conheci, sei que agora é uma nova Heloísa, uma que eu gostaria de ter como amiga pra sempre.

Meus velhos amigos nunca haviam dito algo assim. Quase derramei uma lágrima e pulei nos braços do Arnaldo. Graças a Deus me contive. Também por ver entrando na lanchonete mais dois rapazes da FJ.

Vamos embora conversando, eu mais feliz do que nunca.

Quantas voltasOnde histórias criam vida. Descubra agora