Um sobrevivente

4.2K 250 31
                                    

A chuva caia sem parar. A noite estava cada vez mais gelada quando os olhos castanhos escuros de Thierry se abriram. Por um momento, ele pensou que estivesse morto. Mas o paraíso não deveria ser tão escuro daquele jeito, será que ele morrera e tinha ido para o inferno? Juntou forças para apoiar suas mãos no chão, seu estômago embrulhou e o fez vomitar a água salgada que havia engolido. Não... Ele não havia morrido. Estava vivo, por um milagre, mas estava bem vivo. Apoiou uma de suas mãos em seu joelho direito e ficou em pé com uma certa dificuldade, estava fraco e sentia seu peito dolorido. Lembrou-se de Paul e como ele havia tentado impedi-lo de ir nessa aventura louca e suicida, mais uma vez seu amigo havia tido razão e ele não o ouviu. Porém dessa vez, a consequência de ignora-lo foi bem mais dura do que levar tapas de garotas de bordéis ou de mulheres casadas após satisfaze-las no lugar de seus maridos.

A consequência para Thierry foi quase morrer.

Olhou ao redor, não via quase nada, as nuvens da noite estavam impedindo a luz da lua de passar. Ele via apenas vultos de grandes árvores, e sentia a areia em seu rosto sendo limpada pela água da chuva que caia sobre ele. Havia sobrevivido, mas como? Será que mais alguém também havia tido a mesma sorte que ele? Sua visão estava turva, sua cabeça doía e ele sentia seu corpo falhar em se manter de pé. Foi quando ele ouviu, no meio do som da chuva, gritos.

- ELE ESTA ALI PAI! VEM! RAPIDO! - uma voz masculina gritou.

O instinto defensivo falou mais alto, e Thierry retirou sua espada da bainha. Apontando para todos os lados, tremendo de frio mas sem ver nada direito.

- Meninos, quantas vezes eu vou ter que falar para não saírem correndo já chuva desse jeito? A mãe de vocês não gosta quando vocês pegam friagem. - outra voz, porém mais grossa e rasgada ressoou aos ouvidos de Thierry. O jovem mosqueteiro tentou limpar seus olhos, mas naquela escuridão nada podia ver.

- QUEM ESTA AI? - ele gritou segurando a sua espada com mais força. - APAREÇA!

Ouviu como se fosse duas pessoas correndo em sua direção, dois homens, mas ele não consegui ver quem eram, eles pararam alguns passos a frente de Thierry e um deles apontou para o mosqueteiro.

- Ali, papai! Lá está ele!

Seriam selvagens? Que péssimo jeito de morrer, Thierry seria atacado e devorado por canibais e nem mesmo iria conseguir vê-los por causa daquela maldita escuridão!

- NÃO SE APROXIMEM! - gritou Thierry apontando a sua espada para os dois homens a sua frente.

- Oh, céus... Mas o que essa criança está fazendo no meio da chuva? - ouviu a voz grossa mais uma vez e passos extremamente pesados em direção a eles, saindo do escuro das árvores.

- Ele pode ser outro náufrago. - respondeu um deles.

- Ei, calma, não vamos te machucar. - o outro dos homens tentou se aproximar mas Thierry não permitiu. Apontando a espada para o mesmo. - Oh, abaixa essa espada...

- Não se aproximem, eu já disse. Eu não quero machucar ninguém, só quero saber onde estou e como posso voltar para casa. - o moreno respondeu, diplomático como sempre foi, tentou usar da conversa para afasta-los.

- Você mal consegue ficar em pé, homem. - um deles sorriu. - Vem, deixa a gente te ajudar.

Thierry cambaleou para trás, mas usou toda sua força para se manter de pé. Não conhecia aquela gente, não podia simplesmente confiar neles. Pessoas que faziam jogos com suas vítimas eram cada vez mais comuns de se achar no mundo, mesmo sendo algo tão cruel e brutal. Thierry não confiaria, e não se entregaria se lutar.

- Não! Fiquem onde estão! Não deem mais nenhum passo!

- É um garoto espirituoso, mas entendo que esteja assustado. Afinal de contas, você não sabe onde está. Mas você pode esta ferido e pode precisar de ajuda, então seja gentil e nos deixe ajudá-lo. - a voz mais grossa do homem que havia parado entre as árvores respondeu a ele negou com a cabeça.

- Não... eu estou bem, senhor, eu... - a visão turva, e logo escureceu. Fazendo Thierry perder todas as forças que o mantinham em pé e o fazendo cair no chão mais uma vez, desacordado e fraco.

- Hum... Eu disse que ele mal conseguia ficar em pé.

- E se ele for do Oeste? - perguntou-lhe o irmão se aproximando do rapaz desacordado e mexendo nele com um dos pés.

- Ele não é do Oeste, ele se quer é dessa Ilha. Olhem para ele, para suas vestimentas, essa espada, esse rapaz não é daqui. Sim, Darlan, ele é um náufrago. - avisou o grande homem se aproximando dos filhos e retirando sua capa cinza. Envolvendo o jovem homem de bigode e barba em seu queixo e o levando em seus braços. - Vão na frente, avisem a Sora que esse garoto precisa de cuidados.

- Isso! Mais um pro Norte! - comemorou Darlan virando-se e correndo em direção às árvores, sumindo entre ela a com diversão.

- Pai, ele é como muitos aqui, como eu, como Darlan, e se ele... bem... - indagou timidamente o que ficou ao acompanhar seu pai com o menino em seu braços embalado pela capa cinza. O homem grande sorriu para a pergunta do filho e o olhou.

- Vamos dar tempo ao tempo, Otto, ele não me parece um mau rapaz, apenas esta confuso e assustado. - deu uma breve olhada no rapaz que ele carregava nos braços e sorriu gentilmente. - Iremos garantir para que ele se sinta bem aqui, conto com você e Darlan para ajudá-lo no que for necessário, pode fazer isso filho?

Otto pensou por um curto momento, mas não queria decepcionar seu pai. Então assentiu com a cabeça.

- Sim senhor, claro que pode contar comigo. E sobre Darlan, bom, ele parece bem animado.

- Ele sempre foi muito receptivo.

- A mamãe vai gostar muito. Ela merece um acalento assim depois de tudo que ela passou esses últimos dois meses... - comentou o filho baixinho ouvindo um suspiro pesado de seu pai ao se aproximarem das árvores.

- Sim, ela merece sim. - respondeu-lhe o pai. - Eles dois nem se conhecem mas já consigo imaginar o quanto Sora já o ama. Imagino o jeito de Darlan chegou com a notícia para ela.

- Eles dois são muito parecidos... - disse Otto.

- Verdade. - sorriu o homem ao imaginar a animação de sua esposa naquela noite. Sora sofrera tanto, e assim como Otto havia dito, ela merecia esse acalento. Pai e filho adentraram a floresta e sumiram na escuridão, apressando seus passos o mais rápido que puderam para tirar aquele menino da chuva e do frio.

A Ilha WalgonreiOnde histórias criam vida. Descubra agora