Capítulo 26

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    • Sofia •
Lucas: Tenho que ir lá ver a vó Nieta também.
Karina: Você esteve na Dona Júlia, ontem a noite?
Lucas: Tive.
Karina: Ela me ligou agora de manhã, estava preocupada.
Lucas: Era só cansaço. - Me olhou. - Ontem eu cheguei tarde, mas hoje nós vamos lá buscar o resto das tuas coisas.
Sofia: Pensei que você já tinha esquecido.
Paulo: Esse aí tem a cabeça tão boa quanto a minha.
Karina: Já tomou seus remédios hoje?
Sofia: Não, vou tomar café primeiro. - Olhei para o Lucas. - Antes que eu esqueça, a Mafalda mandou um beijo pra você!
Paulo: Quem é essa?
Sofia: A enfermeira da faculdade.
Lucas: Aquela que ajudou a Sofia. Já falei nela pra senhora.
Karina: Lembro que você falou, mas nunca vi ela.
Sofia: Vocês duas iam se dar bem.
Karina: Ontem a noite eu fui no mercado e tive a impressão de ter visto...
Paulo: De novo essa história? - Interrompeu a mulher.
Karina: Sim, de novo. - Olhou pra mim. - Você se lembra da Suzana?
Sofia: Pouquíssimas coisas.
Karina: Se você visse ela hoje, na sua frente, você reconheceria?
Sofia: Acho que não. Por que?
Karina: Tive a impressão que vi ela ontem.
Sofia: Tem certeza?
Karina: Não. Ela me viu também.
Lucas: E o que ela vez?
Karina: Fugiu de mim. Tá um pouco diferente, mas o jeito de andar é o mesmo.
Sofia: Será que ela voltou depois anos?
Paulo: Faz quantos anos que você não a vê?
Sofia: Um pouco mais de dez.
Lucas: Talvez ela sabe que o Gabriel tá preso e agora quer procurar você e a Bárbara.
Sofia: Se fosse isso ela não teria fugido da tua mãe.
Paulo: Faz sentido.
Sofia: O Gabriel tá preso, o Danilo não. A Suzana não seria tão louca assim de aparecer com o Danilo solto por aí.
Paulo: Ele também agredia ela?
Sofia: Eu não sei. O Gabriel eu sei que sim, ele fazia pra mim o mesmo que fazia pra ela.
Paulo: Eu tô tentando entender isso já faz dias, mas não consigo. Então vou ser obrigado a te perguntar.
Sofia: Pode perguntar.
Paulo: O Gabriel fazia isso tudo por você ser parecida com a Suzana, certo? - Assenti com a cabeça. - Então ele transferiu o amor que sentia por ela, pra você?
Sofia: Não sei se pode chamar isso de amor, mas sim. O Gabriel era apaixonado por mim.
Essa é a primeira vez que digo isso. As palavras são muito mais pesadas faladas do que pensadas. Aquele monstro era apaixonado por mim. Ou pela Suzana, não sei. A única coisa que eu sei é que ele é um louco.
Paulo: Desculpa ter feito a pergunta.
Sofia: Tá tudo bem, seu Paulo. É difícil entender e acreditar nisso, outra pessoa no seu lugar faria a mesma pergunta.
Trocamos o assunto e tomamos um café agradável. Depois disso cada um foi para um canto. Eu e o Lucas para a casa da dona Júlia e o seu Paulo e a Dona Karina foram trabalhar.
O dia passou tranquilo. Com a graça de Deus não pensei mais no episódio do dia anterior e agora já me sinto bem melhor. Eu sei que não preciso ter medo do Lucas, ele jamais será igual aqueles dois nojentos.
(...)
Lucas: Nós estamos indo ali na Bárbara e já voltamos. - Falamos aos pais do Lucas, que estavam sentados no sofá assistindo tevê.
Paulo: Acho melhor eu ir junto.
Lucas: Não precisa pai.
Karina: Qualquer coisa vocês dão um grito.
Sofia: Pode deixar. - Saímos de casa e fechamos a porta. Assim que colocamos os pés na calçada o Lucas enlaçou nossos dedos e sorriu da forma mais doce possível.
Lucas: Eu tô com você! - Beijou o nó dos meus dedos.
Sofia: Eu sei disso. Obrigada! - Atravessamos a rua, respirei fundo algumas vezes e batemos na porta.
Bárbara: Quem é? - Berrou do lado de dentro.
Sofia: Sou eu. - Assim que ela abriu a porta e me viu, seus olhos arregalaram.
Bárbara: Sofia?
Sofia: Vim pegar o resto das minhas coisas. - Não dei brecha pra ela puxar assunto, o que eu mais quero nesse momento é distância dela e de tudo o que faz lembrar do que eu vivi. - Será que eu posso entrar?
Bárbara: Claro. - Sorriu de lado. - A casa também é sua.
Sofia: Não mais. - Entrei na casa e puxei o Lucas pelas mãos. A Bárbara sorriu pra mim algumas vezes, mas fingi que não vi. Assim que entrei no meu quarto, senti um pouco de saudade. Não do que eu vivi aqui, mas sim do meu cantinho. O único lugar que eu me sentia em casa era aqui.
Lucas: Gostei do teu quarto. - Soltou minha mão e se jogou na minha cama. Tranquei a porta e olhei pra cada cantinho dali. -Tem teu cheiro aqui ainda. - Se referia ao meu travesseiro, no qual seu rosto estava enterrado.
Sofia: Faz um pouco mais de uma semana que eu não deito nele, já deveria ter saído.
Lucas: Vou levar pra casa. Posso?
Sofia: Pode. - Sorri pra ele. Andei até meu guarda roupa e verifiquei se tudo estava ali, e pra minha surpresa estava.
Lucas: Deixa que eu coloco as coisas na sacola. - Trocamos de lugar, eu fui pra cama e ele pra frente do roupeiro. Em vinte minutos minhas coisas estavam ensacadas. - Que baú é esse? - Apontou para o canto do quarto.
Sofia: É de brinquedos. A última vez que mexi aí, acho que eu tinha uns 10 anos.
Lucas: Posso ver o que tem dentro?
Sofia: Pode. Curioso. Só toma cuidado porque aí deve ter muito bicho. - Ele se sentou no chão e começou a tirar os brinquedos. Lá dentro tinha algumas roupas de bebê, provavelmente de quando eu era pequena.
Lucas: Tem uma caixa aqui no fundo.
Sofia: Caixa? - Sai da cama e fui até ele. - Tira pra gente ver. - Assim ele fez. Não era exatamente uma caixa, e sim um bauzinho, cheio de poeira. O Lucas me entregou o baú, voltei a me sentar na cama sendo seguida por ele.
Lucas: Abre isso aí logo! - Assim que abri, encontrei algumas fotos e papéis já amarelados. - Uma foto nossa! - Olhei para o mesmo que ele e sorri.
Sofia: A mesma que você tem no quarto.
Lucas: Tem mais, olha. - Tem em média de 10 fotos. Algumas eu bem bebezinha, outras com o Lucas e o Leandro e algumas que tem um homem me segurando nos braços. - Será que essa aqui é a Susana? - Indicou para a mulher que estava ao lado do homem misterioso.
Sofia: Acho que sim.
Lucas: Vocês são parecidas. - Me olhou brevemente. Virei algumas fotos e atrás delas tinha algumas frases e datas. - "Você será pra sempre o nosso Pimpolhinho." - Leu em voz alta. - Provavelmente esse aqui é o teu pai. - Voltamos para a foto onde o homem me segurava.
Sofia: Deve ser. Eles pareciam felizes. - Passei meu dedo indicador sobre a fotografia.
Lucas: Você tem algumas semelhanças com esse homem.
Sofia: Pena que não marca o nome.
Lucas: Mas tendo a data é tudo mais fácil. - Deixei as fotos de lado e peguei um dos papéis. Abri a folha já amarelada pelo tempo. - Faz 10 anos que essa carta foi escrita.
Sofia: Como sabe?
Lucas: Tem a data aqui.
Sofia: Não tenho coragem pra ler. - Olhei o Lucas.
Lucas: Uma hora você vai ter que ter. Quanto antes você ler, melhor. - Segurou minha mão. - Tô aqui contigo! - Respirei fundo e voltei a olhar para carta.
Sofia: Posso ler em voz alta?
Lucas: Claro. - Acariciou minha mão.
Sofia: " Queria começar essa carta com palavras doces, mas não consigo. Tudo o que eu tinha de doce o Gabriel tirou e me restou só amargura e dor. Torço muito pra que você não tenha a mesma vida que eu, minha filha.
Hoje foi um dia difícil, até mais que o normal. Por pouco o Gabriel e o Danilo não conseguem tirar a minha vida. Nem sei se isso que eu vivo é considerado vida. Eu tô tão cansada disso tudo! Tô cansada de me ver cheias de hematomas, tô cansada de te ver sofrer maus tratos e ver o sofrimento em seus olhinhos. Eu juro filha, que se pudesse eu voltaria no tempo e não teria me envolvido com esse monstro. Ele está tirando a minha vida e a sua também. Para Bárbara é tudo mais fácil, ela é filha do Gabriel.
Não sei quando você vai ler essa carta ou se um dia irá encontrá-la, mas quero que saiba que independente do lugar onde eu esteja, eu te amo. Te amo muito!
Talvez minha única salvação seja você!
Um pouco depois do inferno acabar, consegui juntar minhas forças e te escrever. Vou contar tudo o que eu sofro, talvez algum dia isso sirva pra ajudar você ou então pra me salvar.
Desde que eu me casei com o Gabriel ele me espanca, me xinga e me obriga a manter relações com ele. Provavelmente você deve saber o que isso significa. Me desculpa, mas não consigo escrever essa palavra! Essas agressões muitas vezes partem do Danilo. Não vou dizer que o Gabriel é um santo porque não é, mas o Danilo é o principal culpado disso tudo. Ele é persuasivo e sabe envenenar a cabeça do irmão como ninguém. Quando os dois estão juntos só Deus sabe o medo que eu tenho.
Passei a última semana trancado no quarto do castigo.     

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