Complexidade

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Assim que seus lábios deixaram os meus, o abracei, escondendo o rosto em seu peito. Meu cérebro deu o comando para que eu dissesse alguma coisa, mas era precipitado demais, então cerrei os lábios, contendo o impulso. Era muita informação para um dia só.

Senti quando seus braços me envolveram com mais firmeza e o olhei para saber o que pensava. Estaria tão perdido como eu em sentimentos tão desconhecidos? Sua expressão me confundiu, tão séria e quase dolorosa, como se algo o perturbasse.

— O que foi? — perguntei baixo. Nosso momento de absoluta sinceridade caminhava em uma linha tênue, portanto, temia quebrá-lo.

Ele negou com a cabeça, abrindo um sorrisinho mínimo. Não fiz questão de pressioná-lo, deveria ser tão assustador para ele quanto pra mim. Era bom, finalmente, não estar lidando com tudo aquilo sozinha.

— Caso você queira saber... A perícia constatou que o início do incêndio foi causado por má fiação. Não entendi direito, mas quando terminarem de reformar meu quarto, prefiro não ter nenhum eletrodoméstico nele — contei ao me lembrar, nos distraindo da estranheza.

Ele fez uma careta com o assunto, olhando para o céu.

— Claro. Por que não saímos da chuva? Não quero que você adoeça.

Revirei os olhos para sua preocupação banal, tendo a impressão de que ele ficara um pouco traumatizado com meu acidente para que nem sequer quisesse que fosse mencionado. Eu não deveria ter gostado disso, mas era bom saber que se importava.

Antes que tivesse a oportunidade de responder, escutei a voz escandalosa de Nicole:

— Qual é o seu problema menina?! Anda se drogando?!

Olhei para a rua a tempo de ver o bonde todo seguindo em nossa direção, os olhos surpresos em nosso abraço. Jean tentava segurar o braço da irmã, mas ela puxava de volta, a fúria fazia com que parecesse psicótica.

Respirei fundo, me preparando para meu momento feliz ceder lugar à indignação por existir uma pessoa tão sem noção.

Me afastei de Justin.

— O que é Nicole, não gosta de sorvete de chocolate?

Ela quase me matou com o olhar, e alarmado, Willian se colocou na minha frente. Eu tinha a impressão de que eu e ele nos tornaríamos bons amigos ou eu lhe daria ótimas matérias para vender nas revistas, já que, num só dia, presenciara de tudo em minha vida íntima. Era constrangedor, mas seu modo discreto de agir me fazia esquecer de que ele estava ali.

— E você, não pode se defender sozinha? Covarde! — ela bufou, se detendo na frente de Willian, colocando as mãos na cintura.

Meu orgulho claramente fora ferido, mas eu já havia dado escândalo público o suficiente por uns dias, e daqui a pouco as pessoas começariam a se acumular na rua para ver Faith Evans entrar num ringue.

— Se tem uma coisa que aprendi na vida foi ter classe, então não vou ficar dando barraco na rua, querida, te deixo fazer um solo — fiz um tchauzinho com a mão e virei as costas, puxando Justin pela mão sem nem ao menos pensar.

Quando me dei conta da liberdade que tomei, olhei receosa para ele, mas um sorriso contido em seu rosto, aprovando meu gesto, me desinibiu.

— Então é assim? Vai simplesmente fugir? Você é uma covarde, Faith Evans, que se esconde atrás do dinheiro, da influência da sua família, dessa sua falsa percepção de ser querida por todos! Na verdade, ninguém dá a mínima pra você, ninguém te suporta, só querem se aproveitar da sua posição! — Nicole jogou todo o veneno que tinha, aos berros no meio da rua.

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