Foi um sacrifício arrastá-lo escada espiral acima daquele jeito, mas Justin insistiu para que o levasse ao seu quarto, acrescentando que os instrumentos de costura estavam ao lado da cama e sujar o sofá de sangue não era uma opção.
— Última porta — instruiu quando dei de cara com um corredor de quatro cômodos, todos fechados.
Ele pegou uma chave no bolso da frente e o destrancou, me intrigando por ter a necessidade de trancar o quarto com a casa já fechada. O chão de madeira escura se estendia por todo aquele espaço abrigando a cama colossal no fundo com colcha preta, um tapete branco felpudo trazia o contraste, combinando com o criado-mudo ao lado daquela. A cortina escura sobre a janela impedia que entrasse qualquer feixe de luz, adequando o aposento sombrio ao seu dono. Do lado oposto havia apenas uma porta de madeira fechada. Poucos móveis para um quarto tão extenso.
Levei o enfermo até a cama e o ajudei a se deitar, afofando o travesseiro atrás de sua cabeça. Não senti necessidade de pedir permissão quando me dirigi à cortina, abrindo num movimento rápido e deixando a luz da tarde ultrapassar a janela ampla de vidro. Voltei para perto de Justin a tempo de vê-lo se estender até o criado-mudo e abrir a primeira gaveta, gemendo de dor.
— Deixa que eu pego, inútil — repreendi, me apressando.
Ele deu uma risadinha.
— Espero que não trate seus futuros pacientes assim — debochou ele com a voz alarmantemente enfraquecida.
Não lhe dei ouvidos, tirando da gaveta um plástico portando uma luva látex e um recipiente transparente contendo agulha e linha, o que tornou a realidade mais concreta. A transpiração escorrendo na testa de Justin e grudando seu cabelo à pele era um forte indício de que não havia sido boa ideia respeitar sua decisão de não ir a um hospital. Embora eu tenha feito o trajeto em metade do tempo, deixar seu tratamento na minha mão triplicava os riscos. Minha barriga girou desconfortavelmente.
— Já está tudo higienizado — me informou com calma.
Por que ele estava tranquilo? Acaso não sabia que dependia de mim?!
Na gaveta ainda havia mais alguns objetos que passei rapidamente os olhos, em busca do que me interessava. Tirei uma maleta pequena de remédios e álcool em gel, colocando tudo no criado-mudo. Abri a maleta só encontrando Xylocaina como anestésico, em seguida abri as luvas de látex, o pote pequeno da linha e água oxigenada. Higienizei as mãos e esperei alguns segundos para que secasse.
— Faith, respire. Encare isso como uma amostra para que tenha certeza de que quer fazer isso futuramente.
Balancei a cabeça em negação.
— Não há como ter isso como base. Eu não estou preparada e sua vida não é um teste, Justin — retruquei, então olhei em seus olhos implorando — Vamos ao hospital, por favor. Eu mesma digo que te baleei se não quiser encarar a polícia.
Ele arqueou a sobrancelha minimamente, me achando exagerada.
— Está tudo bem, se não quiser eu mesmo o farei — me tranquilizou.
Grunhi, frustrada por sua teimosia. Me sentei ao seu lado no espaço que sobrava na cama, segurei suas costas com a mão esquerda e desenrolei a faixa que fiz para controlar o fluxo de sangue, respirando regularmente para tomar coragem. A mancha vermelha na gaze branca não estava tão marcante, quase me servindo de alívio.
Meus batimentos cardíacos aceleram mais um pouco assim que joguei a gaze no chão e escorreguei o látex por minhas mãos com aquele ruído áspero. Como um consolo, a ferida não estava tão grande. Expirei devagar pela boca e joguei um pouco de água oxigenada na gaze que havia dentro da maleta.
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One Life
FanfictionAparentemente, não havia nada de extraordinário na história dos dois. Eram duas pessoas normais, favorecidas pelo capitalismo, e embora não parecesse, ambos tinham muito em comum. O fato de terem o que quisessem era um deles, mas também aquele senti...