Histórias

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Minha consciência se retomava assim que eu alongava meus braços com a preguiça que ainda me mantinha deitada. Eu realmente deveria parar de dormir tanto, me deixava extremamente grogue. O pensamento se reforçou quando abri os olhos completamente desnorteada. Tentei assimilar as paredes escuras com a colcha preta da cama; espalmando o espaço vazio ao meu lado eu poderia jurar que alguém dormira ali. Foi nesse momento que a ficha caiu.

— Justin? — chamei alarmada com a voz rouca arranhando minha garganta seca.

Levantei rápido demais e o chão balançou um pouco por isso ao mesmo tempo em que tudo se tornava claro. Até onde eu lembrava, estava aqui para cuidar de um homem baleado, e ao invés disse estava dormindo enquanto sabe-se lá onde ele estava.

Não me importei em calçar minhas botinhas em cima do tapete, andando de meias até a porta que eu supunha ser o banheiro.

— Justin? — repeti, batendo o punho na madeira.

Não houve resposta, então dei meia volta, saindo do quarto. Limpei meus olhos com as pontas dos dedos enquanto descia as escadas, passando a ouvir um ruído no andar de baixo. Os estalos indicavam alguma fritura, o cheiro de bacon veio em seguida. Eu me lembrava da cozinha ser logo ao lado da escada, então me dirigi para lá organizando meu cabelo.

Era o único cômodo claro da casa, pelo que eu já havia visto, e atrás da pia extensa que embutia o fogão estava uma janela de vidro aberta, dando vista a um campo verde ralo. Era para lá que a escultura grega olhava, mexendo distraidamente uma colher na frigideira.

Não pude evitar a perplexidade que me deteve ali na entrada ao contemplar as curvas de suas costas musculosas, uma oportunidade que ainda não me fora dada. Observei a passagem bíblica e o índio localizados quase no ombro, supus já serem tatuagens antigas por não estarem bem colocadas, se adaptando ao seu corpo conforme crescia. Havia duas pintas a uns três dedos de distância do índio e uma centralizada bem no meio da pele que se afundava para acompanhar a espinha. Desci os olhos até as duas entradas que eram interrompidas pelo cós de sua calça social, e acabei perdendo o fôlego, minhas mãos formigavam para sentir aquela textura aparentemente tão macia.

Justin inclinou a cabeça para a esquerda o suficiente para que eu tivesse conhecimento de que ele sabia da minha presença. Um sorriso repuxou o canto de sua boca.

— Bom dia, Faith — sua voz ainda estar grossa era um exagero, um atentado a minha integridade psíquica. Eu não me lembrava de estar tão calor assim.

Recompus-me, aliviada por ele não ter visto diretamente meu rosto para me classificar como desequilibrada. Pigarreei alto, entrando ruidosamente na cozinha e estragando toda a cena Hollywood.

— O que raios você pensa que está fazendo? — questionei com censura.

Ele me olhou por cima do ombro, a testa franzida e a sobrancelha arqueada como se questionasse minha sanidade — que era bem possível de estar abalada naquele momento.

— O café da manhã?

Abri um sorrisinho falso e em seguida fechei a cara, colocando as mãos na cintura.

— Você foi baleado, consegue se lembrar disso? Deveria estar repousando — protestei rabugenta.

Ele desligou o fogo, virando-se para mim com a frigideira na mão.

— Acredite cozinhar é um repouso para mim — deu de ombros, fazendo uma careta simbólica de dor pelo movimento.

O repreendi com os olhos, e ele caminhou até a mesa redonda de mármore no fundo da cozinha como se não tivesse visto, onde já estavam postos copos, talheres, pratos, uma caixa de leite e jarra de suco. Eu não percebi nada disso no início, o ambiente todo se clareava conforme ele passava. Isso com certeza não era saudável para mim.

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