Manipulação

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— Você vai engasgar, sua anta! — Hanna me repreendeu, olhando-me comer.

— Segundo minha mãe, você é a anta — contra-argumentei ainda de boca cheia — E tente ficar sem comer desde o início da tarde do dia anterior para ver se não comeria um boi.

Ela deu risada, depois fez uma varredura com os olhos no refeitório da faculdade, certificando-se de que era seguro. Mesmo assim, disse baixo:

— A anta é você. Não acredito que ousou entrar numa guerra com seus pais outra vez, e inventar que vai mudar de faculdade para atingi-los também não é boa ideia. Você simplesmente assinou seu atestado de óbito.

Apertei os lábios, mantendo os olhos no suco enquanto pensava em uma maneira de explicar.

— Ótimo, já está com ânsia?

Dei uma risadinha, balançando a cabeça e colocando mais um donut de chocolate na boca.

Por mais lenta que fosse, dessa vez Hanna fez raciocínio rápido.

— Faith Evans, você realmente está pensando em sair do curso? — sua pergunta era desdobrada em ameaça. Para o meu próprio bem era melhor que eu desse a resposta correta, mas se mentisse, entraria em outra fria. Era bem como o ditado, "se ficar o bicho pega, se correr o bicho come".

Olhei para ela com receio, terminando de mastigar, apreciando cada segundo sabendo que provavelmente seria o último da minha vida. Sua expressão estava séria e perigosa.

Engoli e tomei um gole do suco, pronta para o meu funeral.

— Sim? — a afirmação perdeu a convicção no caminho da minha boca.

Han uniu as sobrancelhas, intrigada.

— Como você pode ao menos pensar nisso, Evans?!

— Desculpa! Mas não me identifiquei...

— Você faz mais da metade do curso para descobrir que não se identifica? E como tem a audácia de me deixar aqui sozinha?! — ela cruzou os braços, me acusando pelos olhos.

Eu já era uma Maria-Mole, não era justo que apelasse desse jeito.

— Han, se eu ficar nesse curso vou desperdiçar um tempo precioso. Vou ficar aqui até o final do ano, então temos bastante tempo até lá. Também não gosto da ideia de ficar sem você, eu sou péssima para me adaptar, mas é minha vida. E não é como se não nos víssemos fora daqui — expus com mansidão na intenção de meu estado de espírito refletir nela.

Seus traços se concentravam firmemente em expressar indignação, mas aos poucos, enquanto me olhava, foram relaxando com frustração.

— Não é justo que coloque dessa forma! Você me faz parecer egoísta.

Levantei as mãos na defensiva.

— Não te chamei de egoísta, e não acho que seja.

Não me mexi enquanto ela pensava em como reagir àquilo, torcendo para que não ficasse com raiva. Então após um suspiro, Hanna descruzou os braços.

— Você não vai encontrar ninguém melhor que eu nesse cursinho de quinta — embora sua voz demonstrasse irritação, eu sabia que o pior havia passado.

— Sei que não. Não acho provável a existência de alguém mais maluco que você — estendi a mão pela mesa, afagando a sua e oferecendo um sorriso de paz.

Ela tentou não sorrir. Não conseguiu.

— Te odeio.

Ri, aliviada.

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