Promessas e Blefes

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O salão estava recheado de toda a perversidade costumeira, os olhos dos homens corriam em busca de decotes para descansar, em especial os já acompanhados, intercalando o movimento entre um passo de dança ou uma jogada nas mesas de sinuca e poker espalhadas no andar de cima, onde os sagazes arrancavam dinheiro dos ingênuos. A fumaça vinda dos charutos acesos quase se densificava no teto, e pela expressão fixa no rosto de Faith, tinha o conhecimento de que preferia se limitar a pista de dança que levava os casais a se embalarem na melodia clássica, preferindo evitar as chaminés humanas. Se eu bem conhecia George, era exatamente naquele meio que estava, através da escada colossal coberta por um tapete vermelho felpudo.

— Sei que consegue sobreviver a isso — sussurrei em seu ouvido, motivando para que esquecesse a repulsa — Você anda passando por coisas bem piores.

Ela concordou sem se desfazer da careta.

— Tudo bem, que tal nos enturmarmos para procurar George de maneira sutil? Não queremos arrumar problemas com seguranças.

Seus olhos julgadores voaram para o meu rosto.

— Um assassino tem seguranças?

Parei de caminhar quando chegamos em um vácuo entre os dançarinos, tomando sua mão direita.

— Ele não é apenas um assassino; administra uma empresa influente.

— De assassinos — acrescentou, deslegitimando meu argumento.

Me conduzi à sua frente, trazendo minha mão para o seu quadril.

— Deve compreender, portanto, como fica mais fácil de fazer inimigos.

— Com razão — rebateu, enfurecida.

Eu entendia o quanto se revoltava com o descaso à vida. Entretanto, aquele homem que desprezava era o meio mais eficaz de salvar a sua. Encarei o fundo de seus olhos, suplicante:

— Sei que desaprova o sistema. Mas pode, por favor, tentar não demonstrar isso quando tivermos a oportunidade de falar com ele? Precisamos bajulá-lo, não deixa-lo irritado.

Após suspirar, um sorriso angelical aparentemente sem esforço se espalhou por seu rosto. Mordi o lábio para não rir.

— É uma vida de prática, sei muito bem como encobrir minhas emoções — explicou ainda no papel. Assim poderia até me enganar sobre detestar falar comigo.

— Claro que sabe. Conseguiria então suportar uma dança comigo? Digo, simular que suporta — sugeri, me curvando em sua direção.

Sua postura assumiu, no mesmo instante, uma expressa negação, mas os olhos não estavam certos sobre a decisão, avaliando a intenção nos meus, que no momento, era pura. Eu não planejava esfaqueá-la pelas costas, por exemplo. Ela aparentava saber disso. Não podia dizer o mesmo do sentido figurado.

— Por que estou me sentindo nostálgico? É a segunda vez que te tiro para dançar e sua reação não mudou. Sabia que desestimula minha confiança?

A lembrança do primeiro dia em que nos conhecemos enevoou sua fisionomia, e de repente, estava agressiva.

— Suas manipulações continuam intactas também — me provocou, embora colocasse uma mão em meu ombro, se prontificando.

A puxei para perto, encarando seu rosto a centímetros do meu.

— Igualmente o faz seu encanto.

Ela expirou, desviando o rosto para qualquer outro lugar enquanto arriscávamos os primeiros passos sincronizados.

— Para de ser falso. Odeio que faça isso — resmungou.

— Isso o que?

Eu estava certo de que acabara de receber uma ofensa mental.

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