Meia hora de dança com DIgão e eu estava morta, o que era uma vergonha, já que ele, se me recordo bem, tinha quase setenta anos. Agradeci a dança e caminhei em direção a mureta de pedras, sentando de frente para o rio, aproveitando a brisa quase gelada que corria ali para relaxar um pouco e me recuperar da combinação cachaça, caldo e dança.
- Posso? – Victor se aproximou e apontou o espaço ao meu lado na mureta.
- Claro. – respondi de pronto sem olhar diretamente pra ele.
Ele se sentou e, tal como eu, cruzou as pernas, apoiou os cotovelos no joelho e a cabeça nas mãos. Virou o rosto na minha direção e ficou me observando. Eu o via pelo canto dos olhos, mas mantinha meu olhar no reflexo da lua sobre as águas e meu foco em recuperar o fôlego após a dança.
- Tá bem? – Depois de algum tempo ele perguntou em um tom quase preocupado. Eu virei o rosto em sua direção e sorri antes de responder.
- To sim. To me recuperando um pouco.
- Da cachaça? - Ele perguntou sorrindo de forma provocativa.
- Da combinação cachaça, caldo e dança. - Respondi sincera.
- Não é fácil acompanhar Digão. - Victor disse e riu baixinho. - O velhaco tem mais disposição que todos nós juntos.
A conversa versou sobre o Digão por alguns minutos, falamos da disposição dele, Victor contou dos problemas de saúde que ele tivera a alguns anos atrás, que eu até acompanhei pela internet, mas era diferente quando alguém tão próximo contava.
- A gente pensou que ele ia embora. - O olhar de Victor escureceu com a lembrança. - Mas ele é durão e vai acabar enterrando todos nós primeiro.
- Você tá falando do Digão num tom tão fraternal que parece estar falando de um pai. - Eu estava encantada com o carinho que ele demonstrava, sem receios, pelo o amigo.
- Digão é meio paizão de todos, incentiva cada talento que encontra, ajuda como pode e muitas vezes como não pode também. Se hoje tenho a carreira que sempre sonhei, o Digão tem a sua boa parcela de culpa.
- É muito bonita a amizade de vocês. - A resposta de Victor foi um fechar de olhos, um movimento leve de cabeça e um sorriso quase emocionado.
Ele voltou os olhos pra frente e eu acompanhei o movimento vendo-lhe perder o olhar nas águas prateadas pela lua. Eu ainda o observei por um tempo, até que também deixei meu olhar se perder no rio. Permanecemos assim por alguns minutos, focados no balé das águas prateadas pelo luar.
Victor quebrou o silêncio de repente.
- E o caldo? Gostou? – Eu não consegui conter uma risada suave.
- Mais ou menos. – Respondi sincera.
- Tomou puro ou com amendoim? – Ele quis saber curioso virando o rosto para me olhar.
- Puro. – Respondi virando o rosto em sua direção para observar sua expressão, já que o tom curioso dele trazia algo mais que eu não consegui distinguir.
- Pena. – A voz saiu como um lamurio me fazendo sorrir.
- Porque pena? – Perguntei curiosa, mas num tom delicado.
- Hummm! - Ele virou o olhar pra frente, coçou a barba por fazer, voltou a olhar pra mim e com uma expressão desiludida disse em tom solene. - É que dizem que com amendoim é afrodisíaco. – Nem bem acabou de falar e um sorriso enorme se formou nos lábios finos.
- Uma pena mesmo. Preciso te dar razão! - Usei meu tom mais charmoso e terminei a frase prendendo meu lábio inferior entre os dentes.
Ele me observou por alguns segundos, sua expressão vagava entre séria e sedutora.
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Amanhecer em Canção
RomanceAlana é uma mulher independente e completamente dona do próprio nariz. Aos 38 anos, separada e com dois filhos já encaminhados, nada lhe escapa ao controle. Mantém sua vida sob total vigilância para que nada aconteça de forma diferente do que ela pl...