Capítulo 18

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Na distância que estávamos não era possível ainda definir qual era a música, mas conforme nos aproximávamos mais e mais a letra da canção na voz de Victor chegou aos meus ouvidos.

... "A moça na roda de viola cantava baixinho, presa em seu mundinho, não olhava as cordas nem esse cantador. O sorriso que lhe tomava o rosto me aqueceu o peito, mas logo suas lágrimas vieram e me encheram de dor. Me disse o amigo chegado, deixa ela de lado, ela tem passado, traz mágoa no peito difícil de curar. Magoa no peito eu também trago, argumentei danado, uma moça linda dessa não vai me maltratar. Ledo engano companheiro, o tiro foi certeiro, e agora erámos dois ali a chorar..."

Era a música que ele citara no balanço na tarde do dia anterior e que agora ele cantava com uma voz triste. Ponderei com meus pensamentos que era uma canção triste e que não tinha nada comigo aquela tristeza na voz dele, mas meu peito se apertou e eu não consegui me convencer, deixando escapar um sorriso obviamente triste.

Gi diminui o passo e segurou minha mão, fazendo com que Pedro se afastasse um pouco de nós e não a ouvisse falando.

- O que foi? - Gi me conhecia bem e era capaz de ler meus sentimentos com uma facilidade incrível. - Porque esse sorriso triste? Não foi uma noite maravilhosa?

- Foi sim, uma noite inesquecivelmente maravilhosa. - Eu respondi ainda com sorriso triste. - Mas a manhã... - Não completei a fala, não era necessário.

- O que ele fez? - A expressão de Gi agora era séria, quase brava.

- Ele não fez nada, Gi, fui eu... - Já ia falar da minha desconfiança quando lembrei que ela se sentiria culpada por ter levantado o assunto. - Eu fiz uma bobagem, misturei as coisas... - Gi ainda me olhava séria. - Mas agora tá tudo bem. - Completei a fala e abri um sorriso.

- Hummm! - Demos mais alguns passos em silêncio e Gi me olhou novamente. – Hummm! – Repetiu num resmungo.

- Sem hum! De verdade! – Puxei ela pela mão, aceleirei o passo e nos juntei novamente a Pedro. Gi era esperta e já tinha sacado que eu estava escondendo algo, então nos aproximar de Pedro foi a forma de fazê-la não insistir naquilo, ao menos por agora, porque certamente a noite ela exigiria saber o que aconteceu, e eu contaria, não conseguia esconder nada dela.

A roda de viola durou um bom par de horas, Digão, que aquela altura já tinha plena noção da minha paixão por música caipira, me chamou pra perto pra cantar com eles, mas, diferente da tarde anterior, eu me sentei ao lado de Zé Otávio e formamos ali um quarteto.

Victor me olhava às vezes, ora sorria ora piscava pra mim, mas nem por um momento cantou diretamente pra mim, como no dia anterior, talvez ele não precisasse mais me seduzir ou talvez simplesmente não quisesse fazê-lo.

Quando a roda se desfez, Victor se aproximou carinhoso, brincou comigo, implicou, me abraçou e até me deu alguns beijinhos rápidos, quase castos. Almoçamos lado a lado e Victor arrumava um jeito de nos tocarmos, apoiava a mão em minha perna, enroscava os pés no meu ou mesmo um simples encostar de ombros. Na hora da sesta, deitamos juntos em uma das esteiras estendidas a beira do rio. Victor me puxou pra perto me acomodando em seu ombro adormecendo quase que imediatamente. Já eu não consegui, travei uma batalha com meus olhos que insistiam em permanecer abertos. Fiquei ali ainda um pouco, observei seu rosto tranquilo, mas logo me levantei, o deixando ali, em um sono tranquilo.

Me dirigi pra sede com a intenção de pegar meu tablete e me distrair um pouco. Estava passando pelo corredor e vi Digão sentado no escritório, as pernas em cima da mesa com Ernst sentado a sua frente.

- Bebê, que bom que você tá aqui, Digão e eu estamos conversando sobre a possibilidade de participarmos da gravação do DVD do show – A viola, a composição e a voz, que vai ser no Rio daqui a um mês e meio.

Amanhecer em CançãoOnde histórias criam vida. Descubra agora