Capítulo 22

11 2 0
                                    

Depois que eu rompi a porta do teatro, saí andando em qualquer direção. Lágrimas corriam pelo meu rosto e se confundiam com a chuva fina que caia. Eu caminhava a passos largos e rápidos, a necessidade de me afastar ao máximo era muito forte.

- Tudo bem, senhora? - Um policial se aproximou me assustando e ao mesmo tempo me trazendo de volta a realidade. Eu olhei em volta e me apavorei um pouco ao notar que eu não tinha a menor ideia de onde estava.

- Sim.... quer dizer.... Sim, acho que sim. - Sequei o rosto com as costas da mão, não sabia o que era lágrimas ou o que era chuva. - Tá tudo bem sim. - Completei ainda confusa.

- A senhora poderia me mostrar seus documentos? – Toquei meu ombro em busca da minha bolsa. Ela não estava comigo, eu havia saído tão apressada que tinha deixado na mesa do teatro. Corri a mão pelo bolso traseiro da jeans e deixei escapar um suspiro de alívio ao notar que ao menos meu telefone estava.

- Eu... a minha bolsa... - Respirei fundo pensando em como explicar ao policial que eu havia deixado a bolsa no teatro.

- Senhora? - O policial me olhava intrigado.

- Desculpe. Eu estava no teatro, não me senti bem, acabei saindo de forma abrupta e deixando minha bolsa lá dentro. - Uma rajada de vento soprou e um arrepio de frio subiu pela minha coluna. - E meu casaco também. – Falei tocando os quadris, onde normalmente eu amarrava o casaco. Pela forma que o policial me olhava concluí que minha fala não fazia muito sentido pra ele. - Eu precisei sair... - "eu não tive coragem de ficar" completei em pensamento. - Obrigada, está tudo bem sim. – Eu já não sabia mais o que falar. Puxei o celular do bolso, mostrei ao policial e forcei um sorriso. - Viu, estou com o telefone, tá tudo bem.

- Se me permite a pergunta, em que teatro a senhora estava? - O policial continuava a me olhar intrigado.

- Eu estava no Citi Hall. - Por alguma razão minha resposta parecia não agradar muito o policial.

- Senhora, estamos pelo menos a cinco quilômetros de distância do Citi Hall. - A informação fez meu rosto ser tomado por uma expressão de surpresa genuína. - A senhora está mesmo sentindo-se bem?

- Agora estou. - Respondi recuperada do susto de estar tão distante do teatro, eu não notei o quanto e por quanto tempo havia andado.

- A Senhora não está numa área muito segura, a senhora está sem seus documentos e não me parece ser da cidade... - Eu estava em algum ponto da margem do Rio Pinheiros, isso era tudo que eu sabia. - Não prefere me acompanhar até um local mais seguro?

- Não, eu vou ficar bem, de verdade. – Mostrei o aparelho de novo e dessa vez o liguei. - Vou ligar para os meus amigos virem me buscar, eles devem estar preocupados comigo e.. - vários alertas de mensagem começaram a tocar, criando uma sinfonia confusa e estridente. - Como eu disse... - sorri amarelo para o Policial que agora me olhava sério. - Meus amigos estão preocupados.

Desbloqueei o telefone, mais de mais de 50 mensagens da Gi, Pedro e Ernst pipocaram na minha tela. Abri o aplicativo e enviei uma mensagem pra Gi.

"Estou bem, desculpe a forma com que sai. O show já acabou? Deixei minha bolsa e meu casaco na cadeira da mesa."

Nem mesmo acabei de enviar e meu telefone já tocava aquela musiquinha estranha. Olhei para o policial e encolhi os ombros meio sem graça.

- Coisa de amigos.... - Ele moveu muito de leve os lábios numa ameaça de sorriso. - Oi, Gi. Desculpa...

Eu não consegui dizer mais nada, Gi, que tinha uma natureza calma e que eu nunca havia visto levantar a voz, falava em um tom alto e estridente comigo no telefone, ora me fazendo perguntas ora me bronqueando pelo meu sumiço, sem me dar tempo de nada falar.

- Gi, pelo amor de Deus, me deixa falar! - Levantei a voz só pra que ela me desse alguma atenção.

- Tá. - O tom não era dos mais satisfeitos, mais ao menos ela me ouvira.

- Estou em algum ponto da Marginal Pinheiros, no mesmo lado do teatro, na direção os carros. Estou com um policial... - Gi me interrompeu parecendo mais nervosa do que quando atendi.

- O que? Polícia? Você sofreu um acidente? Foi assaltada? Pelo amor de Deus, Alana, fala alguma coisa. - Gi falava tão alto que o policial certamente estava ouvindo, eu levantei o olhar e sorri explicando sem graça.

- Ela tá um pouco nervosa, normalmente ela é bem calma. - Ele não disse nada e nem modificou a expressão, apenas apontou para o telefone como quem diz, melhor você responder. - Gi, tá tudo bem, nada de ruim aconteceu, o policial está aqui apenas porque eu estava meio distraída e ele ficou preocupado. - Mais um sorriso amarelo para o policial. - Você pode vir me buscar, por favor? Vou te enviar a localização por mensagem.

- Claro, estou indo agora mesmo, pode deixar. - Eu já ia agradecer quando ouvi uma voz ao fundo da ligação.

- "O que aconteceu?" A voz parecia muito a de Victor.

- "Ainda não sei, mas a Gi já ta falando com ela" Me parecia a voz de Pedro, mas estava muito distante pra eu ter certeza de quem era quem.

Uma confusão de vozes tomou o telefone, eu não conseguia entender o que falavam.

- "Eu to indo buscá-la." Gi disse a alguém.

- Gi... - Chamei a atenção dela que claramente estava agora focada na conversa que acontecia por lá.

- Ai. Desculpa, Lan! É que estavam todos preocupados e o .... - Gi não completou o pensamento. - Me manda a localização, Lan.

- "Pega o meu carro" - A primeira voz soou ao fundo.

- "Tá" - Gi respondeu.

- Chego já. Não saia daí. - Gi pediu autoritária.

- Não vou, prometo. - Respondi de forma delicada.

A ligação foi encerrada por Gi. Eu guardei o telefone e olhei para o policial que agora tinha uma expressão mais tranquila no rosto.

- Desculpe, eu não consigo lhe explicar direito o que aconteceu, na verdade nem eu mesma sei. - O policial ergueu a sobrancelha e um sorriso compreensivo surgiu em seu rosto, me causando um imenso alívio. - Muito obrigada, se o senhor não me interrompesse talvez eu ainda estivesse caminhando. - A chuva apertou e o policial apontou para uma marquise.

- A senhora já está bem encharcada, não precisa ficar mais. - O policial disse em tom gentil caminhado e me fazendo segui-lo.

- Mais uma vez desculpa e obrigada. O senhor pode me deixar aqui, minha amiga já está vindo. - Falei para o policial assim que nos abrigamos da chuva e estendi a mão para agradecê-lo formalmente.

- Senhora, eu acho melhor aguardar aqui até a sua amiga chegar. - O policial fez uma cara engraçada antes de continuar. - E a senhora ainda não me apresentou seus documentos.

- Tem razão. Claro. - Era melhor ficar ali na companhia dele do que sozinha, ao menos eu me sentia protegida. - Eu só espero que a Gi, a minha amiga, traga meus documentos. - Completei com um sorriso amarelo.

- Se ela não trouxer ao menos eu saberei que a senhora está bem amparada. - E mais uma vez aquela cara engraçada.

Eu sorri em agradecimento. Apesar de toda a gentileza com que me tratava, eu tinha certeza que o policial deveria estar achando que eu era louca. O que, no momento, não estava muito longe da realidade.

Uma SUV Preta e com os vidros escuros parou próxima e o Policial apontou para o carro.

Amanhecer em CançãoOnde histórias criam vida. Descubra agora