Capítulo 20

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"Acho que você está apaixonada!"

Há dois dias que aquela frase rondava minha cabeça. Olhei pra cabeceira da cama, onde havia deixado o envelope e as pétalas, refletindo mais uma vez sobre a afirmação de Gi.

Claro que na hora que ela disse, eu ri, fiz piada, fui irônica, mas depois não consegui parar de pensar naquilo.

Levantei num pulo e já ia correr pro quarto da Gi quando lembrei que ela não estava. Ela, Pedro e Ernst estavam em São Paulo desde a noite anterior.

- Merda!!! – Xinguei alto batendo a porta do meu quarto e voltando pra cama.

Peguei o celular na cabeceira e verifiquei a hora, seis horas da manhã, eu não acordava nessa hora nem durante a semana, quiçá em um sábado chuvoso e frio. Me enrosquei nas cobertas e decidi voltar a dormir até que a declaração de Gi sumisse da minha mente, nem que para isso eu precisasse dar uma paulada em minha própria cabeça. Demorei menos do que imaginei para adormecer e menos ainda para que Victor surgisse em meus sonhos.

O som do meu celular me despertou.

"Bom dia Alaninha como vaaaaiiii, a nossa amizade nunca saaaai... faremos o possível para sermos bons amigos, bom dia Alaninha como vaaaiiii"

Estiquei o braço e peguei o celular, sabia exatamente quem era com aquele toque bobo. Gi me perturbara até que eu permitisse que ela colocasse a música que a mãe a acordava quando pequena como toque exclusivo dela. E o pior, me fez gravar a mesma música no celular dela e usava como toque exclusivo pra mim.

- Oi. – Falei com a voz grave e rouca ainda de sono.

- Pelo amor de Deus, Alana! Eu já te mandei um milhão de mensagens, estava quase ligando pro Lucas e pedindo pra ele ir até aí. – A voz de Gi estava agoniada e eu sentei na cama, sacudindo a cabeça para afastar o sono.

- O que aconteceu? Tá tudo bem aí? Que horas são? – As perguntas saiam meio desconexas, mas Gi já tinha prática com meus momentos de sono e, como ela havia ameaçado ligar para o meu filho, devia ser algo realmente sério.

- São duas horas da tarde. – Putz, eu acabei dormindo além da conta. – Aqui tá tudo bem sim. – Ufa, a agonia dela tinha me assustado real. – E aconteceu que você precisa vir pra cá. Tipo agora!. – Gi completou.

- O que? – Eu achei que não tinha entendido a última parte.

- Você precisa vir pra cá agora. – Gi confirmou o que eu achava que tinha entendido.

- To confusa, Gi. Se está tudo bem como você diz, porque eu preciso ir pra ai agora? – Eu perguntei séria e preocupada. - O que está acontecendo?

- Assim ó... – Gi fez uma pausa e eu ouvi ela respirar fundo. – Tá tudo bem comigo, com o Pedro e com o Ernst... – Mais uma pausa e mais uma respiração forte. – Ah, minha amiga, não é uma questão pra explicar. Você confia em mim?

- Você sabe que sim! – Gi era uma das pessoas mais cofiáveis que eu conhecia.

- Então se joga no primeiro voo e vem pra cá! - Gi repetiu o pedido.

- Gi, me dá uma boa razão, boa mesmo, além da confiança em você, pra eu me jogar num voo pra São Paulo depois de ter me negado a ir vezes seguidas ao Ernst, que você sabe o quanto pode ser insistente e convincente. - Falei com um pouquinho de impaciência.

- Victor Aster, uma rosa cor de rosa e a frase "Não há tristeza em partir quando estar foi só felicidade.". Viu, te dei três boas razões e você só pediu uma, ou seja, te deixei sem opção. - Gi disse de forma vitoriosa.

- Eu sempre tenho opção, Gi. - Eu ri desanimada. - E a minha ainda é não ir. - Respirei fundo e controlei minha impaciência. - Além disso, as três razões citadas são exatamente as mesmas que me fizeram não estar ai.

- Humm... - Gi não era insistente assim normalmente e eu estava estranhando muito aquele comportamento nela. - Mas e a parte em que você confia em mim, não conta? - Tinha algo acontecendo, aquele não era o jeito da Gi, parecia mais o jeito do...

- Gi, não me diz que o Ernst te perturbou até te convencer a me convencer de ir ao encontro de vocês? - Ela tinha me contado dos beijinhos que rolaram na viagem, depois que eu e Pedro armamos pra eles dançarem juntos, então eu não duvidaria nada que Ernst usasse esse tipo de artimanha para convencê-la a ajudá-lo.

- Não, nunca, de forma alguma. - Gi respondeu rindo. - Ernst não tem a mínima ideia que estou agora com você ao telefone. Não tem nada a ver com ele, só tem a ver com você e seus sentimentos. Por favor, faz isso que eu to te pedindo, Lan. Eu nunca te peço nada. – O tom dramático no final quase me fez rir.

- Meus sentimentos me dizem que não é uma boa ideia eu me jogar num voo pra um lugar que eu, exatamente por conta desses sentimentos, não quero e nem me sinto pronta pra estar. E uma das suas razões, se pensasse diferente de mim, provavelmente eu já saberia, não acha?

- Eu tendo a acreditar que você está errada, Lan. - Gi disse de forma doce.

- Ah, Gi! Por que você quer eu aja como uma adolescente apaixonada correndo atrás do crush? - Eu disse num fio de voz, já estava bastante complicado lidar com meus sentimentos estando longe dele.

- Ah! Então você assume que está apaixonada? - Gi me pegou no pulo. Ou quase.

- Não foi isso que eu disse... - Eu ia começar a argumentar de novo, mas Gi não deixou.

- Lan, eu tenho certeza absoluta que o certo é você estar aqui. Confia em mim, por favor!

- Victor falou alguma coisa? - Se Gi tinha tanta certeza e estava insistindo tanto, talvez Victor tivesse falado algo com ela.

- Não. Imagina. Eu nem estive com ele ainda, só assistimos parte da passagem de som, aliás, já está na hora de voltar ao teatro. Lan, por favor! - Gi não era de implorar e aquela pressão estava me deixando louca.

- Eu vou pensar, prometo que vou pensar. Tá bom assim? - E não era mentira, aquela altura eu já estava curiosa demais pela insistência dela.

- Tá bom. Vou fazer o seguinte, não vou insistir mais, mas vou pedir pra produção deixar um convite pra você na portaria do teatro, na nossa mesa, quando você chegar você entra. - A forma de não insistir da Gi era maravilhosa, era quase como dizer, eu sei que você vem.

- Combinado. - Respondi com uma risada conformada.

- Até mais tarde amiga! - Gi disse confiante.

- Gi.... - Eu ia reclamar, mas ela já tinha desligado.

Larguei o telefone e peguei o envelope e o saquinho com as pétalas, abri o saquinho e tirei uma delas, esfregando em minha pele, para sentir o restinho de seu perfume. Encostei na cabeceira da cama, fechei os olhos e o rosto de Victor sorrindo se formou em minha mente, mais uma vez corri em pensamento por todos os momentos daquele fim de semana que ficamos juntos, desde do momento em que eu descobrira que ele esteve presente no espetáculo até o momento em que nos despedimos.

Abri os olhos sorrindo. Minha decisão já estava tomada. 

Amanhecer em CançãoOnde histórias criam vida. Descubra agora