Capítulo 17

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O percurso de volta pra Fazenda do Digão estava sendo bem mais silencioso que a vinda. Victor até tentou puxar conversa, mas aquela altura parecia já ter desistido de insistir. Não que eu não estivesse respondendo, claro que eu estava, mas não conseguia não ser monossilábica. Minha mente procurava desesperadamente uma forma de reverter à confusão que eu mesma tinha criado e isso estava drenando minhas forças.

Victor diminui a velocidade quando passamos pela divisão entre as fazendas dele e de Digão e deixou escapar um suspiro.

- Você me deu novas razões pra gostar desse ponto da estrada. - Victor falou com naturalidade e me olhou sorrindo.

Eu não respondi, apenas apoiei minha cabeça em seu ombro e cobri a mão dele, que estava em minha perna, com a minha.

- Alana, você precisa afastar essas caraminholas da sua cabeça. Relaxa! – Victor apertou minha mão ao falar.

Eu balancei a cabeça em resposta e levantei o olhar pra ele que me deu um beijo rápido e voltou a se concentrar na estrada.

Victor agia como se realmente estivesse tudo bem, continuava carinhoso, atencioso, espontâneo e sincero, mas algo em seu olhar estava diferente, eu o sentia mais distante e um pouco preocupado. Claro que poderia ser o meu sentimento de culpa falando e era bem possível que fosse.

Em vários momentos depois da conversa antes do café da manhã eu tive essa sensação de distanciamento.

Quando terminamos de comer, por exemplo, ele fez uma cara safada e anunciou sorrindo.

- Digão já mandou várias mensagens avisando que a carne já tá assando e querendo saber que horas chegaremos. Vou tomar um banho antes de irmos. - pegou minha mão e me convidou de forma charmosa. - Me acompanha?

Eu aceitei o convite feliz, mas, quando o olhei, ele virou o rosto de imediato, como quem tenta disfarçar alguma coisa, mesmo assim  eu notei uma ruga se formar no canto de sua boca e arrisquei um charminho.

- A não ser que você ache mais rápido tomar banho sozinho!

- Melhor, né? - Ele respondeu soltando minha mão. - Antes que Digão resolva mandar um helicóptero nos buscar. - Completou rindo, me beijou e partiu para o banho me deixando ali sozinha e arrependida do meu charminho bobo.

Quando ele saiu do banho eu fui ao seu encontro, queria tirar aquela má impressão de mim. O encontrei ainda nu, secando os cabelos.

- Se é pra ter esse tipo de visão me chame sempre! - Falei me apoiando no umbral da porta.

- Ah, moça, aproveita! Porque se fosse ao contrário eu também estaria aproveitando! - Victor disse rindo ao se virar pra mim e abrir os braços, me dando uma visão completa do seu corpo.

Não resisti e me aproximei. Corri minhas mãos pelo peito largo e enrosquei meus dedos nos seus pelos, desenhado um caminho em direção ao seu prazer. Victor largou a toalha e me puxou contra o corpo, me beijando com desejo, daquele jeito intenso que fizera várias vezes durante a noite. Mas, quando ele se afastou, mais uma vez seu olhar parecia preocupado e não procurou o meu.

- A gente poderia se atrasar só um pouquinho. - Eu disse com a voz rouca pelo meu desejo já aceso.

- Poderíamos... - Ele segurou meu rosto entre as mãos e sorriu. - Mas não vamos! – Afirmou sorrindo. - Velhinho, lembra?

Eu sabia que era uma desculpa, seu prazer já acordara e pressionava de leve meu corpo. Mas assenti e me afastei, deixando-o terminar de vestir-se.

Tivessem sido esses dois momentos somente, eu realmente acharia que era impressão minha, mas não foram, e o que mais me deixava insegura era a falta do olhar dele no meu. Em todos os momentos antes daquela manhã, ele não perdia a oportunidade de conectar nossos olhares, tivesse falando sério ou implicando, nossos olhos estavam sempre um no outro. Mas agora, não que ele não me olhasse nos olhos, ele o fazia, mas eram contatos rápidos, e aquela ruga quase imperceptível no canto dos lábios sempre aparecia antes dele desviar o olhar.

- Eu to tentando. - Falei quebrando o silêncio que novamente tomara a caminhonete.

- Tentando? - Ele não conectou minha fala com a última afirmação dele.

- Afastar as caraminholas da minha cabeça! - Falei com uma risadinha. Ele ergueu as sobrancelhas e sacudiu a cabeça positivamente. - E pra ser sincera... - Victor me olhou rapidamente quando comecei a falar. - Não acho que está tudo bem. - Mais um olhar rápido dele. - Mas você afirmou que sim, então vou acreditar em você.

Me ajeitei no banco e estiquei o rosto para alcançar o dele e depositar ali um beijo delicado.

- Boa moça! - Victor disse sorrindo sem tirar os olhos da estrada.

Claro que as caraminholas da minha cabeça não foram embora porque ele havia dito pra eu afastá-las ou porque eu não as quisesse mais ali, mas eu decidi não dar bola pra elas, ao menos por enquanto.

A chegada a Fazenda foi uma cena de filme adolescente, assim que saímos do carro Gi e Pedro correram na minha direção, me arrastando pra longe de Victor, querendo saber todos os detalhes da nossa noite.

- Eu vou contar, juro que vou, todos os detalhes que vocês querem saber, mas não agora, nem hoje, quando estivermos sozinhos eu conto tudo, prometo. - Eu falei rindo do jeito ansioso deles.

- Mas nem um detalhezinho? - Pedro insistia com cara de pidão.

- Não trabalhamos com detalhezinhos! - Falei com cara de sem-vergonha arrancando risadas alegres de meus amigos.

- Ai Meu Deus, o boy além de gato e talentoso ainda é bem provido, amiga, você ganhou na loteria. - Pedro disse me abraçando.

- E vocês falaram sobre mais? Sobre continuarem? Sobre o ... - A pergunta de Gi foi interrompida pelo meu movimento negativo de cabeça.

- Nada de conversa sobre futuro, só falamos sobre o presente! - Eu pisquei pra Gi ao responder.

- Droga! - Gi fez uma careta contrariada.

- Agora chega que já falei mais do que me propus! - Encerrei o assunto abraçando meus amigos.

Aquele abraço me fez tremer, era pra ser um abraço feliz, na verdade era um abraço feliz, mas estar ali na segurança do carinho e amor deles me trouxe as minhas inseguranças de volta. Apertei com mais força o abraço.

- Hummm! Que abraço bom! - Pedro falou amoroso.

- Melhor abraço do mundo! - Gi completou no mesmo tom.

- Eu amo vocês! - Falei com todo meu coração.

Desfizemos o abraço feliz e juntos seguimos para o quiosque onde as violas já entonavam.

Amanhecer em CançãoOnde histórias criam vida. Descubra agora