Capítulo 5

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Tyler

Procurei pelo termo “Safeword” tantas vezes no Google que já recebo dicas de pesquisas relacionadas a sadomasoquismo. A palavra de segurança é o único jeito de parar uma sessão de BDSM, como um botão de emergência que desliga os mecanismos de uma máquina. Gavin não me parece um homem adepto a estas práticas, mas as aparências geralmente enganam, muitas vezes propositalmente.
Ninguém sai por aí anunciando que gosta de coisas não ortodoxas no sexo. Pessoalmente, se me disserem que é excitante apanhar ou sentir dor, vou achar que a pessoa tem parafusos a menos. Bem menos do que eu, que estou dependendo de um laudo psicológico pra continuar trabalhando.
É irônico, como um cego guiando outro cego, que um louco investigue os loucos. Eu já ouvi dizer que de perto ninguém é normal, mas às vezes acho que as coisas já ultrapassaram o bom senso e o ridículo. Deito pra dormir e não sei mais quem sou ou que rumo dar pra minha vida, e este, senhoras e senhores, é o homem que deve prender pessoas perturbadas. Irônico é pouco.
Mais um dia se passou sem que eu e Sanchez descobríssemos qualquer coisa relevante sobre Gavin Linden. Isso me deixa frustrado ao extremo, tanto que vou para o hotel repassando todas as coisas que sabemos até agora. Tomo um banho e peço uma pizza. Comer sozinho é uma merda, ainda mais assistindo qualquer noticiário sobre mais crimes, mais desastres, mais gente louca. Abro mais uma cerveja e me encosto na cama, pensando em ligar para Sasha e ouvir sua voz aveludada.
As palavras do Dr. Newman ecoam na minha cabeça. Talvez eu devesse tentar falar com ela, me desculpar por tudo que eu nem sei que fiz. Em vez disso mando somente uma mensagem com nosso velho costume de omitir vogais das palavras para produzir pequenos enigmas.
> SNTSFLT.
Quero dizer “Sinto sua falta”.
Pelo aplicativo vejo que ela viu a mensagem e alguns minutos se passam sem que haja qualquer resposta. Nem mesmo um pequeno sinal gráfico que me amenize o coração. Caralho. Eu estou à beira do ridículo mesmo, tão sozinho numa quarta-feira à noite, me entupindo de cerveja e auto piedade. Encosto na cabeceira da cama e suspiro profundamente, é então que algo clica em minha mente.
Recobro o celular e pesquiso: SFWD. Quem sabe os responsáveis por Safeword querem que seja um enigma. Quem sabe eles não queiram ser achados facilmente, em pesquisas de internet.
Bingo.
O website que eu abro não tem nenhuma menção à palavra Safeword, mas a logomarca é exatamente a mesma que eu vi no cartão encontrado nas coisas de Gavin Linden. Aparentemente é um clube de sexo, com viés BDSM para amadores, cheio de salas onde pessoas esquisitas podem fundir seus cérebros e corpos com bizarrices como amarras, chicotes, spikes, entre outros acessórios que parecem saídos de filmes de terror. É uma loucura em preto e vermelho, do tipo que eu nunca imaginaria ver alguém como Gavin. Ou eu mesmo.
Penso em ligar para Rafaella, mas é um tiro no escuro. Não tenho nada além do testemunho de um colega de trabalho e um cartão de negócios que me garanta que Gavin frequentava o lugar.
Ligo para o lugar em vez disso. Uma voz masculina me atende. Eu esperava uma voz sensual feminina, que fosse me seduzindo a conhecer o local. Parece que Safeword não é tão clichê como imaginei.
– O lugar está aberto hoje? – pergunto casualmente.
– Já é cliente? – ele não é muito amigável.
– Não. Estou interessado em conhecer.
– Está aberto a partir das onze horas. A entrada cessa à meia noite.
– Eu não posso entrar depois da meia noite?
– Que parte de “a entrada cessa à meia noite” você não entendeu?
– Vocês não gostam muito de novos clientes, não é mesmo? – rio ironicamente.
– Preciso de seu nome. Na entrada você deve deixar seus pertences em um armário, incluindo telefone. Não é permitido filmar ou gravar dentro do clube. Se não estiver disposto a seguir as regras, não venha.
– Uau, o melhor host de Chicago, definitivamente. – acho o exagero na grosseria completamente desnecessário. – Tyler McKenzie.
– Anotado. – e o homem desliga.
Parece que pela indisposição em lidar com pessoas o atendente pode ser o assassino de Gavin. O pobre e inadvertido Linden deve ter perguntado as horas pro sujeito e ele o matou gritando “Que parte de ‘a entrada cessa à meia noite’ você não entendeu? Engula este testículo, seu inútil.”. Apresso-me em trocar as roupas, rindo sozinho da primeira coisa que me alegra no dia, mesmo que seja uma idiotice.
Nem sei por que estou indo a Safeword. Talvez eu só queira entender a mente de um cara legal como Gavin, procurando diversão sexual em outros lugares que não os comuns. Talvez minha cabeça já perturbada esteja me mostrando que ninguém mesmo é normal, o que me garante alguma esperança do Dr. Newman me dar uma avaliação positiva. Mas no fundo, apesar de não estar indo profissionalmente, eu espero achar pistas de comportamentos que me levem à pessoa que matou Gavin Linden.
Houve uma crueldade, uma tortura vil na forma que ele foi morto. Quem gosta disso é um sádico. Não acho que haja lugar melhor pra achar um sádico do que no clube de sadismo que o morto frequentou.
Dou meu nome, deixo meus pertences num armário, conforme sou instruído. Apesar da janela de tempo para entrar no clube ser apenas de uma hora, o lugar está abarrotado de pessoas. Muitas mesmo. Elas se agitam numa pista de dança onde as luzes piscam e o som é altíssimo. Ao redor há pequenos palcos e postes onde as mulheres se arriscam em performances sexys.
Algumas pessoas se aliviam por ali mesmo, no meio da multidão, se masturbando ou trepando em duas, três ou mais pessoas. O ambiente é orgástico, sensual, burlesco e cheio de gente doida e semi nua. Eu quase peço desculpa por estar de jeans e camisa, perto dos outros, parece que estou usando uma burca. A maioria dos homens está pelo menos sem camisa, as mulheres de lingerie.
As pessoas são jovens, de bom nível e bonitas. Acho que malham exclusivamente para parecerem bem para o show semanal de exibicionismo. Ninguém parece ter vergonha, mesmo os que não têm corpos esculpidos pela academia ou pelo cirurgião. A garota que me acompanhou desde a portaria para meu tour inaugural me deixa contemplar um pouco o ambiente. Uma garota se prende pelas pernas no poste metálico e fica de ponta cabeça em um dos pequenos palcos bem ao meu lado, homens e mulheres extasiados passam as mãos em seu corpo e saio do caminho.
– Você deve pedir permissão para as mulheres para tocá-las, encostando em partes neutras de seus corpos. – a guia turística me adverte. – Se ela recusar o toque, afaste-se.
– Entendido. – concordo prontamente. Realmente até agora minhas mãos não coçaram para encostar em ninguém.
Continuo sendo o homem em crise de meia idade com zero desejo sexual.
– Você também pode entrar na parte mais privada do clube pelas portas metálicas ao final do salão, cruzando a pista. Lá é permitido participar ou apenas observar.
– Lá que há todo aparato de tortura? – sorrio e ela corresponde.
– Sim. É lá. Todo consumo vai pra sua conta pela pulseira eletrônica, não a tire ou perca.
– Certo. – concordo pegando uma cerveja da bandeja do garçom e ele aponta um aparelho para a pulseira que instalaram no meu braço logo na entrada.
A música cessa e meus ouvidos fazem um baque seco, como se meus tímpanos estivessem relaxando. As luzes se intensificam, mas não ao ponto de clarear todo o ambiente.
Uma morena se levanta de um sofá num dos camarotes ao redor da pista. Todos os olhos estão nela, algumas pessoas se cutucam e o silêncio é geral. É como se todos tivessem entrado em transe pela mulher, cultuando-a como uma deusa. Ela tem os traços exóticos, sua boca faz uma onda como um rio sinuoso em lábios carnudos e vermelhos. A estrutura de seu rosto é forte e marcante, com maçãs do rosto pronunciadas e olhos de gata. Literalmente ela parece uma gata com o nariz pontudo e pequeno e olhos tão expressivos que entendo o fascínio que ela exerce imediatamente. Este tipo de beleza mediterrânea é exógena e hipnotizante.
Pro meu gosto ela é magra demais. Seu corpo esguio está marcado numa blusa justa de alças em renda preta, cuja transparência dá a visão clara de seus seios, e uma calcinha cavada que cobre metade de sua barriga, em couro, obviamente. Ela tem botas pretas até o joelho e algumas coleiras nas mãos.
– O que está acontecendo? – pergunto num sussurro e os fãs da morena me dão “shhhhhs” mal educados.
– Ela é a Viúva Negra. – a garota fala baixinho. – Ela é como uma celebridade da casa.
– Isso eu percebi. – olho a tal Viúva começar a se movimentar pelo local. – Mas por que Viúva Negra?
– Como a aranha, a viúva-negra mata o macho após a cópula. Ela ganhou este apelido porque escolhe os homens para a noite e não os repete mais. E eles voltam, enlouquecidos por ela. Agora ela está escolhendo.
Eu rio. Parece uma história fantasiosa e até engraçada. Eu mal consigo acreditar na quantidade de pessoas que levantam as mãos enquanto ela passa, como se implorassem para serem escolhidos por ela.
Ela me olha e agora mais de perto consigo contemplar mais sua beleza. A mulher é como uma Ísis contemporânea. Seu olhar parece alcançar algo dentro de mim, me dando uma breve disparada no coração.
Entendo o fascínio. Estou envolto na aura de dominação de uma das mulheres mais desejadas do espaço inteiro, e ela me dá um olhar como se conseguisse ler minha alma. Eu só não teria qualquer reação a isso se estivesse morto. A Viúva Negra passa do meu lado e seu cheiro é fantástico, me causando uma ereção espontânea. Caralho, por essa eu não esperava mesmo, mas isso me iguala a diversos outros caras do lugar que inclusive não conseguem se seguram e se masturbam ali mesmo em meio à pista.
Ela coloca uma coleira num homem que se ajoelha à sua frente e ele a segue junto com a loira que deu a volta toda no salão com ela. Sinto meu saco enchendo. Porra, faz algum tempo que essa sensação não me atinge.
A deusa encoleira outro homem e todos rumam juntos à parte privativa do clube. A música volta até me fazendo pular de susto. As luzes piscam.
– Isso aconteceu mesmo? – pergunto para a mocinha que me dava instruções, como se a cena tivesse feito parte de um lapso na realidade.
– Ainda está acontecendo. – ela aponta algumas pessoas se apressam a entrar na área mais restrita.
– O que a Viúva faz? – a olho surpreso.
– Você devia ir ver. Eu não posso ser sua babá a noite toda. – ela ri.
Tomo minha cerveja com calma, ainda observando as pessoas ao redor, tentando imaginar Gavin entre essas paredes. Finalmente decido me aventurar pelo lado B do clube. É como se eu estivesse entrando em um lugar sem qualquer amarra moral. Moral, eu disse, porque amarras são realmente ubíquas, de todos os tipos e tamanhos.
Diversas pessoas transam em quartos sem nenhuma privacidade espalhados pelo corredor. A área é imensa, lotada de pessoas, quase todas nuas ou usando muitas máscaras e acessórios em couro. Me detenho alguns minutos observando um casal cuja mulher está completamente imobilizada, com os joelhos junto ao corpo, sobre uma cadeira que parece um instrumento de tortura.
O homem bate com um chicote rígido bem no meio de suas pernas e ela choraminga. A visão da pele dela queimada pela fricção das cordas me lembra os punhos e tornozelos de Linden. Talvez ele não tenha sido amarrado antes de morrer, podem ser marcas antigas de suas incursões em Safeword.
Ando mais um pouco e o gemido mais intenso que já ouvi me atrai para a parede envidraçada à frente do corredor. Pelo tanto de gente deve ser a celebridade morena que está continuando seu show. Me aproximo do vidro e prendo o ar instantaneamente.
Os dois homens que ela angariou no salão estão em focinheiras, criando figuras animalescas e sem rosto. Ambos têm ainda as coleiras no pescoço, e a Viúva Negra está montada em um, cavalgando-o alucinadamente enquanto o outro a tem por trás, movendo o quadril no mesmo ritmo que ela. Ela quase grita com os dois dentro de si, fechando os olhos e girando o pescoço de modo que seu cabelo emoldura o rosto perfeito.
Os punhos dela estão enrolados um em cada guia das coleiras dos homens e ela os puxa, espremendo seu corpo mais e mais entre os dois. Eles a apertam, seguram seus seios e cintura. Temo que o corpo magro dela se parta ao meio com a força que eles impõem sobre ela, e a mulher geme tão gostoso, tão entregue àquilo que parece estar sentindo algo sobre humano.
Não consigo desviar o olhar. Não consigo conter a excitação que cresce em meu corpo. A Viúva Negra para de gemer, embora seu corpo continue ritmado pelos dois escravos que a atravessam impiedosamente, ela abre os olhos e os fixa no vidro. Eu posso jurar que ela está olhando pra mim, mas os vidros são espelhados por dentro, ainda assim é o olhar mais penetrante que eu já vi.
Eu gozo sem nem encostar no meu pau, tamanho é o efeito visual que a noite teve sobre mim. À parte da sujeira nas minhas roupas, sinto um relaxamento tão grande que me sinto meio desnorteado ao sair do clube e chamar um táxi para ir pra casa.
No pequeno quarto de hotel eu me deito e fecho os olhos, lembrando da Viúva Negra. Eu entendo porque Gavin voltou ao clube. Se ele esteve com aquela mulher, virou um de seus seguidores. Se ele não esteve, voltava com o objetivo de um dia estar. Pela primeira vez em meses eu não consigo dormir e seguro meu pau duro como pedra entre os dedos, subindo e descendo a mão freneticamente, oscilando minha respiração e pensando na morena com olhar felino.

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