Gaillard: O gosto da derrota

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O corvo acorda de um demorado sono, ao fitar para a janela do aposento o sol ainda brilha pelo horizonte, e o canto dos pássaros ressoa. Do lado antagônico da ventania, seus olhos encontram Zyra e uma senhora encapuzada:

— Não faça forças meu jovem, não está completamente curado. — Diz a senhora de voz mansa e falha. — Os danos, mesmo que simples, foram agravados pela exaustão do seu corpo, ele ainda não tem êxito para se restabelecer sozinho.

— Eu... Perdi, Gilgamesh parou minha ofensiva com a mão... — Fala Aloramir com uma entoação de choro. — Por minha causa agora todos estamos subordinados deste monstro.

— Ei criança! — Contesta a anciã. — Eu não sei o que vocês fizeram para ter que batalhar contra o mestre Gaillard no coliseu, mas ele não é essa criatura, inclusive ele me deu ordem para comunicar que vocês estão livres assim que eu te curar por completo. — Zyra e Aloramir se espantam.

— Livres? Ele me disse que eu teria de labutar com ele. — Desrespeitando o pedido da mais velha, a surpresa o faz querer se sentar na cama, mesmo com dificuldades.

— Ele é louco, mas não é perverso. — A velha tira o capuz e mostra sua face, ela não tem o olho esquerdo e o lado direito é mutilado. — Sou uma das últimas curandeiras das seguidoras da Deusa Urumis. Aquelas dignas de sua devoção recebiam a dádiva divina da cura, contudo, antes do Pacto de Paz éramos caçadas para sermos escravizadas, ou até mortas para que outros clãs não nos utilizassem. Por me renegar a servir a um clã destas redondezas fui torturada por cinquenta dias, a primeira coisa que fizeram foi haurir meu olho. Após o quinquagésimo dia sentenciaram minha morte, iam me atear lume em público. Até que um garoto apareceu para me salvar.

— Garoto? — Pergunta Aloramir cortando a narrativa da senhora.

— Sim, na época ele tinha seus doze anos, mas por confiança de seu próprio pai era o general de um batalhão de homens, contudo, naquele dia ele estava sozinho. Gilgamesh mesmo sem depreender meu crime matou todas as pessoas que tentavam me assassinar, homens, mulheres, crianças, não importava, se levantava a espada contra ele, então significa que teria que lutar até morrer. Naquele dia atípico Gilgamesh me retirou de lá matando cinquenta pessoas.

— Que!? — Zyra espantou-se.

— Falando assim parece que ele é só um monstro sanguinário. Ele só é muito protetor. — A mulher põe a mão sobre a ferida do corvo, e uma cintilação branca começa a ocorrer entre sua palma e a úlcera aberta. — Mas ele tomou minha glorificação quando mais novo, é apenas uma eterna criança que tenta tutelar tudo que lhe pertence. Nunca acumulou ódio ou raiva de quem enfrenta.

— Mesmo assim. — Os olhares se voltam a Aloramir conforme ele fala. — Ele me olhou com desprezo, como se eu fosse um verme em seu caminho.

— Olhei por que você me olhou com soberba. — Diz o próprio Gilgamesh recostado no canto da porta. — Quando acertou aquele golpe na minha lança, vi o sorriso subindo em seu rosto, julgando que seria fácil me vencer. Não gosto de ser subjugado... Bom dia Zyra, Corvina. — Ambas corresponderam a educação do régio. — Aloramir, provavelmente você estará recuperado ainda nesta manhã de domingo, mas antes de partir, por mercê, me procure.

— Domingo!? Fiquei nesse leito por cinco dias!? — O rapaz força novamente seu busto, sofrendo das dores de seus músculos por consequência.

— Disse que seu corpo estava cansado. — Responde Corvina.


Desafiantes - A queda AvalonOnde histórias criam vida. Descubra agora