Capítulo 24.

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Assim que chegamos na casa noturna, com referência em ritmos latinos, principalmente a salsa; guio Maria para a pista, e ela me acompanha numa coreografia improvisada. Apesar dos ensaios escassos, por causa da correria cotidiana que estamos enfrentando, basta que, enlaçemos nossos corpos para a sincronia e todo resto acontecer naturalmente. É como se pudéssemos ler a mente um do outro e adivinhar quais passos combinam com a emoção que estamos produzindo no momento.

Estava precisando disso. Quando estou dançando; o mundo de um modo geral, torna-se um mero figurante da minha existência. Meu cérebro entra em automático, e minha alma galga livremente através da expressão corporal. É óbvio que minha namorada desfruta da mesma sensação. Ela sorri com o olhar e é o suficiente para eu saber que está divertindo-se, o que me deixa deveras satisfeito.

Claro que o local não se compara ao Arriba, e talvez ela estivesse mais feliz se a relação com a única irmã fosse de paz e amor. Embora eu ache meio difícil das duas se acertarem, por ambas possuírem uma personalidade muito forte, eu tenho esperanças de que as coisas se resolvam entre elas com o tempo. Eu mesmo gostaria de ter tido uma chance de reconciliação com minha família, mas creio que seja tarde, uma vez que não estou disposto a procurar por eles, seja qual for a circunstância, e tudo indica que nem eles a mim.

Só me dou conta de que estamos executando a nova performance da mistura dos estilos, quando noto que as pessoas estão paradas entorno de nós, acompanhando cada gesto com uma admiração absurda.

A coreografia chega ao fim, e somos ovacionados por cerca de três minutos.

Maria percebe o efeito que incutimos nos presentes, e sorri incrédula. Lanço-lhe um olhar de que havia a avisado que funcionaria, e ela me conduz, euforicamente para o balcão. Sentamo-nos, e eu peço duas margueritas para o barman.

- Você viu? Te disse que ia dar certo - comento com o intuito de provocá-la após concluir o pedido.

- Sim, mas quero ver se conveceremos os jurados também, bonitinho! - a morena trajada elegantemente na minha frente aperta meu queixo com as unhas.

- Não tenho dúvidas - suspiro, fitando um ponto indefinido. Está complicado para eu parar com a bebida e o cigarro, e no tratamento hormonal é mais que recomendável não fazer ou evitar o uso de nenhuma dessas toxinas, devido às suas consequências negativas no nosso organismo e as complicações que podem vir a ocorrer, especialmente no resultado das cirurgias, na circulação e no fígado. É sumamente importante que qualquer pessoa tente levar uma vida o mais saudável possível, principalmente quando é estritamente necessário, porém nada é proibido e cada um sabe o que é melhor para si mesmo.

- O que você tem? - meu estado não passa despercebido por Maria.

- Levei uma bronca do meu novo chefe - decido desabafar, pois é algo que está me incomodando imensamente. Teoricamente, eu deveria me sentir à vontade para falar sobre tudo com ela, mas não é assim na prática. O que soa contraditório, pois antes de ficarmos, éramos amigos. A verdade é que, nunca me senti confortável para me abrir com Maria sobre determinados assuntos e só está tendendo a piorar.

- Isso é muito chato.

- Não tiro a razão dele. Mas, é que, ele falou de uma forma tão humilhante. Você tinha que ver como me olhou.

- Meu amor, deve ser só impressão sua... - ganho uma carícia na bochecha, do lado esquerdo.

- Pior que não é. Ele deixou bem claro que não vai me tolerar - bufo. - Não suporto mais isso.

- Ei, não fica assim. - Maria me dá um selinho na boca, realmente preocupada em me consolar.

Não respondo. Quero contar que a cirurgia já foi liberada e só estou esperando o retorno do plano, mas ainda me falta coragem. Certamente, Maria irá se aborrecer e não estou com energias para discussões tão desgastantes. O mundo resolveu ruir na minha cabeça sem aviso prévio. Se não bastasse ter que lidar com um perseguidor anônimo, tenho que aturar Dave, e a incompreensão dela.

Almas Dançando ( TRANS/BI/POLI)Onde histórias criam vida. Descubra agora