Capítulo 55.

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(Yan)

Quando estava saindo da clínica, depois do meu pai pegar no sono, recebi uma ligação de Rocco me convidando para encontrá-lo numa lanchonete no bairro onde ele mora. Não recusei. Estou afastado do meu amigo, e ele é uma pessoa incrível para ser deixado de lado. No caminho tentei contatar meu irmão, mas seu celular continua desligado.

A conversa com Rocco fluiu agradável e ele acabou me confidenciado que Maria saiu da casa da irmã e está morando com Brianna e suas mães, Tina e Britney. Estranhei a notícia, afinal, até onde sei, Maria era muito apegada a irmã. Imagino que elas devem ter brigado de novo, mas Rocco não quis me contar o real motivo, embora pareceu sabê-lo. No final, me convenceu a sair para dançar. Não concordei de imediato. Ainda não superei a morte de Frank que, está super recente. Porém, refleti, e percebi que onde quer que o Frank esteja, ele não gostará de me ver triste pelos cantos, visto que a vida passa rápido demais para perder sequer um segundo com sofrimento. Além do mais, dançar é minha terapia.

Vou pra casa e tomo banho. Quando termino de me arrumar, é que Chang dá sinal de vida. Ele explica que teve que fazer uma rápida viagem e esqueceu o celular em casa. Tratei de explanar tudo que aconteceu na sua ausência e ele apenas aprovou minha atitude, demonstrando ter ficado feliz com minha reconciliação com nosso pai. Confesso que também estou e estranhamente aliviado como se tivesse arrancado um peso desnecessário dos meus ombros que limitava meus passos. Enfim, como nada que tem acontecido na minha vida ultimamente tem sido por acaso, “a coincidência” teve seus benefícios.

O que eu não esperava, é encontrar Maria no carro, assim que Rocco noticiou sua chegada. Suspiro embevecido com sua beleza. Me acomodo no banco da frente ao lado de Rocco e Brianna vai atrás com ela.

Vamos para uma casa noturna, que é frequentada somente por dançarinos, onde acontecem desafios musicais. Funciona da seguinte maneira: formam-se pares, e todos devem ir para a pista, onde jurados avaliam quem está dançando corretamente conforme os ritmos que o DJ coloca pra tocar. Quem errar, é automaticamente desclassificado e ganha só quem conseguir chegar até o fim. Se for mais de um par, acontece um duelo, e a plateia decide quem será o vencedor, conforme forem ovacionados. Participa quem quer, e a competição acontece até a hora de fechar.

- Brianna e eu vamos participar, vocês não querem? -  Rocco investiga assim que a segunda fase é anunciada.

- Eu não sei... Não tenho um par... - Maria murmura olhando-me de esquinado. Até então, conversávamos entre os quatro, como se não nos conhecêssemos intimamente, e surpreendentemente, ela parece tímida na minha presença.

- Eu posso dançar com você, se quiser... - ofereço-me, temendo que ela não aceite.

- Claro, você quer? - suas profundezas castanhas brilham para minha surpresa.

- Sim. Não perguntaria se não quisesse... - dou de ombros.

- Então vamos, já vai começar! - Brianna puxa Rocco para a pista, e eu estico minha mão para Maria. Ela a segura, e instantaneamente, um tremor percorre meu corpo precedendo do meu cerne.

Nos posicionamos e o DJ dá a largada de dez segundos.

Ele inicia o entretenimento com um rock dos anos dourados. Passa por Blues e Jazz contemporâneo, Balé, Tango, Flamenco, inclusive a Salsa, Reggaeton, Dança de Salão, Bachata, Kizomba, Samba e Funk Brasileiro e quando percebo, só estamos Maria e eu na pista, pessoas ao redor aplaudindo e assoviando generosamente, nossos corpos suados e a respiração ofegante. Até aí parecia que só existia nós dois no mundo, desfrutando de  uma rara sintonia mental.

Um dos jurados vem nos parabenizar e entrega um troféu da casa.

Rocco e Brianna vem nos cumprimentar logo depois e eu fico sem entender porquê eles não chegaram na final, pois são tão bons dançarinos quanto nós.

- Nos enrolamos no Flamenco... - Brianna comenta aos risos.

- Eu tropecei e caí - esse é Rocco rindo descontraidamente.

- Vocês foram incríveis... Pareciam duas plumas volitando!

Maria olha para mim com um sorrisinho envergonhado e eu sustento o olhar.

- Amor, estou morrendo de sede, vamos pegar alguma coisa para bebermos!? - Brianna sugere notando o clima que paira sobre mim e minha ex.

- Eu quero um refrigerante. Parei de beber - aviso e todos me fitam um tanto quanto chocados. Simplesmente desdenho. A maioria das pessoas está tão habituada a consumir alcoólicos que é de se espantar quando alguém para de beber ou nunca os bebeu.

- Eu quero um coquetel sem álcool também - Maria pede.

- Ok... Descansem... Nós voltaremos já já! - Rocco conduz a namorada em direção do bar.

Guio Maria até uma mesa disponível e posso respirar serenidade. Meus pés resolvem me lembrar que sou humano.

- Senti saudades disso, sabia? - Maria manifesta naturalmente.

- Eu também... - admito.

- Então é verdade o que a Brianna me contou? O Frank...

- Sim. Ele se foi... - confirmo antes que ela termine a frase. A morte não combina com Frank.

- Eu sinto muito... - expressa sincera colocando a mão sobre a minha em cima da mesa. - Eu gosto muito dele... Mas, sei o quão importante ele é pra você...

Não aguento e as lágrimas descem sem minha concepção. Maria me laça para um abraço cheio de significado e beija meu pescoço para demonstrar apoio e carinho.

- Você sabe que ele não se foi totalmente, não é? A morte não é o fim - sussurra ao pé do meu ouvido e eu arrepio até a alma inebriado com seu cheiro. Que saudade que estou dela! - É só uma passagem...

- Eu acredito. Agora eu acredito... - exponho e dou alguns beijinhos no seu ombro de maneira espontânea como se não tivéssemos ficado tanto tempo sem nos falarmos e termos nos separado daquela forma trágica.

Ela contém meu rosto com suas mãos quentes e me faz encará-la, como se quisesse que eu faça uma leitura minuciosa de seu âmago. No próximo segundo nossos lábios se tocam, levemente hesitantes, e um beijo calmo se inicia. Me sinto energizado compartilhando nossas salivas certo de que àquele não era o nosso fim definitivo como havia pensado mas sim um tempo necessário de renovação de sentimentos e experiências engrandecedoras.

Almas Dançando ( TRANS/BI/POLI)Onde histórias criam vida. Descubra agora