Capítulo 57.

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Caminhei com Maria até encontrarmos um táxi disponível e sugeri que fôssemos para praia. Ela concordou de imediato. Maria gosta tanto do mar quanto eu. E às vezes me lembro do que Frank me disse, e fico me perguntando se realmente não nos conhecíamos de outras vidas. Talvez tivéssemos planejado reencarnarmos juntos e acabamos nos desviando do propósito de ajudar um ao outro em nossas dificuldades. Talvez o Frank também faça parte disso, Elena e até Melany. Uma coisa eu aprendi: ninguém cruza nosso caminho por acaso. As pessoas têm sempre algo a nos ensinar e nós à elas.

Andamos em silêncio na areia com os pés nus. Hoje está ventando muito e nossas roupas dançam em nossos corpos, junto com o cabelo.

Nos afastamos de qualquer movimento de banhistas e nos sentamos.

Depois que nos beijamos naquela noite, não tivemos mais contato. Confesso que eu não quis procurá-la. Eu não sabia o que dizer e precisava pensar.

- Está tudo bem? - pergunta, visto que eu me mantenho calado.

- Está sim - passo os braços em volta dos meus joelhos dobrados.  - E com você?

- Bem também... Aconteceram muitas coisas desde que nos separamos...

- É, você não faz nem ideia.

- Mas, de alguma forma, você continua o mesmo. As circunstâncias não te mudaram. Continua o mesmo Yan de que eu me lembrava.

- Eu queria acreditar nisso, mas você sabe que não é verdade. Você também mudou.

- Não falo nesse sentido... Me refiro a nós, ao que sentimos um pelo outro...

- Mudou também...

Ela arregala os olhos, ficando pálida:

- Está dizendo que não temos mais chances? Eu não te culpo, eu fui uma idiota com você, com meus amigos, e comigo mesma...

- Você quer essa chance?

- É o que mais quero nessa vida... Você não quer?!

- Eu ainda te amo, Maria. - confesso e seus olhos voltam a brilhar. - Mas, não sei se esse amor é suficiente para ficarmos juntos e darmos certo. Parece que era só eu no relacionamento.

- Eu sei que você está com medo... Eu também estou... Desculpa reaparecer na sua vida assim... Eu não tinha o direito.

- Foi a vida que quis assim. Ela simplesmente te colocou no meu caminho de novo.

- Desculpa Yan... Eu fui egoísta... Eu só pensava no que eu queria, no que eu achava que era bom pra nós, eu nunca te escutei de verdade...

- Já passou...

- Mas eu preciso reconhecer meus erros. Eu não quero ser mais aquela pessoa infantil, egocêntrica, que achava que o mundo tinha que girar ao meu favor. Eu quero ser uma pessoa melhor, mas não é por você, nem por ninguém, é para eu poder deitar a cabeça no travesseiro e me sentir bem comigo mesma, porque é onde eu sempre vou estar. Não tem como fugir de mim... Eu tenho que ficar e enfrentar, sorrir e gostar da minha companhia. Eu não quero mais culpar as pessoas ao meu redor, porque são as minhas escolhas que determinam minha vida, e quem eu sou...

- Eu estou orgulhoso de você... - seu discurso e principalmente a emoção e a verdade que sinto nele, me encanta.

- Eu também estou - ela sorri.

- Meu amor por você está mais consciente. E eu gostaria de saber como está o seu.

- Eu não sei... Acho que mais maduro... Isso é bom?

- Eu não sei. Mas eu estou disposto a descobrir.

- Como?

- Por agora? Te beijando... - tenho certeza absoluta de que quero Maria na minha vida de novo.

Ela cora e no milésimo seguinte; selamos nossos lábios como se fosse a primeira vez.

{...}

Ficamos assim, matando a saudade da companhia do outro, revezando entre carícias, beijos, abraços e conversas a cerca do que acontecera conosco nos últimos meses desde que nos separamos. Contei a ela sobre tudo, desde a minha reconciliação com meu pai e meu irmão, a morte da minha mãe, a reforma do restaurante e meu novo cargo nele, o tratamento do meu pai, meu envolvimento com Elena e o Frank, até como ele morreu e a herança que me deixou, e a tentativa de suicídio. Se vamos recomeçar, não desejo guardar segredos. Porém, ela não me contou tudo. Desconversou quando perguntei qual o motivo dela ter saído de casa e estar morando na casa de Brianna. Decidi não pressioná-la, prefiro que ela conte quando estiver preparada.

Eu me senti um verdadeiro idiota quando ela me disse que não teve nada com o Rick, que o beijou apenas para me fazer ciúmes, e eu quase não acreditei que ela não ficou com ninguém esse tempo todo.

- Então você se entendeu um poliamorista bissexual? - questiona e eu não entendo seu tom sério, sem sarcasmo ou ciúme.

- Não vai achar que vou te trocar, ou vai?

- Não é isso... Só quero saber se você está certo disso.

- Sim, estou... Mas não acho que eu seja bem bissexual. Foi só o Frank, entende? Eu amo a essência dele, o amaria em qualquer corpo.

- Eu sei... Eu sempre soube que rolava um clima entre vocês, só que eu preferi tapar os olhos. E com a Elena também, acho que por isso não nos dávamos bem. É engraçado... - ela sorri sem graça - Eu tentei te controlar e eu mesma deixei o caminho livre pra eles.

- Não foi nada planejado. Simplesmente aconteceu...

- Não estou duvidando. Só entendi que não podemos prender ninguém a nós.

- Então...?! - estou apreensivo. Porém tenho que me preparar psicologicamente para um possível Não.

- Quer saber se eu estou aberta a isso, caso a Elena volte ou aconteça de você se apaixonar por mais alguém?

- Sim. Eu preciso saber, não quero que isso se torne um motivo pra gente brigar futuramente... E não estou dizendo que eu vá me envolver com a Elena novamente, ou que eu vá me interessar por outra pessoa... Só quero ser honesto com você e saber se você está preparada para continuar comigo nessas condições. Eu só espero que você entenda que eu te amo, que eu não me vejo mais sem você, e que você é insubstituível e única para mim... Só estamos trabalhando com as possibilidades...

- Mas, eu não vou ser a única em seu coração, eu preciso ser sincera, isso me apavora. Eu preciso pensar, ok? Eu não sei como eu lidaria com uma situação como essa. E você não precisa abrir mão de quem você é por minha causa. Eu também não te quero pela metade, quero exatamente esse Yan que está diante de mim; pleno, realizado e lúcido. Só é um pouco confuso para mim...

- Certo... Eu te dou o tempo que precisar.

- É melhor nós não termos nada até eu me decidir, ok? Não quero alimentar esperanças, é ruim para mim e para você... Depois será difícil soltar a corda e nós já sofremos demais para nos ferirmos outra vez.

- Você tem razão - concordo um tanto quanto frustrado. Mas, Maria está agindo corretamente. Ela está sendo sensata e isso me faz desejá-la ainda mais.

Gostaria de beijá-la, abraçá-la e amá-la até perder o fôlego, mas por enquanto isso não será possível, e eu devo respeitá-la. Não posso exigir dela mais do que pode me oferecer e nem ela à mim. Ir contra nossa natureza faria os dois infelizes.

Fitamos a imensidão, e só então nos damos conta de que já anoiteceu. Estar na companhia dela é tão bom que até perco a noção do tempo. A ideia de não tê-la mais como minha mulher me faz sofrer antecipadamente, e ela também parece refletir nisso. Ambos sabemos que se não podemos lidar com nossos novos “ eus”, a separação definitiva é iminente. Só espero que se caso isso acontecer, possamos manter a amizade, embora eu tenha certeza de que nada mais será como antes. Caso venhamos a reatar nosso relacionamento será transparente e mudará para melhor. Agora será tudo ou nada.









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