Capítulo 56.

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(Maria)

- Então, Maria... Você refletiu e já tem a resposta para a pergunta que te fiz na sessão passada? - Doutora Phillips indaga assim que chego em seu consultório e me estiro na poltrona reclinável.

Suspiro fundo.

- É, acho que sim...

- Por que é então que você tem tanto medo de engordar? É algo referente ao padrão estético ou por questões de saúde? - questiona segurando uma caneta e um bloco de anotações, encostada em sua mesa.

- Não... Não tem nada a ver com beleza ou ser saudável... Assim como existem pessoas gordas que estão com a saúde comprometida, há também as magras... E eu acho... Não, acho não... Tenho certeza que beleza é relativo, normalmente depende da percepção de cada um...

- Hummm... Então...?

- Eu tinha... Talvez ainda tenha, um pouco de medo de engordar porque eu pensava que ninguém ia querer uma gorda, ou que se chegasse a querer, no final iam acabar me trocando por uma pessoa que estivesse dentro dos padrões...

- Então está me dizendo que, seu medo é de ser abandonada e que, a única referência de que você tinha de abandono era o fato de sua mãe ter sido, porque era obesa?!

- Sim... É isso... Eu acho que de alguma forma eu associei o abandono ao ser gordo... Minha mãe tinha depressão e a única forma que ela encontrou de sentir prazer foi comendo... Eu lembro que éramos uma família tipo daqueles comerciais de margarina, exteriormente éramos a família perfeita e feliz, mas interiormente sabíamos que o conteúdo nos fazia mal...

- Você sabe que um comedor compulsivo é tão doente quanto uma pessoa que é bulímica e anoréxica, não é?

- Eu sei... Agora eu sei...

- Sabe, Maria. Na vida é preciso haver equilíbrio. O exagero faz mal tanto como a insuficiência.

- Eu entendo...

- Não pode julgar seu pai, assim como não pode basear sua vida na vida da sua mãe. Não é impossível ser saudável estando acima do peso. É importante cuidar da saúde física e emocional. Para um estar bem é preciso que o outro também esteja. Quanto ao medo de ser abandonada, você deve trabalhá-lo. Ninguém é abandonado, a verdade é que nem todas as pessoas estão preparadas para passar por determinadas situações conosco. Quando as coisas ficam maiores que nossa capacidade de enfrentá-las, não é errado admitir isso e tirar nosso time de campo. É vivendo e obtendo experiências que amadurecemos.

- Eu achava que só porque amamos alguém, nós somos obrigados a permanecer ao lado deles incondicionalmente...

- Ninguém é obrigado a nada. De que adianta ficar se vamos mais atrapalhar do que ajudar? Não devemos fazer as coisas porque achamos que são corretas, devemos fazê-las porque nosso coração está pedindo. Não é legal nos sobrecarregarmos. Não podemos dar algo que não temos pra oferecer. Nós podemos apoiar e ajudar na medida do que suportamos e ninguém deve nos julgar por isso. Lembre-se sempre que se a pessoa não ajudar a si mesma, ninguém mais poderá. Veja você... Antes de entender que precisava de ajuda e aceitar que está doente, ninguém conseguiu convencê-la disso.

- Tem razão... Então, minha mãe é a culpada do meu pai ter ido embora?

- Não existem culpados nem vítimas, Maria. Cada um é responsável por suas escolhas e deve lidar com as consequências. Assim como seu pai não encontrou forças para ficar e enfrentar a situação, sua mãe também não encontrou forças para si autoajudar. Todos nós tentamos, mas isso não quer dizer que conseguiremos vencer nossas limitações da noite para o dia, nem que fomos fracos. Nada surge num passe de mágica, as coisas são construídas, conquistadas e desenvolvidas pouco a pouco, dia após dia.

Almas Dançando ( TRANS/BI/POLI)Onde histórias criam vida. Descubra agora