Capítulo 75

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Yan

Vou ser direto, fui trouxa pra caralho.

Mané, tem horas que eu paro e penso "que caralho eu tinha na cabeça" porque não é possível eu ter ficado tão cego daquele jeito!

Depois de ficar um mês internado no hospital por ter sofrido um acidente de carro no dia que eu descobri no altar que a minha noiva me traia e o filho não era meu, a ficha tinha que cair né?

E pra ser sincero, não tem dor maior do que ouvir a sua mãe chorar e não conseguir abrir os olhos pra falar que tá tudo bem.

Ou ouvir de todos que tentaram me avisar e não conseguir pedir perdão.

"Filho volta pra mim"

"Não se rende irmão, não se perde aí dentro"

"Amigo, tu é trouxa mas é o trouxa que eu mais amo, volta pra nós"

"Me perdoa por não ter ido atrás de você, eu falhei como amigo"

"Você consegue vencer essa, nós temos tantas coisas ainda pra viver"

"Eu te amo"

Força não é algo apenas individual, eu tive forças pra conseguir viver por mais que eu tentei desistir, por mais que não compensasse eu continuar ali. Porém, quando eu abri os olhos enxergando a luz forte e todos os meus amigos e familiares de mãos dadas, com a cabeça baixa e orando eu senti que eu ainda não tinha realizado todos os meus sonhos, e que ali não era a hora pra desistir.

Sei que eu nunca vou parar de me crucificar por ter ficado contra os meus amigos e os meus pais, por ter descuidado e me entregado inteiro por alguém só tinha interesses.

Mas o Yan de hoje quer seguir a sua carreira, tocar os objetivos e as metas, poder sim realizar o sonho de se especializar na área de pediatra e cuidar de todas as crianças e jovens que com um sorriso mostram que querem continuar na luta.

Ok, eu me envergonho de mais uma coisa.

[FlashBack]

— FERNANDA — gritei no portão da casa dela.

— Osh, eu falei que ia te entregar o convite amanhã — ela falou e eu neguei com a cabeça.

— Eu não quero convite nenhum, eu preciso te falar tudo o que ta preso aqui — coloquei a mão no meu coração.

— Ih Yan, não vem com essas ideias não — me olhou — Tu bebeu?

— Só um pouquinho, e pra você saber eu vim de uber — respondi.

— Eu to cansadona amigo, fui resolver os problemas do casamento e entreguei metade dos convites — sorriu passando a mão na cara.

— Não casa com ele — falei rápido — Não faz isso, eu te amo demais.

— Amor? — escutei a voz do Guto — E aí parceiro, tá tudo bem?

— E-eu to de saída — me afastei rápido — To indo já.

— Não, espera aí — ele correu pra dentro e eu paralisei — Já leva o seu convite, tá bonitão — sorriu.

— Muito obrigado — olhei pra Fernanda — Boa noite.

[Fim do FlashBack]

Mó idiota, né não?

No outro dia eu acordei numa vergonha enorme, e do jeito que eu conheço os dois ela já tinha contado. O pior é que ele me ajudou pra caralho, me sentia um cuzão de alto nível.

Eu pensei que iria me incomodar ver os dois no altar, mas na real era só fogo no cu mesmo e confusão. Eu tava feliz pra cacete com aqueles doidos e o casamento foi do jeitinho deles, foda demais.

[FlashBack]

— Err, posso falar com vocês? — me aproximei deles — É rapidão.

— Pode pô — nos afastamos do barulho.

— Eu queria pedir desculpas — cocei a nuca — É errado eu ter envolvido vocês na minha confusão, to ligado que vocês nasceram um pro outro e nada atrapalha essa conexão — falei — E também era fogo no meu cu, desculpa por tudo mesmo.

— Fica tranquilo, irmão — Guto bateu no meu ombro — Você passou por muita coisa e é normal essa confusão, fica tranquilo.

— Bora curtir agora — Fernanda me puxou.

[Fim do FlashBack]

Acordei cedo no dia seguinte pra correr pro estágio, não era fácil não. Entrei pra sala separada apenas para os internos, coloquei a minha mochila lá e desci pra área de pediatria.

Conviver em hospital público é um teste de vida todos os dias, cada caso pesado que nós tínhamos que lidar, tem horas que eu me pergunto se é isso mesmo que eu quero mas super vale a pena toda vez que eu ajudo alguém.

Olhei para o canto e vi uma moça chorando encostada na parede, me aproximei e toquei no ombro dela. — A senhorita está bem?

— Eu pareço bem? — perguntou chorando — Eu vou perder o meu filho nesse hospital e ninguém me explica o que tá acontecendo.

— Quem é o seu filho?

— Arthur Vilela — respondeu — Eu to aqui desde madrugada e ninguém me fala o que ele tem.

— Toma essa água — fui até o bebedouro e peguei um copo com água — Vou tentar encontrar alguma informação.

Fui até o atendimento e chavequei uma enfermeira, que me informou que o menino era o próximo na fila dos exames e que mais um pouco teríamos um laudo completo. Voltei até a mãe e expliquei tudo o que eu sabia, a acalmando.

Fiquei acompanhando de longe o tratamento do pequeno Arthur, não tinha permissão de acompanhar mais de perto mas sempre mantinha a minha atenção em todos os procedimentos.

— Doutor — entrei na sala de exames — Já tem o diagnóstico desse menininho?

— Câncer — respondeu — Tão pequeno e já nessa batalha, vou informar a mãe.

Essa é a pior parte da medicina, lidar com as injustiças da vida que sempre aparece nos que menos merecem. Observei de longe a mulher que não aparentava ter mais do que vinte anos, ela chorava sentada em uma cadeira e o doutor Fabrício passava as mãos em suas costas.

Aguardei ele se afastar, ela saiu pela porta de trás e eu a acompanhei. Ela estava em frente ao hospital com as mãos no rosto, chorando baixinho.

— Eu sinto muito — falei baixinho, ela me olhou com os olhos cheios de lágrimas e eu não pensei duas vezes, envolvi elas no meu abraço.

— Eu to sozinha — soluçava.

— Não, você não tá sozinha — abracei mais forte.

Meta: 200

Não vejo outra saída [EM REVISÃO]Onde histórias criam vida. Descubra agora