O Duplo Gosto De Um Girassol

Capítulo Um

Gotta make sure that my legs are shiny
Hot wax melting, burn my skin
People all around me watching closely
'Cause it's how I look and not what I think

 Melanie Martinez - Strawberry Shortcake.

PARTE I

MANAÍRA, JOÃO PESSOA, PARAÍBA

28 DE NOVEMBRO DE 2016

O percurso parece ser longo, mas isso não quer dizer que é ruim. Quanto mais chão, mais tempo longe de casa e de todos os problemas que vem acontecendo na cabeça da jovem Estella. Ela corria todas as tardes pela cidade de João Pessoa acompanhado do ex-namorado, Otávio, com quem passou oito meses namorando. Foi uma pessoa que a ajudou a se distrair do pior momento da vida de uma garota, que é perder a mãe. Otávio já estava a rondando antes da fatalidade, mas por viver no mundo da lua, jamais dera tanta atenção para namorar.   

Ontem, Otávio ligou durante a noite terminando o namoro do nada, sem ao menos explicar qual seria o motivo. Claro que Estella não reagiria bem, ela passou o restante da noite chorando e não conseguiu nem sequer pregar o olho por um minuto, tentando entender o que o levara a tomar tal decisão.

Por isso, decidira se levantar cedo e correr sozinha pela calçada da praia de Manaíra. O fone de ouvido no último volume tocando "Chandelier" da Sia, é a única música que escuta repetidas vezes desde que saiu de casa. Se dar conta de que caminhar sozinha é bem melhor do que mal acompanhada, a deixa um pouco mais corajosa para enfrentar as barreiras que ainda vai enfrentar ao longo do dia. 

Mantenha-se firme, levante a cabeça e tudo dará certo, tenta convencer-se controlando a respiração que sinaliza querer acelerar novamente. Não. De novo não!

Poucas pessoas caminham ou fazem exercícios físicos em plena as cinco horas da manhã, porém, idosos e ciclistas movimentam as ruas, sem falar das velhinhas que estão levando seus cachorros para passear.

Ela vai desacelerando os passos ao ver alguém conhecido um pouco distante saindo de uma das pousadas do outro lado da avenida. É ele. É Otávio. Acompanhado de uma belíssima mulher de cabelos até os quadris com mechas loiras. Os dois estão aos risos, até que a loira aponta para o zíper aberto do garoto que logo fecha sorrindo.   

Poderia dizer que o tempo resolveu pausar naquela cena, mas não se enganaria fácil, as pessoas continuam circulando normalmente ao seu redor. Isso é um sinal. Um sinal de que não se deve parar por causa de uma pessoa que não vale a pena, mesmo que essa pessoa ainda mecha com seu coração. Quem dera o vento que levanta seus cabelos, levasse junto o que ainda a deixa dolorida.

Então Estella engole em seco e levanta a cabeça, olha mais uma vez para o ex-namorado para checar que não perdeu nada, apenas ganhou sua liberdade de volta, por mais que as pessoas com quem mora discorde totalmente disso.

Ela corre rapidamente de volta as quatro quadras em direção a residência, se bem que gostaria de correr para bem longe de lá, só para não presenciar a cara de sonsa da madrasta ao inventar mais uma das inúmeras mentiras ao seu pai.

Chegar à escola mais cedo do que o normal não é algo que está entre as coisas favoritas de Estella, pelo contrário, acordar cedo está no topo da lista das coisas que ela menos gosta de fazer. O que a faz sobreviver ao fato de estudar pela manhã, é seus amigos Jaqui e João, não poderia deixar as pessoas que estão mais ao seu lado do que seu próprio pai, que é a única família que lhe resta.

Por outro lado, no próximo dia dezesseis, as aulas acabarão e Estella se formará de uma vez no ensino médio, o que a deixa cada vez mais ansiosa para evitar cruzar o mesmo espaço da fruta podre que é o ex-namorado. Só em pensar que vai passar mais tempo no mesmo teto que Manoela, a madrasta, o estomago chega a embrulhar. Então, é difícil distinguir o que é pior, mas pelo menos metade dos seus problemas estará acabado.