SEGUNDA-FEIRA, DIA 9 DE AGOSTO.
O jornal mostra uma foto de Hanna e só agora vejo o quão somos parecidas mesmo. Chega a ser assustador.
O jornalista que fala sobre o caso diz que segue sendo um mistério quem fez isso, o porquê e quem é a vitima já que ela foi encontrada sem identificação. Quando respondi a pergunta dos policiais, disse que não sabia quem era ela, porque achei que já iriam supor que a habilitação que estava comigo fosse ela, não eu.
Posso voltar lá agora mesmo e falar a verdade, mas qual seria ela? Que estava andando por ai e a vi sangrar até a morte e antes disso ela me deu os documentos dela? Mesmo que não tivesse nenhuma arma do crime comigo, era o sangue dela que estava nas minhas roupas e não tinha ninguém para confirmar o que eu estava dizendo; iria me tornar uma suspeita. Penso no que ela me disse, pensei tanto nisso que estou com dor de cabeça. Faz um dia apenas, um dia que aquilo aconteceu e acabei sonhando duas vezes. Não sei se Hanna estava com celular, ou se estava com algo a mais que mostrasse sua identidade além das coisas que ela me deu. Olho para meu notebook ao meu lado no sofá. Desde que publiquei aquela coisa no blog tenho começado a escrever um rascunho do que poderia chegar a ser uma ficção misturada com fatos, não sei ainda se devo continuar. Parece errado falar sobre alguém que morreu nos seus braços enquanto você apenas vomitou e desmaiou.
Há uma hora tento me decidir o que fazer a seguir, qual será a próxima coisa a se fazer na minha vida? Estou com medo de sair de casa, estou com medo até de ir comprar coisas, por isso faz 24 horas que peço comida por aplicativo. Fiz a mesma coisa quando meus pais morreram, mas durou muito mais, tanto que todo o dinheiro que ainda tenho foram eles que me deixaram. Não trabalho, me sinto tão incapaz disso quanto sou incapaz de criar algo bom. Sigo me convencendo de que isso não é totalmente verdade, mas às vezes meus sentimentos ruins sobrepõem os bons e eu acabo me sentindo um lixo por horas ou dias. Paro de prestar atenção na reportagem sobre Hanna, não faz diferença, os jornais só falam nela. Na internet diziam que o corpo dela estava com hematomas, recente e outros nem tanto. Que tipo de vida ela levava? Ela quer que eu assuma isso? A pessoa que a matou, quem era? São perguntas que penso a todo o momento, anseio para inventar algo para moldar no que estou escrevendo, mas toda vez que penso em algo eu apago, apago porque me sinto ingênua. Apago porque nada se encaixaria melhor do que a verdade.
A carteira que Hanna me deu possui cinco coisas: A habilitação, dois comprimidos, moedas e um papel amassado. Não me permiti abrir até agora.
É o numero de alguém chamado Honie.
Foi ai que liguei, liguei antes que mudasse de ideia.
Uma voz aflita atendeu depois de dois toques, não falei nada quando chamaram pelo nome de Hanna. Então desliguei. Alguém a estava procurando, alguém se preocupava com ela tanto que quando atendeu a ligação estava prestes a chorar. O que estava acontecendo com Hanna Albertelli?
Pesquisei o nome dela no Google. A primeira coisa que me apareceu foi o significado do seu sobrenome: Albertelli significa "Aquele (a) que é famoso em tudo." Talvez o nome condiz com ela. A segunda coisa que me apareceu foi uma matéria sobre alguém chamado Paulo Albertelli —Supus ser o pai dela. —E mostrava ele sorrindo, apertando a mão de um outro homem. Já tinha visto ele? Mas ele parecia importante. Procurei fotos dele no Google também, a maioria era ele de terno com outros homens de ternos. Procurei com mais intensidade e vi uma matéria sobre seu casamento, e vi a mulher que se parecia muito com Hanna, a mãe dela. Ela sorria na foto. Segurava a mão de Paulo Albertelli. Não havia uma única foto de Hanna. O nome dela não resultava em nenhuma foto que não fosse uma bem péssima; ela no em um gramado com seus cabelos presos, tomando algo com uma mulher que está de costas. Uma dela em um carro. Uma dela com uma revista nas mãos em uma janela de hotel —Duvido que seja ela mesma nesta última.

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Eu, Hanna
Fiksi UmumVer uma pessoa morrer não é nada de tão incomum. Mas se a pessoa que você visse morrer for idêntica a você? E se ela lhe pedisse um último favor? E se você aceitasse? A vida de Amanda Voz, uma escritora amadora, agora se resume no "e se". Decidida...