A água da privada leva o liquido amarelado e com pedaços de comida.
Sento no chão mesmo.
Desejo poder levantar e ligar o chuveiro, não ligo para as roupas, nem mesmo que agora seja a minha blusa que esteja suja. Eu só me sinto... Sinto-me suja. De dentro para fora eu me sinto suja por saber que é assim que eles me enxergam; Hanna era uma pessoa horrível e não escutei nem todos os seus áudios gravados. Oliver me olhou de um modo estranho quando cheguei. Me olhou mais estranho ainda quando me deu o sorvete. Acho que... Não. Nem ferrando. Não vou pensar nisso.
A água não resolve nada. Ainda me sinto a droga de uma imunda hipócrita. Banho nenhum tira isso.
Pego meu celular. Digito o número da policia e paro. É o meu plano A posso ligar para policia e não me identificar, digo que alguém dessa família pode ter a ver com o assassinato da mulher que foi dada como desconhecida, então dou um jeito de sair daqui. De parar com essa brincadeira que se tornou tão sinistra. Posso adivinhar como serei presa caso alguém descubra tudo. Presa por falsidade ideológica, presa por que podem jogar a culpa do assassinato nas minhas costas e será conveniente o bastante para... Todos eles. Livre das duas Hanna, livres dos segredos como bônus. Qual será o final disso se eu ligar?
Não ligo.
Vou para o computador e entro no antigo blog, sinto que só posso escapar um pouco dessa se começar a mentir de novo, criar algo inteiramente do zero.
Às duas horas da tarde sinto meus dedos implorarem por uma pausa e exatamente isso que faço. Não gosto nenhum pouco de voltar a realidade, mas olhar o que escrevi me faz rir um pouco. Escrevi sobre ser uma mulher dona de casa, com um marido ausente, na história eu tenho sete filhos, todos os homens e que estão ocupados demais assistindo televisão que não notam quando eu saio pela porta de trás e vou até a casa de Troy, nosso vizinho, que acaba de se despedir da esposa que vai visitar a mãe no interior. Acabo na casa de Troy e nós fazemos sexo na sua cama, depois na sua sala, depois na cozinha e finalmente no banheiro. Conseguimos quebrar um porta—retratos de vidro com a foto do casamento dele quando fizemos na sala, ele parece não ter ligado. Quando o sol se punha, disse que precisava voltar urgentemente, mas ele me segurou contra a porta e me beijou e aquela foi a primeira vez em dois anos que ele me beijava de verdade, sem que estivéssemos fazendo sexo loucamente pela sua casa. Quando sai da casa dele percebi que tinha colocado o bilhete no meu bolso e então quando cheguei em casa e preparei a janta para meus filhos, fui ao banheiro e olhei o que estava escrito naquele pedaço de papel. Ele me dera um endereço. Eu não conhecia o lugar, mas estava ansiosa para conhecer.
Quando meu marido chamado Fabrício chegou em casa, nós também fizemos sexo, mas dessa vez insistir em usar camisinhas. Não preciso de outro alienígena na minha barriga. Semanas depois me encontrei com meu vizinho e continuamos nosso romance até que ele se separou da esposa dele, então meu filho mais novo completou ano, mas eu não estava na festa. Porque estava com Troy, e Fabrício nos pegou na hora H. A confusão aconteceu e no final, eu acabei com Troy em outra cidade levando apenas meu filho mais novo, Fernando.
Meus pais enlouqueceram com o que aconteceu e agora estão ajudando meu ex—marido a cuidar do resto das crianças. Que provavelmente vão ouvir falar muito mal de mim pelo que fiz. Estou grávida de cinco meses de Troy e para nossa surpresa, é uma menina. Uma menina! As coisas são ótimas agora e estou muito feliz. Muito.
A realidade é uma droga.
Saio do quarto depois de vestir uma calça moletom e uma blusa que chega quase aos meus joelhos. Sinto que para completar preciso de um doce, e é esse meu objetivo.
Carmen está parada em frente à janela que dá para o portão.
O olhar dela pousou em mim por longos segundos, eu me senti instigada a iniciar um diálogo com ela agora, mas como sempre, a cara dela me dá medo demais para tal coisa. Fui à cozinha. Estou com preguiça para preparar algo e Oliver comprou apenas sorvete de baunilha. Peguei um dos biscoitos de Honie. Algumas migalhas caem na minha blusa, isso me faz lembrar—se das vezes que ele se melou enquanto comia. Malditas migalhas.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Eu, Hanna
General FictionVer uma pessoa morrer não é nada de tão incomum. Mas se a pessoa que você visse morrer for idêntica a você? E se ela lhe pedisse um último favor? E se você aceitasse? A vida de Amanda Voz, uma escritora amadora, agora se resume no "e se". Decidida...