Eu me sentia vazia.
Me lembrava de como tudo costumava ser leve e divertido. De como nos conhecemos e de todos os amigos que agregamos até eu chegar a aquele momento.
Não existia ninguém que pudesse preencher aquele sentimento.
Demorei para abrir os olhos, desejando que aquilo fosse um terrível pesadelo.
Infelizmente não era. Uma mãe nunca está preparada para sair com os braços vazios do lugar em que dera a luz a uma criança.
Eu estava bloqueada. As vozes não entravam em meus pensamentos e eu nem ao menos conseguia prestar a atenção suficiente para respondê-las.
Voltamos para casa. Para o sofá laranja que agora parecia terrivelmente desconfortável. Eu não queria subir as escadas e entrar no quarto, ver todas aquelas coisas. Tudo que era para eu estar usando agora, não só eu. Eu e ela.
- Honey, o que você acha da gente ir para a mãe do Ed até darmos um jeito nas coisas por aqui?
Eu apenas balancei a cabeça. Aonde quer que eu fosse, aquela dor iria me acompanhar.
Respirei fundo. Sairíamos no dia seguinte.
Ed ficou em casa e prometeu levar tudo para outro lugar: Berço, roupas, banheira, carrinho. Qualquer coisa que lembrasse a existência de uma bebê não teria lugar ali.
Eu estava dentro da minha cabeça. Em um lugar no qual eu andava sozinha. Sem ter noção de horas, dias ou meses. Todos os campos pelos quais nós passamos pareciam estar mortos, de alguma forma, assim como eu estava por dentro.
- Você tem duas filhas lindas que precisam de você. Pense nisso. Logo você vai poder vê-las.
O que Cherry talvez não sabia é que não era fácil como ela achava. Um filho não poderia substituir o outro. Nunca.
Eu havia perdido minha Charlotte, eu poderia ter mil filhos e poderia engravidar outras mil vezes. Nunca seria mãe da Charlotte novamente.
Eu não consegui ouvir ao certo o que Im falou ao meu ouvido quando me abraçou. Ela parecia chorar também.
- Obrigada. Eu sei que vai ficar tudo bem. - Era sempre a resposta mais reconfortante que eu poderia dar para todo mundo.
Entrei na casa amarela, que àquela altura eu já conhecia muito bem. John estava sentado a mesa quando entrei, provavelmente tomando seu café da manhã.
- My Little, está tudo bem com você? - Me perguntou antes de me envolver em seu abraço.
Como tudo poderia estar bem?
Me perguntei sem sucesso na minha própria resposta.
- Vamos tomar um café juntos. Tenho certeza que tudo vai melhorar.
Eu não estava com fome, apenas fiquei ali sentada enquanto John parecia falar alguma coisa... Alguma coisa que somente me dei conta quando ouvi a sua voz embargada.
- ... E eu que pensei que, depois de tantos anos, essa casa não estaria mais vazia. Eu que pensei que teria meus dias jovens novamente, como se um neto trouxesse a gente de volta a vida, mas dessa vez com o dobro da dedicação por ter feito tudo na vida e estar ali somente para se dedicar a aquele ser tão pequeno... Ensinar tudo de novo, tudo aquilo que ensinei aos meus filhos, esperando que ele seja uma boa pessoa... Uma netinha, a menininha que essa casa nunca teve, aquela que iria sair de casa montada em minhas costas e encher a casa de brinquedos que só de pensar em pisar, já fazem nosso pé doer - Ele segurou em minhas mãos que descansavam em meu colo, me fazendo olhar para ele - Eu sei que tudo que eu sinto, nem de longe é uma parte da sua dor, mas quero que saiba que todos nós desejamos tanto que ela estivesse aqui... E ainda que ela não esteja, todos nós estamos aqui por você.
- Muito obrigada, John - Eu pisquei, deixei algumas lágrimas escorrerem antes de completar - Vai ficar tudo bem, tenho certeza.
Era como se eu estivesse andando em uma lago congelado e ele estivesse prestes a ruir. Não havia nada de seguro ali. Eu tentava alcançar um lugar que teria paz, em meio a grande tristeza.
Ali naquele quarto em que passei a maior parte dos últimos meses. Esperando que tudo mudasse para melhor, a cada dia tentando reconstruir minhas esperanças. Agora eu não tinha mais nenhuma.
Deitei esperando que o tempo passasse. A dor adormecesse e que eu voltasse a ter esperança. Esperança de ter algum tipo de sentimento além desse, alguma dia, sobre essa situação. Pensando que tudo acontecia por um motivo.
Queria tanto imaginar o que eu estava fazendo naquele momento, caso ela estivesse aqui comigo. E essa era a incógnita, ser bebê era isso. Ele poderia estar mamando, chorando, ou dormindo. Eu estaria exausta de qualquer forma. E eu preferia estar.
Uma mão repousou sob minha perna, por cima do edredom. Foi subindo pelo meu corpo, com um leve toque até chegar o meu rosto e acariciar com delicadeza. Aqueles olhos castanhos e cabelos ruivos que eu conhecia bem estavam bem ali em minha frente.
Exatamente como eu estava me joguei nos braços de Matt. Ele não nos deixou cair no chão. Senti ele levantar comigo no colo, e por mais difícil que parecesse ele me sentou na cama. Ficamos abraçados por um longo tempo. Matt se separou de mim, colocou meu rosto entre as suas mãos, segurando-o, olhando nos meus olhos, com seus olhos castanhos também vermelhos por chorar.
Eu suspirei... Junto com o ar, saiu um choro tão carregado. Carregado de dor, de sentimento, de emoção. Eu senti naquele momento, um pouco de paz, como se finalmente ao chorar, naquele momento, eu conseguisse expressar toda a minha tristeza e deixar que as minhas lágrimas a carregassem para fora. Deixei que a lágrimas lavassem a minha alma para limpar tudo. Matt havia conseguido me acalmar apenas com sua presença, seu olhar, seu carinho...
Abri os olhos mais uma vez e tentei expressar um sorriso, grata por ele estar ali comigo, de novo. Por nunca me abandonar. Matthew sorriu de volta, meio sem saber o que fazer, sem sabe se sorrir para mim era a coisa certa, se era permitido. Nossos olhos se comunicavam sem que precisássemos emitir uma palavra sequer.
Suas mãos ainda acariciavam minhas bochechas, como se estivesse fazendo um pedido. Eu fechei os olhos. Suspiro longo. Completei pedindo que aquilo passasse logo, desejando voltar ao passado ou correr para o futuro.
Senti a respiração quente do Matt em meu rosto. Ele estava perto. Perto demais.
Lábios macios encostando nos meus. Suavemente encostados. Respirei fundo. Lábios mais apertados selando um beijo, que até o momento eu não entendera muito bem o que era.
Antes de voltar a respirar, eu compreendi. Eu estava sendo beijada nos lábios por Matt naquele momento.
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Photograph - Amores Imperfeitos [Ed Sheeran]
FanficContrariando suas expectativas, Júlia está completamente apaixonada agora. E o que parece ser um conto de fadas, vai esbarrar em outras pessoas e outras realidades. E então, eles vão ter que lidar com situações diversas criadas por suas decisões pa...