Quando abriu os olhos, Emma se encontrou em um lugar escuro e o frio que recaiu sobre sua pele fez com que todos os pelos de seu corpo se arrepiassem. Ergueu o tronco com dificuldade, o ar faltando em seus pulmões. As mãos tocaram o chão úmido e áspero, em busca de apoio. Sua cabeça latejava e a visão embaçada não permitia que identificasse as figuras que compunham o novo cenário.
Apertou as pálpebras com força e voltou a abri-las em busca de foco e tudo rodou. Sentia seu coração bater desesperado, o que só podia significar que ainda estava viva. Algo quente e molhado escorria por suas costas e ela se encolheu com a pontada de dor em suas escapulas, um gemido baixo deixando seus lábios.
—Dizem que depois da morte todas as dores cessas. Essa é a maior mentira de todas. Elas se intensificam, isso sim. A não ser, é claro, se você for um dos preferidos Dele. – uma voz austera e cadente soou e Emma virou o pescoço em busca do interlocutor. — Mas se fosse o caso você estaria com Ele em seu palácio perfeito nas nuvens e não comigo, cercada de tormento e desesperança.
A figura que encontrou teria feito qualquer pessoa gritar em pavor. Digna de se estar em um pesadelo, a mulher metade uma bela e viva humana e a outra um corpo em estado de decomposição a encarava de seu trono feito de ossos.
Elas sustentaram o olhar, apesar do estômago de Emma se revirar diante da carne podre e das larvas que abriam buracos para logo em seguida se infiltrarem novamente na epiderme. O glóbulo vazio, parecia enxergar mais do que o olho de pupila negra.
A bile subiu amarga por sua garganta.
—Hel. – Emma murmurou baixinho, parte constatação, parte um cumprimento.
A deusa pareceu sorrir, ou poderia ter sido a imaginação da jovem para tentar melhorar a situação.
—Confesso que fiquei um pouco ofendida por você cogitar não me fazer uma visita, Emma. Sempre nos demos tão bem em suas visitas anteriores. Achei até que fossemos amigas.
O silêncio foi tudo o que ressoou após a fala da deusa. Emma não sabia o que dizer. Não sabia o que achar.
Não sabia o que pensar.
Será que ainda estava sob o efeito da água do poço de Mimir e aquela era um visão do futuro? Uma visão depois que estivesse morta? Seu encontro com a deusa para que escutasse sua pena?
—O fato é que vocês insistem em ver o pior em mim – continuou, quando percebeu que a jovem permaneceria quieta. — Eu não sou a inimiga aqui, apesar dos meus pais serem. Eu não sou boa e nem má, Brunhilde ou Emma, como preferir ser chamada. – fez um gesto de desdém com a mão esquelética. — Eu sou justa. Nós já tivemos essa conversa no passado.
—E para você é justo a queda do Pai de Todos. – Emma afirmou, virando o corpo para ficar de frente para a deusa.
—Você o defende como se fosse justo o que ele fez e faz com você e seu guerreiro. Jogando-a no mundo dos homens por desobedecê-lo quando se negou a cometer uma injustiça, permitindo que o único que poderia salvá-la a esquecesse. Deixando-a desprotegida quando suplicou por ajuda e perdão... . – balançou a cabeça em indignação. —O que eu acho justo é que um outro mundo se inicie. Com um novo governo.
Apesar de algo parecido com raiva queimar no coração de Emma, ela tentou não deixar que as palavras da deusa entrassem em sua cabeça. Ela estava do outro lado daquela batalha. Não era confiável.
Ninguém parecia ser.
—Um governo do Caos. – sugeriu com sarcasmo.
Hel fez uma pausa e soltou uma risadinha.
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Traiçoeiro (Em Revisão)
FanfictionHouve uma época, em que os homens não lutavam por poder e que apenas o divino regia sobre os planos. Todos viviam em harmonia. Nada além da paz era conhecido e cultivado. Até que o ouro roubado, por aquele que abriu mão do amor em troca de possuir t...