—Está pronta?
Emma olhou pelo espelho e encontrou apenas a cabeça de sua amiga Belle para dentro do quarto, fitando-a com um sorriso. Naquela manhã ela também usava um vestido em tons escuros, mas não preto como o qual Emma era obrigada a trajar.
Ela estava ansiosa por poder voltar a usar cores alegres. Um ano inteiro usando apenas preto havia sido muito. Mas aquele era o último dia. O último dia e então estaria livre das cores sombrias. Livre para se permitir demonstrar qualquer vislumbre de felicidade.
Colocou-se de pé, amarrando o laço do chapéu sob o queixo e assentiu, observando sua imagem uma última vez no reflexo, os olhos fundos pela noite sem dormir, os cantos da boca rígidos, o cabelo loiro pálido cuidadosamente escondidos pelo chapéu.
Seria o último dia que teria que andar como uma pessoa enlutada. Era ridículo ter que ficar chorando a morte de alguém por tanto tempo. Ainda mais de alguém que não tinha o que sentir falta.
Não que fosse confessar tal coisa algum dia.
Mas o fato é que não havia chorado quando ficou sabendo da morte de Cora, sua mãe. Não chorara no dia seguinte e em nenhum dia depois daquele. Contudo, teve que fingir. Fingir estar triste. Fingir estar desolada.
Um ano todo baseado no fingimento.
Não que não gostasse de sua mãe.... Cora apenas não se comportava como uma. Não havia uma memória de Emma em que a mãe tinha sido carinhosa, em que houvesse a tratado como filha.
Claro, amava-a porque a sociedade exigia esse sentimento, sendo assim, fazia o seu melhor para amá-la com a devoção que apenas uma filha tem para com a sua mãe. Continuava dizendo a si mesma que a amava quando tudo o que Cora fazia era maltratá-la. Pensava nas humilhações como uma forma que a mãe havia achado para demonstrar sentimentos e dessa forma tentava se convencer que o amor que diziam que deveria sentir, realmente existia.
Todavia no fundo havia um grande nada. Cora era uma verdadeira estranha e se fosse para ser sincera — principalmente consigo mesma —, Emma nunca gostara dela.
Não havia palavras ou gestos de carinho, entretanto Emma era capaz de se lembrar de algumas — muitas — ofensas. Dos muitos —vários— castigos desnecessários. Das incontáveis humilhações por conta de sua aparência.
Sem graça demais. Pálida demais. Cheia demais nos lugares errados, quando criança e depois que cresceu, seca demais para atrair. Insuportável demais que prejudicava seus nervos.
Mesmo que raramente as duas ficassem no mesmo cômodo por mais de quinze minutos para que Cora pudesse declarar aquilo. Até mesmo a respiração de Emma a irritava.
Desceu de braços dado com Belle para o vestíbulo, onde seu pai — Henry Mills — esperava com as mãos cruzadas atrás das costas, o semblante distante. No entanto, a testa franzida indicava que ele estava preocupado com alguma coisa.
Não, ela não sentia falta de Cora, mas já não podia dizer o mesmo de seu pai. Ele havia mudado desde que voltara para casa sem a esposa ao seu lado. Os dois saíram para viajar juntos — uma das raras viagens em que Emma conseguia escapar e ficar em casa —, e retornara só.
Uma tempestade, foi o que Henry disse, os pegou de surpresa e Cora havia se perdido nas águas furiosas do mar para sempre.
Emma não se lembrava de ter visto o pai tão arrasado como naquele dia em que a comunicara dos acontecimentos. A filha pressentira que algo de errado havia acontecido quando eles não retornaram no dia que disseram que iriam. Henry disse que o motivo do atraso foi por conta dos grupos de resgate que pagara para procurar por Cora nas terras e ilhas mais próximas, para onde a água poderia tê-la levado, contudo, não obteve sucesso algum em encontrá-la.
Assumiram o período de luto e fizeram uma cerimônia com um caixão vazio. Henry e Emma Mills, parados lado a lado, em silêncio, cada um contemplando sua própria dor e desde então não haviam trocado uma palavra sobre o acontecido.
A jovem lançou um olhar de esguelha para o pai que estava observando o lado de fora pela porta aberta. Os dois sempre foram próximos. Era ele quem ia acudi-la quando criança durante seus pesadelos, até que Granny chegasse. Mas depois do acidente, ele havia se afastado. As refeições eram feitas em silêncio e apenas palavras de cumprimento eram trocadas. Passava parte do dia trancado em seu escritório e a outra parte visitando os campos de plantações, como se na tentativa de se livrar da ausência austera da esposa na casa.
Os primeiros meses haviam sido os mais difíceis. Mais de uma vez, Emma flagrara o pai chorando desconsolado, enquanto escapava para a biblioteca no meio da noite para encontrar um livro para se entreter. Se sentia culpada por não estar sentindo a dor que o homem carregava pela perda de Cora, então simplesmente engolia em seco e fingia não ter escutado, porque tinha medo que o pai visse em seus olhos que ela estava bem.
Henry se virou ao ouvir as duas e sorriu para a filha. Emma amava o pai tanto que sentia que poderia morrer por ele. Henry foi o pai que toda garota sonharia em ter. Ele lhe contara histórias de ninar, — fantásticas sobre piratas e que muitas vezes reproduziam no quarto, até que Granny surgisse informando que já passara da hora de dormir —, ensinara-a a cavalgar como uma verdadeira Amazona e — na surdina — lhe ensinou que o cotovelo era a parte mais forte de seu corpo e que deveria ser usado para quebrar o nariz de alguém se necessário, assim como manusear uma arma, caso tivesse acesso a uma.
—Apenas mais uma aparição e o luto estará oficialmente encerrado. — comentou. — O ano passou rápido. – constatou contemplativo, oferecendo os braços para as duas. —Bom.... Vamos que não queremos causar falatórios. — indicou a porta. Uma carruagem os esperava na entrada e uma vez ajeitados, os três seguiram para a igreja.
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N/A: Olá, como estão? Aqui estou com um capítuluzinho antes de sexta-feira para vocês, só porque eu não esperava tanto feedback positivo em relação a uma nova versão e isso deixou meu coração em êxtase.
Acho já pertinente avisar que agora os capítulos serão mais curtos, porque desse jeito não corro o risco de matá-los de tédio. E não se desesperem quando Killian não aparecer logo, aqui ele vai demorar um cadinho mais mesmo.
Espero que gostem e até mais!
Beijos.
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Traiçoeiro (Em Revisão)
FanfictionHouve uma época, em que os homens não lutavam por poder e que apenas o divino regia sobre os planos. Todos viviam em harmonia. Nada além da paz era conhecido e cultivado. Até que o ouro roubado, por aquele que abriu mão do amor em troca de possuir t...