Capítulo 42

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Desconfortáveis minutos depois, nós avistamos alguns monstrengos enormes no alto da rua, caminhando desajeitadamente entre os carros e em nossa direção.

Eu contei cinco com velocidade e equilíbrio reduzido, mas tão grandes que contavam por dez.

— Nós temos que sair daqui — Yan me avisou, já com a respiração aflita.

Eu concordei e me abaixei para alcançar minhas facas, mas dei de cara mais uma vez com o anel dourado na mão de minha mãe.

— Você quer que eu pegue para você? — apressado, meu amigo me questionou.

Bom, parte de mim se sentiria bem em tê-lo, mas  eu não sei se seria possível tirar ele dali agora.

— Depois.

Era a resposta que Yan precisava para assumir sua pressa e se afastar. Aceleradamente, ele foi checando as janelas dos carros próximos que, assim como o de minha mãe, escaparam do fogo.

— Esse, vem! — Yan chamou antes de entrar no banco do motorista de um Fiat coberto de cinzas.

Eu corri para o acompanhar e me joguei no banco do seu passageiro.

Com a porta fechada e manualmente travada, eu larguei os objetos letais das minhas mãos, as deixando cair aos meus pés e passei a mochila das minhas costas para as pernas, sentindo o alívio se espalhar pela minha espinha só por estar devidamente acolchoada e acomodada.

— Feche o vidro — pediu Yan com urgência e eu obedeci, girando a manivela em seguida. — Não todo! Ou quer morrer sem ar?

Ele certamente está mais nervoso que o usual em uma situação como essa, ou eu que estou anestesiada? De qualquer maneira, eu obedeci e deixei uma pequena brecha.

— Eu não vou pedir para você relaxar, Yan — eu disse sem tirar os olhos da janela cinzenta. — Com sorte, eles vão passar sem sequer nos notar aqui.

— E desde quando a gente tem alguma sorte? — suspira ele.

Nós ficamos um tempo em silêncio, apenas esperando os monstrengos gigantes passarem, mas, como Yan suspeitou, isso não aconteceu.

Eles se concentraram na janela de Yan e no capô do carro; batendo, arranhando e grunhindo. Matando aos poucos o que restava da paciência de Yan.

— Da próxima vez, eu fico calado — ele bufou, sem mover um só músculo que tirasse sua atenção do parabrisa sujo.

Eu passei a observar o monstrengo de uma mulher que estava entre eles e notei o pouco cabelo caído ao redor do rosto morto e extremamente alargado.

Talvez nós tenhamos que passar algumas horas aqui e a mudança drástica no humor de Yan atacou a minha frustração.

— Nós deveríamos mesmo ter vindo?

Eu sou pega de surpresa com sua pergunta.

— Eu não sei, Yan.

— O que mudou saber que ela...

— Eu já sabia — eu não o deixei terminar.

— Josie, você sabe que eu quero que você fale — ele confessou, me olhando compreensivamente preocupado.

Eu o odeio quando faz isso. Quando, mesmo fora de humor, ele me olha compreensivo na intenção de me fazer desabafar.

A questão é que eu estou uma confusão das grandes agora.

Parte de mim está tranquila porque, apesar de uma desconfiança ter sido esclarecida, eu já havia sofrido por ela antes e, a outra parte está devastada, mas não por ter visto minha mãe como um monstrengo, por ter visto ela com uma bala na cabeça. E isso não é justo.

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