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Capítulo 27: Cão preto

Park Seonghwa ficou por tempo indeterminado encarando uma fotografia de Changgu na estante da sala da casa que o seu irmão estava morando nos últimos meses. Ele havia deixado a sua marca em cada espaço nas paredes branco acinzentado, desde quadros enormes e chamativos ou imprimindo o que fosse adorável, até objetos que compunham a mobília e as cores que bem o representavam.

Funcionários da Quincy ajudavam a fazer a retirada dos pertences de Changgu, uma vez que a casa não mais precisaria continuar ocupada. A movimentação não era capaz de estourar a bolha de torpor que Seonghwa estava cercado, com as suas emoções dolorosas borbulhando em seu peito cheio de nós apertados. Acabou abandonando o retrato de seu irmão sorridente, deixando uma carícia sobre o vidro do quadro.

Seguiu para o andar de cima, para o quarto de Changgu. Essa parte seria a mais difícil e suas irmãs até mesmo se ofereceram para fazer em seu lugar, mas Seonghwa sentia que era algo importante que ele não deveria deixar de realizar— como um ato de reconhecimento e despedida de seu querido irmão. Com educação, pediu encarecidamente para que tivesse privacidade em um momento que separou para tomar o fôlego. Quando isso aconteceu, ele se certificou que a porta estava fechada e então respirou fundo para capturar o cheiro do lustra móveis que Changgu geralmente usava para limpar o quarto, misturado à essência de seu perfume característico e inconfundível.

Seonghwa encontrou outra fotografia sob o criado-mudo, esta sendo ele e seu irmão em uma vez que Changgu insistiu para ser acompanhado em uma viagem de fim de semana repentina, porque ele era do tipo espontâneo e sonhador. Encontrou um lembrete colado na parede dizendo: "Não esquecer de comprar o presente de casamento da irmã do meu irmão" e "Enviar biscoitos de chocolate para o escritório do Seonghwa para que ele fique de bom humor e me deixe comprar uma moto". Uma risada nasalada escapou vindo junto da constatação de como Changgu era atencioso e preocupado. Semanalmente Seonghwa recebia uma caixa de biscoitos em seu escritório e ninguém lhe revelou quem era o responsável pelo presente, o que o levou a crer que Changgu insistiu que sua identidade não fosse delatadadelatada para que o elemento surpresa não se perdesse.

Foi até o closet modesto que ficava atrás de uma porta simples. Seonghwa encarou as roupas que iria ter que colocar em uma mala para que fossem levadas para outro lugar que fossem necessárias.

O que primeiro viu foi um gorro vermelho jogado sobre uma cadeira. Aquele gorro pertencia à época em que eram mais jovens. Seonghwa se lembrou que Changgu costumava se afundar em uma jaqueta cinza maior do que ele enquanto seus cabelos desgrenhados vazavam para fora da touca adorável. Ele pensou nas manhãs em que ia acordá-lo para que não se atrasasse para o colégio, e Changgu iria dizer que estava com preguiça porque passou a noite confeccionando uma cama para a gata que criava desde que era apenas um filhotinho. Seonghwa iria convencê-lo alegando que iriam comer cereais com leite já que Changgu odiava refeições decentes.

Tocou sob a superfície das linhas grossas do gorro com delicadeza, com uma pressão abraçando seu pescoço. O vácuo em seu peito foi preenchido por uma dor dilacerante tomada de uma saudade insuportável do tipo que faz pensar que ninguém é capaz de sobreviver à ela. Seonghwa primeiro sentiu o tremor em seus lábios, as alfinetadas no peito e o girar de seu estômago, sem encontrar alívio em seu respirar, falar ou mover. Seonghwa se sentiu um lugar ruim para se estar, ao mesmo tempo que sufocado e preso por não poder fugir. Queria perder a memória ou trocar sua vida com alguém, qualquer coisa para fazer parar de doer tanto.

Ele encarou o seu celular no bolso de seu casaco e esperançosamente ansiou pelo momento em que Changgu iria mandar mensagem e dizer que estava indo para casa e Seonghwa era o único que deveria visitá-lo para cuidar dele. Mas nada veio. Não chegou nada. Changgu se foi. Ele se foi para sempre. Não havia como recuperá-lo, como trazê-lo de volta. Jamais iria participar de suas novas memórias, ouvir sua voz pelo telefone ou iniciar discussões sem fundamento, não iria mais escutá-lo rir, falar bobagens ou levá-lo para o alto de uma montanha em uma madrugada qualquer, sem planejamento, sem compromisso. O seu irmão não estava mais lá. No mundo todo, Changgu jamais seria visto. O mundo perdeu o seu tom de harmonia que o difere do inferno.

CASHIT | MAFIA ATEEZ |  TEMP IOnde histórias criam vida. Descubra agora